Por Marta Watanabe — De São Paulo
07/10/2022 05h01 Atualizado há 4 horas
As despesas totais com saúde e educação dos 26 Estados e Distrito Federal cresceram neste ano em ritmo maior que a arrecadação de tributos e em linha com a receita corrente total em relação ao período pré-pandemia. As despesas de saúde avançaram em termos nominais 46,4% de janeiro a agosto deste ano ante iguais meses de 2019, e as de educação, 48,5%. No mesmo período, a arrecadação tributária dos Estados avançou 34,2% e a receita corrente, que inclui transferências correntes, 46,8%. Saúde e educação representam 28,4% das despesas dos Estados.
Em comparação com 2021 foram os gastos com educação que puxaram as despesas, enquanto a saúde também cresceu sobre base relativamente alta. Na comparação com janeiro a agosto do ano passado, os gastos com educação cresceram 40,6% nominais, e os com saúde, 12,6%. No mesmo período a arrecadação tributária aumentou 9,8% nominais, e a receita corrente, 16,1%. Somados, os gastos nas duas áreas atingiram R$ 186,66 bilhões nos oito primeiros meses deste ano, com alta de 26,1% contra 2021. Em relação ao período pré-pandemia, a alta é de 47,5%, sempre de janeiro a agosto.
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Quando se considera os gastos somados de saúde e educação, a variação dessas despesas em relação a 2019 foi maior que a variação da respectiva arrecadação tributária em 22 dos 27 entes federados. Na comparação com a variação da receita corrente, isso aconteceu em 15 Estados, sempre considerando os mesmos oito meses.
Os dados foram levantados pelo Valor Fiscal e basearam-se em relatórios entregues à Secretaria do Tesouro Nacional, considerando receitas realizadas e gastos liquidados. As despesas em saúde e educação levaram em conta o total aplicado nas respectivas funções, o que inclui gasto com pessoal, custeio e investimentos. Não foram incluídos valores intraorçamentários. A arrecadação tributária estadual abrange receita com impostos, taxas e contribuições.
O quadro, apontam representantes das Fazendas estaduais, mostra gastos que seguem em parte o dinamismo das receitas em razão das destinações mínimas constitucionais, mas também alta demanda de serviços nas duas áreas, que sofreram pressão extra com a crise sanitária e seus efeitos. A incerteza sobre a evolução dos gastos fica principalmente para o próximo mandato, para o qual é esperado o impacto cheio da redução de alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em setores importantes para a arrecadação estadual, como combustíveis, energia elétrica e telecomunicações.
Para Gabriel Leal de Barros, sócio e economista-chefe da Ryo Asset, como não é possível fazer uma redução do valor absoluto das despesas de forma brusca, a tendência é que o ajuste nas contas estaduais se faça pela redução de investimentos a partir de 2023.
George Santoro, secretário de Fazenda de Alagoas, diz que atualmente a despesa de saúde do Estado está em 18% da receita para fins de cumprimento do mínimo constitucional, que é de 12%. “Estamos com despesa seis pontos percentuais acima. E boa parte disso é estrutural porque aumentamos nossa rede de atendimento de saúde, o que gerou mais despesas de custeio.” Entre outros investimentos, o Estado inaugurou sete hospitais desde 2019. Segundo Santoro, a alta de gastos de custeio derivados de aumento da estrutura da saúde já estava na conta, mas a estimativa inicial indicava despesas da área neste ano em 16% da receita para fins do mínimo constitucional. Os dois pontos percentuais a mais, diz, são explicados por alta de custos e do piso da enfermagem.
O aumento de pisos salariais também impactou os gastos no Rio Grande do Sul, mas de forma mais intensa na educação, explica o secretário da Fazenda do Estado, Leonardo Busatto. Houve a elevação do piso do magistério, que impactou as contas na área de 2021 para 2022, diz, juntamente com um novo plano de carreiras na educação. Também houve, aponta, investimentos na área aproveitando os recursos de privatizações.
O governo gaúcho, diz Busatto, cumpriu o mínimo constitucional da educação de 25% em 2021, mas ele lembra que o prazo para recomposição dos Estados que não cumpriram vai até 2023, o que também pode impulsionar os gastos agregados na área neste ano.
Na saúde, avalia, a alta de gastos em relação a 2019 se explica pelo “legado” deixado pela crise sanitária e que resultou em gastos permanentes. “Leitos temporários foram desativados, mas atendimento com equipamentos novos adquiridos durante a pandemia foram mantidos.” Com a redução de alíquotas, diz Busatto, a arrecadação de ICMS do Estado deve ficar R$ 2 bilhões abaixo do projetado para este ano, possibilitando que os gastos de saúde fiquem pouco acima dos 12% constitucionais.
Cristiane Schmidt, secretária de Fazenda de Goiás, acredita que pode haver solução para a compensação de perdas com a redução de alíquotas de ICMS, tema em discussão no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF). Essas definições serão importantes para as contas de 2023, aponta. Neste ano, diz, a ampliação da infraestrutura goiana de saúde deve contribuir para levar a uma aplicação do Estado na área de 14% das receitas, considerando os critérios do mínimo constitucional. Na educação, diz, o Estado vem mantendo os mínimos, acompanhando as receitas.
Para Barros, o quadro mostra a necessidade de discussão dos mínimos constitucionais para as áreas de saúde e educação, ainda que os gastos mais recentes tenham sido causados em parte pela situação extraordinária da pandemia. Os mínimos, explica, atuam de maneira pró-cíclica e, quando as receitas caem, há dificuldade de reduzir os gastos. A unificação dos mínimos, sugere, pode flexibilizar a regra e possibilitar alocação melhor de recursos conforme as características regionais.
Fonte: Valor Econômico

