23 Sep 2022
MARLENE LARUELLE • TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL DIRETORA DO CENTRO DE ESTUDOS EUROPEUS DA UNIVERSIDADE GEORGE WASHINGTON
Após o avanço ucraniano, os talk shows políticos da Rússia, normalmente aduladores, abriram as portas para vozes mais críticas à guerra. Em um sinal do descontentamento, Alla Pugacheva, estrela pop mais famosa da Rússia, criticou abertamente o conflito.
Ainda que muitos observadores considerem o regime russo monolítico, a realidade é mais complexa. Apesar de a guerra ter reduzido o escopo para a dissidência, ainda existem campos ideológicos em competição dentro da elite. Por exemplo, os liberais de instituições financeiras estatais e oligarcas expressaram preocupações com a guerra. Mas este é apenas um dos grupos que, encorajados pelo fracasso da Rússia, pressionam o regime de Vladimir Putin cada vez mais.
Nos últimos meses, o nível de crítica até que foi tolerável. Mas as coisas começaram a mudar em agosto, quando Daria Dugina, filha de um dos ideólogos mais conhecidos da Rússia, Alexander Dugin, foi assassinada em Moscou. Ao levar o conflito para um dos bairros mais sofisticados da capital, o atentado aumentou a divisão entre os que defendem e os que são contra a guerra.
FUGA. Desde a morte de Dugina, os defensores da guerra usam seu “martírio” para renovar os chamados por uma escalada. O recuo militar das semanas recentes jogou a seu favor. Mas agora, entre os cidadãos, o interesse no conflito se abrandou. Jovens escolarizados estão deixando o país e não há garantia de que os linha-dura da elite aceitarão a repressão interna como substituta de um sucesso militar no exterior.
No entanto, com um Exército exaurido, Putin ainda tem de entregar um resultado militar que possa ser enquadrado como vitória parcial. Mesmo em meio a dificuldades, seria um erro prever o colapso do regime. Mas o poder de Putin depende de legitimidade. E, nas semanas adiante, ele poderá descobrir que a terra sob seus pés começou a tremer.
Fonte: O Estado de S. Paulo

