/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2025/7/X/W3LsPBTQeFSS3ZCBNETg/arte05bra-101-divida-a6.jpg)
O mercado vem registrando ao longo do ano queda nas projeções da Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) para 2025, segundo o boletim Focus do Banco Central. A melhora decorre das revisões para um PIB ligeiramente maior e para uma inflação menor, o que tem impacto relevante sobre a indexação da dívida. Apesar de as estimativas para o resultado primário também estarem sendo revisadas, o ajuste nas projeções da dívida tem sido ainda mais acentuado. Isso indica que fatores conjunturais, para além do saldo entre receitas e despesas do governo, têm sido importantes para a melhora na trajetória prevista para a DBGG, mesmo que não afastem riscos para as contas públicas.
Historicamente, as projeções do mercado para a relação entre DBGG/PIB feitas no início do ano pelo boletim Focus tendem a superestimar o nível efetivo do indicador observado no fim do período, com exceção dos anos marcados por recessão. Segundo o economista João Leme, da Tendências Consultoria, isso ocorre porque o mercado adota uma postura conservadora nas primeiras estimativas do ano e, à medida que novos dados são divulgados, vai ajustando as previsões.
Embora a DBGG seja diretamente influenciada pelo resultado primário, ela também depende de variáveis como o crescimento do PIB e a taxa Selic, por exemplo. Ainda assim, mesmo em um contexto de juros elevados, as estimativas para a dívida seguem em queda. O resultado primário também apresenta oscilações, mas essas variações não acompanham, na mesma proporção, o movimento baixista registrado na dívida.
Exemplo: em janeiro de 2025, o mercado projetava que a DBGG chegaria a 82% do PIB ao fim do ano. No boletim mais recente, de outubro, essa estimativa caiu para 79,7% do PIB, o que representa redução de 2,3 pontos. No mesmo período, a projeção para o resultado primário mudou levemente, passando de um déficit de 0,6% para 0,5%, sempre em relação ao PIB.
Governo conseguiu gerar certa surpresa positiva ao entregar um primário melhor”
O economista-chefe da Warren Investimentos, Felipe Salto, explica que, apesar das mudanças nos parâmetros considerados para a dívida, o essencial é que a tendência de piora do indicador de endividamento foi capturada pelas projeções do mercado e do governo. “Como há muita incerteza nos parâmetros macroeconômicos e o PIB potencial claramente foi subestimado, o fato de se ter acertado ou antecipado, ao menos, o crescimento da dívida/PIB, é o elemento mais importante”, disse.
Ao comparar a variação do resultado primário com a da DBGG, João Leme observa que os fatores que influenciam a dívida são mais voláteis. Segundo ele, o primário tende a ser mais previsível porque as despesas estão previamente contratadas na Lei Orçamentária Anual (LOA), o que limita grandes surpresas ao longo do ano. A dívida, por sua vez, é definida por parâmetros mais sensíveis, o que torna suas projeções mais suscetíveis a oscilações.
O economista aponta três fatores principais para a queda nas estimativas da DBGG/PIB neste ano. O primeiro é uma ligeira melhora nas expectativas para o PIB de 2025, já que o ganho no denominador reduz naturalmente a trajetória esperada para a DBGG. No início de 2025, o Focus projetava crescimento real de 2,01%, ante os 2,16% da última divulgação.
O segundo fator é a revisão para baixo da inflação. Como cerca de 23% da dívida pública está atrelada a índices de preços – como IGP-M, IGP-DI e IPCA -, uma inflação menor reduz a atualização desses títulos e, por consequência, o montante a ser pago aos investidores na rolagem da dívida.
Embora a desinflação também reduza o deflator do PIB – um índice de preços implícito que, ao cair, diminui o crescimento do PIB nominal -, esse efeito é pouco relevante para a trajetória da dívida, segundo Leme. O que realmente importa, na visão do economista, é que a inflação controlada abre espaço para cortes na taxa Selic, reduzindo o custo de rolagem e de novas emissões – efeito relevante em um cenário no qual mais de 70% dos títulos públicos são atrelados à Selic ou a índices de preços.
Ele observa que a queda nas projeções para o câmbio para este ano tem efeito semelhante na redução da projeção da DBGG/PIB, já que cerca de 5% dos títulos são indexados ao dólar. Assim, quando a taxa de câmbio esperada recua, diminui também a pressão exercida por essa parcela da dívida.
Para os próximos anos, Leme cita outros elementos que podem influenciar as projeções da dívida. “Por exemplo, a expectativa de afrouxamento da política monetária já no começo do ano que vem, as medidas que o governo eventualmente passe na seara fiscal que venham a reduzir as incertezas com relação às trajetórias [dos gastos]”, diz. A vigência da reforma tributária a partir de 2027 também pode trazer impactos positivos no PIB, segundo ele.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_63b422c2caee4269b8b34177e8876b93/internal_photos/bs/2025/G/B/BKimjMSnipSdWTtcyaBw/arte05bra-102-divida-a6.jpg)
Para Salto, o PIB nominal foi o principal responsável pela melhora das projeções. Ele acrescenta que a evolução das estimativas ao longo do ano também reflete o desempenho do resultado primário. “O governo conseguiu gerar certa surpresa positiva ao entregar um primário melhor do que se esperava, por exemplo, no início de 2024. Isso tem que ver com projeções de atividade, também, que afetam fortemente as receitas públicas. Ainda, deve-se lembrar de que medidas novas de elevação da arrecadação também pesaram, mesmo que algumas delas com efeitos one-off”, avalia.
Para além dos fatores macroeconômicos, algumas operações específicas também podem ou não influenciar a DBGG, explica o estrategista-chefe de Macro e Dívida Pública da Warren Investimentos, Luis Felipe Vital. Por exemplo, quando o Banco Central vende dólar à vista, por meio de operações como o “casadão”, que combina swap cambial reverso com a venda de dólar à vista, o efeito é neutro em termos de exposição cambial para o BC, mas implica a venda de reservas internacionais. Isso reduz a liquidez no sistema financeiro, o que tende a diminuir o volume de operações compromissadas, usadas pelo BC para manter a Selic em nível compatível com o cumprimento da meta de inflação. Isso provoca uma queda marginal na DBGG. O impacto é, contudo, limitado, já que em 2025 o volume total dessas operações somou cerca de US$ 2 bilhões.
Já o atual volume elevado de emissões do Tesouro– que tem rolado quase 130% da dívida – tem efeito neutro sobre a DBGG. Isso porque os recursos vão para o colchão de liquidez do próprio Tesouro, remunerado a taxas similares ao custo de emissão, e reduzem a necessidade de operações compromissadas pelo BC. No fim, trata-se apenas de uma troca de composição dentro da DBGG, substituindo as compromissadas por dívida mobiliária, sem alterar o nível total da dívida, explica Vital.
Outro instrumento com potencial de reduzir a DBGG são os depósitos voluntários, criados em 2021 para ampliar o conjunto de ferramentas do BC para a execução da política monetária. Eles funcionam como alternativa às compromissadas e, por questões metodológicas ligadas às estatísticas fiscais, têm impacto de redução na DBGG. Contudo, seu uso ainda é restrito: o estoque é inferior a R$ 200 bilhões e ao longo de 2025 a variação foi de aproximadamente R$ 25 bilhões, segundo Vital.
Fonte: Valor Econômico

