IPCA-15 fica em 1,73%, abaixo das projeções, mas ainda com a maior variação desde fevereiro de 2003
Por Anaïs Fernandes e Lucianne Carneiro — De São Paulo e do Rio
28/04/2022 05h01 Atualizado há 6 horas
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Daniel Karp: problema à frente é o ritmo de desaceleração dos preços e qual será o IPCA no fechamento do ano — Foto: Divulgação
A prévia da inflação de abril ficou abaixo do esperado pelo mercado após meses de surpresas altistas nos índices de preços. O resultado não muda, no entanto, a perspectiva entre economistas de que a inflação seguirá pressionada à frente, ainda que o IPCA cheio deste mês desacelere. Tanto é assim que, apesar do relativo alívio com a divulgação de ontem, algumas instituições financeiras empurraram suas projeções de inflação em 2022 para 8% ou mais, principalmente porque o cenário externo voltou a ficar ainda mais adverso.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) avançou 1,73% em abril, vindo de 0,95% em março. A mediana do Valor Data indicava 1,82%. Ainda assim, foi a maior alta para abril desde 1995 (1,95%) e a maior variação mensal desde fevereiro de 2003 (2,19%). Em 12 meses, o IPCA-15 acumula 12,03% até abril, ante 10,79% até março, também o maior valor em quase 19 anos.
O período de coleta dos preços (17 de março a 13 de abril) ainda captou o repasse do reajuste dos combustíveis nas refinarias anunciado pela Petrobras, válido a partir de 11 de março. Com isso, a gasolina, que subiu 7,51%, exerceu a principal influência individual sobre o índice, e o grupo de transportes, cuja alta acelerou de 0,68% para 3,43%, gerou a maior pressão entre as classes de despesas.2 de 2
Mas a inflação também se espalhou mais pelos produtos e serviços. O Índice de Difusão – que mede a proporção de itens com alta de preços no período – subiu de 75,5% em março para 78,7% em abril, segundo o Valor Data. Sem considerar os alimentos, um dos grupos mais voláteis, a difusão passou de 74,6% para 79,5%. Em ambos os casos, trata-se de recorde da série histórica do Valor Data, iniciada em fevereiro de 2012.
A alta nos alimentos e bebidas passou de 1,95% de março para 2,25% em abril e acumula 12,85% em 12 meses. O grupo foi puxado pelos itens consumidos em casa, que subiram 3%. Alimentação fora do lar desacelerou para 0,28%.
A pressão sobre combustíveis e alimentação acabou sendo até menor do que o esperado, na avaliação de Tomás Goulart, economista-chefe da Novus Capital. “Além disso, vimos aberturas com pequenas surpresas. Isso fez com que, de forma geral, os núcleos também viessem abaixo”, diz ele, em referência à medida que tenta suavizar o efeito de itens mais voláteis, exatamente como alimentos.
Ainda assim, os níveis incomodam. Segundo a MCM Consultores, a média dos cinco principais núcleos acompanhados pelo Banco Central voltou a acelerar em abril, para 0,87% (9,34% em 12 meses) e a inflação de serviços subjacentes – mais sensíveis à atividade econômica – avançou para 0,67% (7,4% em 12 meses). A alta nos produtos industriais até arrefeceu em abril, para 0,87%, mas em 12 meses foi de 13,24% para 13,7%.
“Continua tudo girando em nível muito alto. Não dá para dizer que é uma leitura boa. É uma foto bem desfavorável, mas há alguns pequenos alívios”, diz Daniel Karp, economista do Santander. Para acompanhar tendências em agrupamentos importantes, como bens industriais e serviços, ele observa a média móvel trimestral dessazonalizada e anualizada. Por essa métrica, os bens industriais ficaram “um pouquinho melhor”, afirma ele.
Além de transportes e alimentação, os economistas destacam as altas em vestuário (1,97%) e habitação (1,73%). Neste último caso, o período de coleta dos preços não deu conta de captar a mudança na bandeira tarifária, que desde 16 de abril passou de “escassez hídrica” (a mais cara) para “verde” (sem cobrança extra). Essa alteração, porém, deve aparecer no IPCA cheio de abril. Com isso, a dissipação do reajuste mais recente em combustíveis e algum sinal inicial de preços de alimentos para baixo, as projeções dos analistas para a inflação no mês estão em uma faixa menor, entre 0,8% e 0,9%.
“A grande discussão que o mercado deve tentar antecipar é se a inflação chegou ao pico”, aponta Goulart, em relação ao acumulado em 12 meses. Nas suas projeções, o pico terá sido agora em abril. “Só que estamos vendo que as pressões externas estão vigentes”, afirma. No início do mês, houve um princípio de arrefecimento dos preços das commodities em reais. “Por outro lado, nos últimos dias, voltamos a ter depreciação do real, com as commodities ainda em patamares elevados.”
Karp concorda que, possivelmente, no IPCA-15, o dado de abril pode ter sido o pico. “Teoricamente, em maio, já vamos ter uma variação em 12 meses um pouco menor”, afirma. O problema mais à frente, diz ele, é o ritmo dessa desaceleração e qual será o IPCA no fim do ano. “Não é uma desaceleração super forte”, reconhece. As projeções do Santander para o IPCA de 2022 e 2023 estão em 7,9% e 4%, respectivamente, mas o viés é de alta, segundo Karp, com algo mais próximo de 8,3% e 4,2%, pela ordem.
Ontem, o J.P. Morgan revisou sua previsão para o IPCA em 2022 de 7,6% para 8%. “Maior repasse da alta de medicamentos, tarifas de energia elétrica mais elevadas e pressões contínuas em bens industriais são os principais fatores por trás de nossa mudança”, escrevem, em relatório, Vinicius Moreira e Cassiana Fernandez.
O Credit Suisse também elevou sua projeção para a inflação no Brasil em 2022 de 7,8% para 8,3%, enquanto a estimativa para 2023 passou de 4,4% para 4,6%. “Os gargalos globais devem aumentar ainda mais os preços dos bens industriais neste ano, a pressão sobre os preços dos combustíveis e alimentos é mais forte do que nossa expectativa anterior e a inflação de serviços no próximo ano deve ter um impacto mais forte na inércia”, dizem Solange Srour, Lucas Vilela e Rafael Castilho. Para eles, a guerra na Ucrânia e à disseminação da covid na Ásia “adicionaram sal à ferida”.
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Fonte: Valor Econômico