Por Arthur Cagliari e Matheus Prado — De São Paulo
01/02/2024 05h01 · Atualizado há uma hora
O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central reconheceu, no comunicado em que anunciou novo corte de 0,5 ponto percentual da Selic, para 11,25%, que houve uma evolução nas discussões sobre flexibilização das taxas nas economias desenvolvidas, mas não o suficiente para alterar o seu plano de voo.
O economista-chefe da Porto Asset Management, Felipe Sichel, nota que o Copom manteve a frase em que “avalia que o cenário segue exigindo cautela por parte de países emergentes” ao se referir ao exterior. “Em novembro, com o cenário global pior, falou sobre cautela para emergentes. Em dezembro, mesmo com uma melhora do ambiente, manteve a frase. E, na decisão de hoje [ontem], com um cenário um pouco pior que o de dezembro, voltou a repetir. Ou seja, indica que não ocorreu nada capaz de alterar o seu plano de voo atual.”
Com projeção de início de ciclo de corte de juros em março nos EUA, Sichel diz que o Federal Reserve (Fed, banco central americano) retirou a probabilidade de corte na próxima reunião, mas indicou que essa chance ainda existe caso os dados de inflação mantenham dinâmica positiva. O economista acrescenta que, para o BC, a indicação de manutenção do plano de voo indica que a autarquia também não enxerga a diminuição do diferencial de juros como grande problema.
“E também não acredito que dê para pensar em aceleração do ritmo quando o Fed começar a cortar. Se o primeiro corte for em maio lá fora, a Selic já estará em 10,25%. Não parece fazer sentido aumentar o ritmo se o Copom já vai estar próximo da Selic ‘terminal’ ”, afirma Sichel, que tem projeção de taxa básica a 9,25% no fim do ciclo. “A não ser que o cenário melhore muito lá fora, permitindo uma discussão de alongamento do ciclo de flexibilização.”
A sócia e economista-chefe da Gap Asset, Anna Reis, também acredita que o cenário se manteve inalterado, com a “autoridade comunicando que está muito confortável com o ritmo atual de cortes e com o consenso do mercado, seguindo o plano de voo”.
“E, lá fora, o Fed colocou muito mais peso na inflação do que na atividade, indicando que os dados nem precisam melhorar, só reforçar a dinâmica positiva atual. Então, se cortar em março ou até em junho, não muda muito para a política monetária local. O que pode ocorrer, caso a atividade americana comece a recuar com mais força, é o Fed iniciar o ciclo com maior magnitude e ajudar o Copom”, afirma. A Gap manteve projeção de Selic a 8,5% no final do ciclo.
Ao manter o mesmo tom do último comunicado, sem reforçar cautela ou aliviar temores, o Copom evita ruídos e foca na taxa de final de ciclo, diz o economista Leonardo Costa, da ASA Investments. “O BC está mirando na sua taxa terminal e por isso tenta ganhar tempo para entender a amplitude dos movimentos do Fed, se o banco central americano vai continuar com tom cauteloso ou não”, diz. “Não reforçar os temores agora, da mesma forma que não optou por acelerar cortes no passado, está condizente com essa estratégia.”
Mas não é só o cenário externo que deve seguir no radar do BC, segundo Costa. Ele aponta que a inflação local ainda é um ponto de atenção. “Vimos em dados recentes atividades mais fortes. Dados de novembro mostraram recuperação [da economia]. A Pnad veio mais construtiva. É preciso ver se isso não vai se refletir nos serviços subjacentes”, afirma.
A ASA reduziu sua projeção de Selic de 9,5% para 8,5% ao fim de 2024. A mudança se deu após a divulgação do último IPCA-15, quando a gestora também reduziu suas projeções para a inflação de 4% para 3,5% neste ano.
Nessa linha, o economista-chefe da G5 Partners, Luis Otavio Leal, observa que o BC afirma mais uma vez no comunicado que deve fazer redução dos juros nas “próximas reuniões”, no plural, mas que há discussões relevantes entre essas duas reuniões. “Teríamos mais um corte em março e outro em maio, mas é preciso lembrar que antes do encontro de maio teremos a discussão fiscal aqui no Brasil”, afirma. “Além do Fed, a mudança da meta fiscal pode deixar sub judice o corte de 0,50 ponto percentual de maio. É preciso saber qual espaço a política fiscal vai dar para o BC continuar cortando seus juros no atual ritmo.”
Fonte: Valor Econômico

