O projeto de lei 1.087/2025, aprovado pelo Senado, poderá desencadear uma “onda” de declarações de companhias até 31 de dezembro, prazo-limite para que as empresas aprovem a distribuição de lucros. Esse movimento poderá ter efeito positivo também sobre as ações de boas pagadoras de dividendos, segundo gestores ouvidos pelo Valor.
Na prática, no caso das empresas de capital aberto, o PL cria uma tributação adicional na distribuição de lucros, que reduzirá o valor que será recebido pelos acionistas.
O texto, que isenta do Imposto de Renda (IR) quem recebe até R$ 5 mil por mês, estabelece uma compensação fiscal por meio da tributação de lucros e dividendos. Com as mudanças, o sócio e gestor de renda variável da RPS Capital, Thalles Franco, acredita que as empresas que puderem devem antecipar o pagamento de dividendos, o que poderia elevar a percepção mais positiva sobre as ações.
“Depende, também, da disposição das empresas de se alavancar. Num cenário de Selic a 15%, não é tão óbvio para empresas com controladores fazerem isso”, pontua Franco. “As companhias que não estiverem com uma alavancagem alta e tiverem bastante reserva de lucro líquido, ou de lucros acumulados, deveriam pagar dividendos agora.”
Para o sócio-fundador e gestor de renda variável da Persevera Asset, Fernando Fontoura, a nova cobrança pode gerar implicações jurídicas e financeiras tanto para investidores quanto para as empresas. O motivo é que o prazo para a empresa declarar que irá pagar os dividendos pode desencadear uma corrida das companhias para antecipar as declarações, ainda que os dividendos não precisem ser efetivamente pagos neste ano. O movimento também pode ter efeito sobre fundos.
“No momento em que uma empresa declara dividendos, o gestor deixa de ter uma posição em ações e passa a deter um crédito contra a companhia. Assim, caso ocorra de fato uma onda de declarações [das companhias], mesmo sem o recebimento imediato dos recursos [por parte das gestoras], haverá uma desalocação temporária das gestoras na bolsa, o que tende a gerar um movimento de compras para recompor as posições”, diz Fontoura.
O gestor da RPS também avalia que as mudanças podem provocar uma onda de compra de papéis com maior potencial de pagamento de dividendos extraordinários, caso de companhias como Eztec, Direcional, Cyrela, CPFL Energia, Axia (ex-Eletrobras), C&A Modas, TIM e PetroReconcavo. Essas empresas fazem parte de estudo recente do BTG Pactual, que analisou as que têm maior capacidade de realizar esse tipo de pagamento.
As empresas poderão efetuar a distribuição dos dividendos aos investidores até 2028, conforme o texto aprovado, se fizerem a declaração de pagamento neste ano. No entanto, companhias que não conseguirem declarar a distribuição poderão recorrer à Justiça, avalia a sócia-fundadora do escritório Utumi Advogados, Ana Cláudia Utumi.
“O problema é que, em 31 de dezembro, as empresas ainda não terão o balanço fechado nem os lucros de 2025 efetivamente apurados para poder declarar a distribuição. Por isso, terão de se programar para encerrar as atividades do ano e concluir o balanço nessa mesma data, a fim de formalizar a declaração”, diz.
Caso não disponham de caixa suficiente, as companhias poderão pagar os dividendos devidos com ativos avaliados a valor de mercado, por se tratar de uma operação entre partes relacionadas, afirma Utumi. Já no caso de empresas que cogitam tomar empréstimos para distribuir dividendos, a advogada alerta que os juros não serão dedutíveis para fins de apuração do lucro tributável, pois não configuram despesa operacional.
“Se a empresa declarar os dividendos até 31 de dezembro e estabelecer, no ato societário, que os acionistas poderão receber o pagamento em ações ou quotas da própria companhia, entendo que, nesse aumento de capital com crédito de dividendos a receber e entrega das novas ações ou quotas entre 2026 e 2028, a isenção seria mantida”, afirma.
De acordo com o PL, para até R$ 50 mil não haverá a tributação adicional de 10% sobre a distribuição de dividendos. “Passado esse valor, tem retenção pela empresa de 10% do valor a ser distribuído de lucro. Por exemplo, se uma empresa tiver que pagar R$ 60 mil para o sócio, ela vai reter R$ 6 mil e pagar R$ 54 mil para o sócio”, explica o sócio da área tributarista do Cepeda Advogados Érico Pilatti.
O texto prevê, ainda, uma tributação adicional das altas rendas se a pessoa física receber a partir de R$ 600 mil em rendimentos por ano, com imposto progressivo de até 10% para rendimentos acima de R$ 1,2 milhão, segundo o advogado.
Fonte: Valor Econômico

