Por Lucianne Carneiro — Do Rio
03/05/2023 05h01 Atualizado há 5 horas
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Muito tem se discutido nos últimos meses sobre a viabilidade da atual meta de inflação do país, de 3,25%, e a possibilidade ou a necessidade de uma mudança. Os indicadores mais recentes de atividade econômica – com alta de serviços, números mais positivos do mercado de trabalho que o esperado pelo mercado e o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) – também levantam questionamentos sobre a capacidade de a atual taxa básica de juros esfriar a economia.
Um estudo feito pelo economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos, Eduardo Velho, aponta que a chamada persistência da inflação também está acima da meta e das expectativas do mercado para este e os próximos dois anos. Pelas contas do economista, a partir de modelos econométricos, a persistência da inflação brasileira subiu para 4,67% em 2023, dificultando que o Índice de Preços ao Consumidor Ampla (IPCA) fique abaixo desse nível neste ano e no próximo. Em 2021, estava em 4,33%.
O indicador calculado por Velho é chamado de persistência da inflação, ou uma proxy do que seria a inflação estrutural. O conceito, segundo ele, inclui não apenas a inércia inflacionária – quando preços são influenciados pelo comportamento passado – como a estrutura de custos da economia, que considera limitações da infraestrutura e da cadeia produtiva, ligadas à produtividade da economia, e também à situação fiscal.
O economista atribui o aumento a uma piora do cenário fiscal do país e ao choque em preços de commodities como petróleo e agrícolas. Como a economia brasileira ainda tem elevado nível de indexação, diz ele, isso se reforça.
“Os cálculos mostram esse aumento da persistência da inflação entre 2021 e agora. Os governos, nem o anterior nem este, não estão cumprindo a regra do teto de gastos. Exclusão para lá, exclusão para cá. Isso pressiona a estrutura de custos e a inflação estrutural. Houve guerra, minichoque de preços de commodities energéticas, uma parte agrícola, dos cereais da Ucrânia e da Rússia. Além disso, o modelo [econométrico ] vai captando as séries da inflação, dos juros…. Se olhar nos últimos três anos, o Banco Central descumpriu as metas”, afirma.
As projeções de mercado pelo Boletim Focus apontam para o descumprimento da meta em 2023, 2024 e 2025. O cenário para o IPCA, por esta mediana do mercado, está em 6,05% para 2023, 4,18% para 2024 e 4% para 2025.
Nas projeções de Eduardo Velho, a inflação deve ficar em 7,04% em 2023 e 5,22% em 2024. O cenário apontado pela inflação estrutural, argumenta Velho, sugere a maior dificuldade de o Banco Central cumprir a meta de inflação.
Ainda assim, ele sugere a manutenção da meta de inflação, mas com uma mudança do prazo de cumprimento. Sua ideia, também defendida por outros economistas, é a alteração do horizonte da meta, do ano-calendário para um período de 12 meses.
Ao comentar o cálculo da persistência da inflação, o coordenador dos Índices de Preços do FGV Ibre, André Braz, destaca o elevado nível de indexação no país. O fenômeno aparece tanto em preços administrados quanto em preços livres, como são os casos de aluguéis residenciais e mensalidades escolares, que ele chama de “preços livres com cara de administrados”.
“Temos muitos preços livres e administrados que seguem uma indexação pesada. Mais da metade do IPCA tem rigidez, se considerarmos que 30% do IPCA são serviços livres e 25% são monitorados. E isso reforça o cuidado da autoridade monetária com os juros”, diz ele.
Economista da Kinitro Capital, João Savignon afirma que a inércia ganha mais peso na inflação em cenários em que há desancoragem das expectativas – quando as estimativas ficam acima da meta do governo para um período -, como o que ocorre atualmente.
“Quando a expectativa está desancorada, acaba perdendo a importância para a formação dos preços. E a inércia vai no sentido contrário, a inflação passada acaba sendo mais relevante para explicar a inflação atual”, aponta.
Fonte: Valor Econômico

