Por Marcello Corrêa — De Brasília
18/12/2023 05h00 Atualizado há 5 horas
Com uma carteira de US$ 1,4 trilhão em ativos sob gestão, a americana Franklin Templeton prevê um 2024 positivo para mercados emergentes, inclusive o Brasil. Na avaliação da gestora, a combinação de fatores como juros mais baixos, busca por diversificação em cadeias de suprimento e, no caso brasileiro, a perspectiva de melhora do ambiente de negócios com a reforma tributária, devem atrair investidores ao país, disseram executivos da empresa ao Valor.
Jenny Johnson, presidente e CEO da gestora, e Marcus Vinicius Gonçalves, diretor comercial para Brasil e divisão “offshore” Américas da firma, conversaram com a reportagem após participarem do Fórum de CEOs Brasil-EUA, em Brasília. A leitura é de um cenário positivo para o ano que vem, ainda que incertezas fiscais sigam no radar de investidores em 2024.
Dos fatores que influenciam o panorama para o ano que vem, o mais recente e surpreendente foi a sinalização do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) sobre cortes de juros em 2024. Na última quarta-feira, a autoridade monetária anunciou a manutenção dos juros no intervalo entre 5,25% e 5,5% e indicou que o ciclo de aperto dos últimos meses havia chegado ao fim.
“Eu fiquei surpresa que [Jerome] Powell [presidente do Fed] deu tanta clareza e definição sobre sua ideia para o ano que vem, com cortes de 0,75 ponto na taxa”, diz Johnson, ressalvando que essa avaliação é pessoal, já que a Franklin Templeton é formada por um grupo de gestoras e há diferentes times analisando o cenário.
Ela avalia que, do ponto de vista global, os títulos de renda fixa, cujos valores de face sobem na proporção inversa ao corte de juros, devem se beneficiar do cenário. Esse tipo de ativo responde por 40% da carteira da Franklin.
Ao analisar especificamente o impacto no Brasil, entram na equação os próximos movimentos do Banco Central. A decisão do Fed foi divulgada no mesmo dia em que o BC reduziu a taxa Selic em 0,5 ponto percentual, para 11,75% ao ano.
O BC manteve a sinalização de que seguirá o ritmo de cortes ao menos nas próximas duas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom), mas a indicação dos EUA reforçou o debate sobre a aceleração nesse ciclo. A possibilidade de reduções de 0,75 ponto entrou no radar. Esse não é o cenário-base na Franklin Templeton, avalia o diretor brasileiro da gestora.
“Acredito que o BC seguirá muito paciente, passo a passo, provavelmente seguindo o plano de cortes de 50 pontos-base. Eles podem ser mais agressivos dependendo do cenário global. Se houver, por exemplo, recessão global e o Fed for ainda mais agressivo, talvez haja espaço [para cortes maiores]”, afirma Gonçalves.
O cenário, no entanto, segue alinhado com a perspectiva de juros na casa de um dígito no ano que vem. A casa projeta Selic em torno dos 9% no fim de 2024, condição que deve contribuir para mais oportunidades de investimento, pontua o executivo.
“Com os juros caindo para dígito único, várias oportunidades vão ser destravadas. Haverá uma avaliação sobre investimentos no mercado de capitais, tirar mais projetos do papel”, destaca o executivo, lembrando que, após a “seca” de IPOs em 2023, há uma expectativa sobre muitas operações no pipeline para o ano que vem.
Pesa ainda nessa construção de cenário para 2024 a avaliação de que as lições da pandemia devem aumentar a busca por diversificação na cadeia de suprimentos, acrescenta Johnson – o que deve beneficiar o Brasil.
“Por causa da Covid, aprendemos que a cadeia de suprimentos só é boa se o elo mais fraco também for”, resume a executiva. “É a chamada história do ‘China Plus One’ [‘China mais um’, conceito de não depender do país asiático na produção industrial], com a busca por diversificação da cadeia. O Brasil se beneficia pela proximidade com os EUA, do ponto de vista de fuso horário”, acrescenta.
“Com juros caindo a dígito único, oportunidades vão ser destravadas” — Marcus Gonçalves
Questionado sobre o impacto das incertezas fiscais para o ano que vem no país, Gonçalves reconhece que há “ruído” no debate político, mas faz um balanço positivo de 2023. O ano termina com o novo arcabouço fiscal que substituiu o teto de gastos em vigor, mas divergências dentro do governo sobre perseguir a meta de zerar o déficit primário – tendo como pano de fundo a pressão por gastos em ano eleitoral – seguem no radar. A importância de continuar a perseguir o objetivo em 2024 foi um dos pontos mantidos no comunicado do Copom na semana passada.
“O mercado como um todo estava mais cético, então acho que o novo arcabouço foi uma surpresa muito positiva”, frisa. “É claro que há muito ruído nesse debate, mas sabemos que isso é parte do cenário político.”
O executivo assumiu neste ano a divisão de “offshores” da companhia e afirma que a nova regulamentação brasileira para esse tipo de veículo dá previsibilidade a investidores, mesmo com regras mais rígidas de taxação.
“Para o investidor internacional, acho que foi muito positivo porque não há área cinzenta e você sabe o que precisa fazer”, afirma Gonçalves, acrescentando que a possibilidade de abrir contas no exterior tem sido facilitada pelo uso de tecnologia e que vê potencial para mais investidores buscarem a diversificação.
A intensificação do investimento em tecnologia, aliás, está entre as prioridades da Franklin para 2024 globalmente. A gestora aposta no “blockchain” para aumentar a eficiência no setor.
“A tokenização e o blockchain são imensamente mal compreendidos”, afirma Jenny Johnson. “Por causa de escândalos como o do FTX, há quase um medo dos reguladores em tentar regular isso. É um desafio. Estamos muito propositivos porque acreditamos que o blockchain vai substituir toda a infraestrutura de serviços financeiros”, acrescenta, lembrando que a empresa já tem um “fundo tokenizado”.
Ela cita o uso de contratos inteligentes, que validam informações automaticamente, como uma das aplicações da tecnologia. “Quando você pensa em um ETF, por exemplo, ele é negociado o dia inteiro, mas só é precificado duas vezes ao dia. Por que permitir essa ineficiência de informação? Um contrato inteligente pode ser acionado e dizer exatamente qual é o valor do ativo atrelado no momento da transação”, exemplifica.
Fonte: Valor Econômico

