Por Rafael Rosas — Do Rio
08/04/2022 05h01 Atualizado há 5 horas
Especialistas ouvidos pelo Valor acreditam que a decisão de antecipar para o próximo dia 16 a adoção da bandeira verde na cobrança das contas de luz não vai significar riscos para a operação e ressaltam que há espaço sim para abrir mão do despacho extraordinário das termelétricas devido ao regime de chuvas melhor que o esperado sobre os reservatórios das hidrelétricas. Mas eles ponderam que a redução de valores nas contas de luz não será da magnitude dita ontem pelo presidente Jair Bolsonaro, que falou em uma queda de 20%.
Maurício Tolmasquim, professor da Coppe/UFRJ e ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ressaltou que os reservatórios do subsistema Sudeste-Centro-Oeste, que representam 70% da capacidade de armazenamento do Sistema Interligado Nacional, estão no nível mais alto desde julho de 2013. “Isso é bastante relevante e mostra que realmente você pode reduzir o despacho extraordinário das térmicas e deixar apenas os ordinários”, diz Tolmasquim.
Mas ele ressalta que a decisão sobre a adoção da bandeira verde no lugar da bandeira de escassez hídrica é política, uma vez que a conta das bandeiras ainda está deficitária. Para pagar essa conta com a bandeira verde, o governo fará um empréstimo junto às distribuidoras, que deverá ser pago a partir do ano que vem. “Você poderia manter a bandeira e pagar o que falta pagar ou eliminar a bandeira, mas jogando a conta para o próximo ano. Não tem jeito, ou a gente paga agora ou paga a partir do ano que vem através do reembolso do financiamento”, afirma.
Devido à crise hídrica, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) anunciou que a bandeira de escassez hídrica de forma a cobrir o custo de R$ 13,8 bilhões. A bandeira especial acrescentava R$ 14,20 a cada 100 kilowatt-hora (Kwh) de consumo no mês. O governo autorizou a tomada de novo empréstimo de até R$ 10,5 bilhões para cobrir a despesa ainda não paga da crise hídrica, evitando que os custos sejam repassados aos consumidores em ano eleitoral. “Existe uma dívida com as distribuidoras, que bancaram a conta das termelétricas. Ou reembolsa a distribuidora agora ou faz empréstimo para pagar depois. Essa decisão é política”, acrescenta Tolmasquim.
O ex-diretor da Aneel Edvaldo Santana destaca que, pela “lógica normal”, a bandeira já deveria estar verde desde o início de abril, mas frisa que a redução das contas de luz não ficará próxima dos 20% citados por Bolsonaro ontem. Segundo ele, se a bandeira verde fosse aplicada durante todo o mês de abril, a redução ficaria na casa dos 6,5%. Como vai valer apenas para parte do mês, Santana calcula a redução em abril entre 4% e 5%.
“A aplicação [da bandeira verde] agora está correta. A minha preocupação é quando, mais adiante, os reservatórios começarem a esvaziar. A Aneel vai aplicar as bandeiras amarelas ou vermelhas ou vai se submeter às pressões políticas”, pondera Santana. “Essa é a minha preocupação mais adiante”, acrescenta.
Roberto D’Araujo, diretor do Instituto Ilumina, lembra que a redução do valor da conta de luz será restrita devido a outros custos que também incidem sobre o consumidor, como transmissão, distribuição, encargos, iluminação pública e impostos. “Se colocar tudo isso na conta, vai dar menos de 10% de redução”, diz.
Fonte: Valor Econômico

