O presidente do Panamá, José Raúl Mulino, anunciou, nesta quinta-feira (6), o cancelamento do acordo econômico da Nova Rota da Seda com a China, após pressões dos Estados Unidos para reduzir a influência chinesa no Canal do Panamá.
Mulino garantiu que a embaixada do Panamá em Pequim “apresentou o documento correspondente” para “anunciar o cancelamento com 90 dias de antecedência”, como estabelece o acordo.
“Portanto, essa é uma decisão que tomei”, acrescentou ele em coletiva de imprensa.
O anúncio ocorre quatro dias depois da visita do secretário de Estado americano, Marco Rubio, ao Panamá. Ele viajou com a missão de contrabalancear uma suposta ingerência da China no canal interoceânico, que o presidente Donald Trump ameaça retomar.
O acordo da Iniciativa Cinturão e Rota contempla o financiamento de projetos de infraestrutura com fundos chineses para impulsionar o comércio e a conectividade na Ásia, na África e na América Latina.
Mais de uma centena de países aderiram ao acordo, um projeto emblemático do líder Xi Jinping, lançado em 2013.
Após se reunir com Rubio no domingo, Mulino havia antecipado que deixaria expirar o acordo assinado pelo Panamá em 2017 pelo então presidente Juan Carlos Varela.
Segundo a carta de entendimento, o acordo é renovado a cada três anos de forma automática (a próxima seria em 2026), mas contempla que “pode ser rescindido por qualquer uma das partes” notificando a outra com três meses de antecedência.
“Eu não sei quem incentivou na ocasião, quem assinou isto com a China”, acrescentou Mulino. “O que isso trouxe para o Panamá em todos estes anos? Quais são as grandes coisas? O que essa Iniciativa Cinturão e Rota trouxe para o país?”, questionou Mulino, incomodado.
Na segunda-feira (3), Rubio qualificou a decisão do Panamá de não renovar o acordo como um “grande passo” para fortalecer as relações com Washington. Os EUA acreditam que a Nova Rota da Seda visa aumentar a influência de Pequim em todo o mundo e é um perigo para a segurança.
“A cooperação entre a China e o Panamá no marco da Iniciativa Cinturão e Rota está se desenvolvendo com normalidade e vem obtendo resultados frutíferos”, declarou na quarta-feira o porta-voz da chancelaria chinesa, Lin Jian.
O funcionário chinês havia dito que esperava que os panamenhos resistissem “às interferências externas”.
Na quarta (5), o governo dos EUA afirmou que navios americanos passariam a ter passagem livre pelo Canal do Panamá, o que foi negado pela autoridade que administra a passagem.
“O governo do Panamá concordou em não cobrar mais tarifas dos navios do governo dos EUA para transitar pelo Canal do Panamá”, afirmou, após uma dura campanha de pressão contra o país centro-americano, o Departamento de Estado na rede social X, acrescentando que a medida representaria uma economia de “bilhões de dólares por ano”.
Em seguida, porém, a ACP (Autoridade do Canal do Panamá), um organismo independente do governo criado para administrar essa via estratégica, desmentiu o anúncio. “A ACP, responsável por estabelecer os pedágios e outros direitos de trânsito pelo canal, comunica que não fez nenhum ajuste”, afirmou a entidade autônoma que administra a via interoceânica.
A entidade declarou em sua nota que está “à disposição para estabelecer um diálogo com os funcionários pertinentes dos EUA sobre o trânsito de navios de guerra daquele país”.
O presidente do Panamá, José Raúl Mulino, também se pronunciou após a afirmação. Segundo ele, os EUA estão espalhando “mentiras e falsidades” de maneira intolerável. “Por que eles estão fazendo uma declaração institucional importante da entidade que governa a política externa dos EUA, sob o comando do presidente dos EUA, com base em uma falsidade?”, perguntou.
Trump começou a ameaçar tomar o Canal do Panamá, travessia chave para o comércio mundial que liga o oceano Atlântico ao Pacífico, quando ainda era presidente eleito, em dezembro do ano passado. “As taxas cobradas pelo Panamá são ridículas, altamente injustas”, afirmou o republicano a apoiadores no Arizona na ocasião.
Em seu discurso de posse, Trump afirmou que tomaria o canal que já foi dos EUA e justificou seu plano com a afirmação, sem provas, de que a China controla o local. Desde então, Trump insiste no confronto e não descarta o uso da força para retomar a passagem, pela qual passam 5% do comércio marítimo e 40% do tráfego de contêineres dos EUA.
Nesta sexta-feira (7), os dois países devem ter novas conversas para discutir a questão do canal, construído pelos EUA, inaugurado em 1914 e entregue aos panamenhos em 1999 após a assinatura de tratados bilaterais.
Fonte: Folha de S. Paulo

