Por Eduardo Magossi, Roberta Costa e Daniel Gateno — São Paulo
25/08/2022 09h06 Atualizado há 55 minutos
O Simpósio de Política Econômica do Federal Reserve de Kansas City é uma reunião anual realizada todo fim de agosto em Wyoming. O encontro de três dias acontece desde 1978 e reúne autoridades do banco central dos Estados Unidos e do mundo, além especialistas em economia do governo, investidores, economistas e acadêmicos. Deste 1982, ele é realizado no resort de Jackson Lake Lodge, no Grand Teton National Park. Neste ano, ele acontecerá de 25 a 27 de agosto.
A reunião de 2022 marca o aniversário de 45 anos do evento, com o tema “Reavaliando as restrições à economia e a política monetária”, que explora a criação de restrições econômicas durante a pandemia e como problemas de oferta voltaram a ser o centro das atenções.
A cada ano, o evento cria um palco para os banqueiros centrais de todo mundo, autoridades do Federal Reserve e outros legisladores e acadêmicos discutirem questões de interesse mútuo. Este ano, a discussão deve se concentrar em torno dos gargalos e escassez que limitaram a oferta econômica, mesmo quando níveis históricos de acomodação fiscal e monetária levaram a um aumento na demanda, resultando em um desequilíbrio que elevou a inflação globalmente. A resposta política global extraordinária e muitas vezes inovadora à pandemia, preocupações com a sustentabilidade fiscal e o tamanho final dos balanços dos bancos centrais devem estar presentes na agenda de discussões.
Por que Jackson Hole é importante?
O encontro ganhou importância por se tornar um fórum para formuladores de políticas discutirem questões econômicas prementes e porque geralmente é palco para grandes anúncios ou para divulgação de novas ideias econômicas. É a reunião patrocinada por um banco central mais conhecida e importante do mundo. Os profissionais e os participantes da conferência que atendem ao encontro são selecionados de acordo com o tema do simpósio e de sua relevância e contribuições para questões críticas que afetam a economia mundial. Cerca de 120 convidados de diferentes regiões e áreas participam do evento todo ano.
A fama de Jackson Hole se deve muito a Ben Bernanke, que foi presidente do Fed de 2006 a 2014, portanto, durante a Crise Financeira Internacional. Seus discursos no simpósio entre 2007 e 2012 marcaram história. Muito, claro, pelo momento conturbado da economia global. Foram discursos feitos em pontos cruciais da crise e acabaram por antecipar medidas muito importantes na época, como novas rodadas de estímulo do BC americano: o segundo QE (programa de compras de ativos) em novembro de 2010; a Operação Twist em setembro de 2011 e o QE 3 em setembro de 2012. Seus discursos de 2010 e 2012, em particular, deram fortes indícios de ação iminente da autoridade monetária, o que acabou por criar uma certa “lenda” de que banqueiros centrais aproveitariam deste simpósio para anunciar novas políticas ou medidas, como de fato aconteceu com Powell em 2020, coma adoção das metas de inflação nos EUA.
Com o Fed ainda combatendo a inflação alta nos EUA e o temor de recessão rondando a economia mundial, os investidores e economistas estão ansiosos para ouvir o que Powell tem a dizer na sexta-feira para tentar prever o caminho das novas altas de juros que ainda vêm por aí.
O que se esperar da reunião de Jackson Hole?
Mais do que uma postura mais “hawkish” (agressiva) de Powell em relação à alta dos juros em setembro, a questão mais importante a ser discutida em Jackson Hole é o que fazer depois dos juros atingirem seu pico, segundo Marcelo Fonseca, economista-chefe do Opportunity Total. “O mercado flertou nas últimas semanas com a ideia de que o Fed iria começar a reduzir os juros já no fim do primeiro semestre de 2023, mas manifestações isoladas de membros do banco central reduziram sua expectativa ao reafirmar que uma mudança de direção na política monetária seria inadequada”, disse.
Para Fonseca, Powell deve se pronunciar a respeito à medida que o mercado começar a precificar um relaxamento monetário pode atrapalhar o caminho da política monetária que está sendo traçada pelo Fed, já que esse sentimento altera preço de ativos e ações e a forma da curva de juros. “Hoje os sinais do banco central é de que os juros terão que ficar elevados por um tempo mais longo para que a inflação volte para a meta”, disse.
O economista não espera muitas novidades no campo do tamanho do aperto monetário. “Agora que os juros nominais se aproximaram da taxa neutra, Powell deve manter seu discurso de que permanecerá no combate à inflação e que vai agir condicionado pelos dados econômicos. Não vejo muitas novidades nessa área”, disse ele.
Para Bernardo Dutra, economista de EUA do Itaú BBA, Jackson Hole não deve trazer muitas surpresas. “O simpósio é sempre relevante para o mercado, ainda mais em momentos de meio do ciclo do Fed, onde se espera alguma indicação de até onde o ciclo vai se estender, mas não esperamos nenhuma grande virada em relação a comunicação recente, dado que o cenário não mudou significativamente”, disse ele.
Dutra acredita que Powell deve continuar enfatizando que o foco principal do Fed hoje é a inflação, indicando que os juros devem subir mais para um patamar mais restritivo. “Esperamos que a inflação deva continuar mais contida em agosto, como foi em julho, em relação a junho. Por isso, esperamos uma alta de 0,50 ponto percentual em setembro.”
“Acredito que Powell vai explicar o que ele quis dizer sobre o que ele enxerga na desaceleração da economia. Se vai afetar ou não a decisão de reduzir o ritmo de alta ou até parar”, afirma Angelo Polydoro, economista da ASA Investments. Polydoro prevê que ele vai manter uma alta de 0,75 ponto em setembro à medida que a inflação segue alta apesar de ter caído em alguns itens. “Não dá para dizer que a inflação está melhorando e acho que o Fed prefere errar sendo mais ‘hawkish’ do que ‘dovish’ (suave)”, disse.
Para a economista-chefe do Banco Inter, Rafaela Vitoria, Powell deve manter o tom ‘hawkish’ durante o discurso. “Pode existir por parte do Powell, esse movimento de reconhecer a desaceleração, mas eu acho que, como ele falou na reunião em julho, a principal preocupação é a inflação e não a atividade econômica”, acrescentou.
“O tom do discurso deve ser o mesmo da ata do Fomc, que deixa em aberto a possibilidade de apertos monetários mais fortes. Talvez seja possível moderar o ritmo de alta, mas a decisão não vai ser tomada agora. O mercado tem a tendência de extrapolar diante de pouca informação, por isso Powell precisa calibrar o discurso”, afirma o estrategista da Absolute Investimentos, Felipe Fiel. Porém, segundo ele, enquanto a economia estiver relativamente forte e o objetivo de reduzir a inflação para chegar a meta não for cumprido, é muito difícil que o Fed reduza o ritmo de apertos monetários.
Padhraic Garvey, chefe de pesquisa regional para as Américas do banco ING, disse, em nota, que como o Fed só pode controlar as condições financeiras para domar a inflação com o resfriamento da economia, o resultado de suas ações precisa ser uma continuidade do aperto monetário. “É por isso que o mercado, com razão, espera um tom mais agressivo do presidente Powell quando ele se levantar para falar. Agora há uma chance de que o presidente Powell fale muito pouco.”
Segundo Garvey, Powell poderia optar por caminhar por uma trilha evasiva, sem fazer nenhuma declaração ousada. “Se ele gosta do que vê, um texto equilibrado com um viés mais ‘hawkish’ é o que deve acontecer: um que acena indiretamente para aumentos além de setembro”.
Fonte: Valor Econômico

