08/01/2024 05h00 Atualizado há 5 horas
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Dizem que as previsões dos economistas são ótimas para dar credibilidade aos astrólogos e meteorologistas. E que, se todos os economistas forem colocados juntos, nunca chegarão a um consenso.
Com uma fama dessas, parece loucura basear a condução do país na coordenação das expectativas dos economistas sobre o futuro.
Nas últimas semanas, muita atenção se deu ao fato de que a maioria do mercado errou suas previsões para a economia brasileira em 2023. O ano passado fechou com números bem melhores do que o esperado: dólar a R$ 4,85 (contra previsão de R$ 5,28), taxa Selic em 11,75% (a expectativa era de 12,25%), inflação abaixo de 4,7% (versus 5,3% do mercado) e crescimento em torno de 3% (muito superior à pessimista marca de 0,79%).
Não se pretende aqui exercer uma das principais habilidades maldosamente atribuídas à minha profissão: explicar no futuro as razões pelas quais suas previsões feitas no passado não aconteceram no presente.
Em defesa da classe, é preciso reconhecer que não é fácil prever as principais variáveis macroeconômicas. Afinal, o resultado do PIB, a inflação ou o câmbio são frutos de decisões de milhões de consumidores, produtores, comerciantes, exportadores, importadores, poupadores e investidores, residentes no Brasil ou no exterior. Esses grupos interagem a todo instante, e cada um dos seus integrantes possui objetivos próprios e expectativas diferentes; uns mais avessos ao risco, outros mais arrojados; alguns otimistas, outros mais cautelosos.
No meu texto anterior para o Valor, ao tratar das efemérides de 2024, lembrei do 30º aniversário do Real. No entanto, é importante não esquecer que o plano econômico quase naufragou menos de cinco anos depois do seu lançamento, quando o governo foi obrigado a abandonar a âncora cambial e deixar o real flutuar conforme as forças do mercado.
Nos meses que se seguiram, o dólar disparou ao sabor da especulação e dos temores de volta da hiperinflação. E foi aí que a diretoria do Banco Central, agora com Armínio Fraga no comando do barco, resolveu testar no Brasil uma ideia que até então havia funcionado apenas nos manuais de macroeconomia e em países bem menos complexos e desafiadores.
O sistema de metas de inflação baseia-se numa ideia que, de tão singela, parece improvável de funcionar. O governo anuncia publicamente um patamar para a inflação no futuro e dá ao Banco Central os instrumentos e a autonomia para perseguir aquele objetivo. Com o tempo, ao se mostrar bem-sucedido na sua missão, o BC adquire credibilidade e as pessoas e empresas passam a não apenas acreditar nas suas metas, como a racionalmente incorporar aquelas previsões em suas negociações e contratos.
Uma forma de se medir o sucesso de uma política monetária orientada por metas de inflação é verificar como se comportam as previsões dos economistas frente ao desempenho efetivo das variáveis macroeconômicas.
É verdade que choques ocorrem – e os últimos 25 anos foram pródigos em surpresas tanto externas (11 de Setembro, crise financeira de 2008, pandemia), além das tradicionais reviravoltas políticas internas.
No geral, porém, observa-se uma boa aproximação entre a previsões do mercado (expressas pelo boletim Focus) quanto do governo (colhidas nos parâmetros orçamentários) em relação ao efetivamente ocorrido.
Até o valor do dólar, uma das variáveis mais difíceis de se prever (“Deus inventou o câmbio para humilhar os economistas”, diz a piada) apresenta uma discrepância abaixo de 10% em relação às estimativas com um ano de antecedência, exceto nos anos de grandes crises internacionais ou domésticas.
Em meio a tanta incerteza quanto às decisões que uma infinidade de agentes econômicos irá tomar, em 2024 precisamos comemorar o feito de o Banco Central, sob diferentes governos, tem conseguido há um quarto de século guiar as expectativas dos brasileiros (e dos estrangeiros que fazem negócios com o Brasil) a respeito do futuro com base na previsibilidade, na confiança e na credibilidade.
Bruno Carazza é professor associado da Fundação Dom Cabral e autor de “Dinheiro, Eleições e Poder: as engrenagens do sistema político brasileiro” (Companhia das Letras)”. Escreve às segundas-feiras
E-mail: bruno.carazza@gmail.com
Fonte: Valor Econômico