Por Victor Rezende — De São Paulo
19/06/2023 05h02 Atualizado há 11 horas
Enquanto já se forma um consenso no mercado quanto ao início de um processo de flexibilização da Selic no terceiro trimestre, as expectativas para o ponto final dos juros no ciclo que está prestes a começar compõem um leque de opiniões bem maior. Parte dos economistas já projeta uma taxa de juros próxima do nível neutro em 2024, mas outra ala espera que a Selic ainda permaneça no campo restritivo por um bom tempo.
Na pesquisa conduzida pelo Valor na semana passada, o ponto-médio das projeções para a Selic no fim do próximo ano aponta a taxa em 9,5%. A amplitude das estimativas, porém, é expressiva e, entre a mínima e a máxima, as projeções vão de 7,75% a 11,25%.
“Não precisamos de uma política tão contracionista, mas precisamos ver até onde o Banco Central conseguirá cortar os juros”, diz o economista-chefe da XP, Caio Megale, cujo cenário aponta para uma Selic de 12% no fim deste ano e de 11% em 2024. “Desse ponto em diante é preciso ter cuidado. Acredito que esse efeito de curto prazo de deflação no atacado deve começar a se dissipar. A inflação de alimentos é muito volátil e, se ela está afundando neste ano, existe uma chance de termos um repique no ano que vem”, o que, na visão de Megale, tornaria difícil a inflação ficar perto do centro da meta.
Ele destaca também a questão fiscal. “Apesar do arcabouço, temos uma política fiscal expansionista. Além disso, o governo está tentando flexibilizar a regra já em 2024. A sensação é de que o arcabouço pode estar ‘fazendo água’ antes mesmo de ser aprovado por completo”, diz. Para o economista, há uma pressão por mais gastos que, caso se materialize, limita o espaço para uma redução mais intensa da taxa básica de juros.
Há, ainda, uma discussão sobre o nível de equilíbrio da taxa de juros. O Banco Central tem trabalhado com um juro neutro de 4% em termos reais, mas o mercado já lida com uma taxa mais alta, em torno de 5%, e há, ainda, um debate sobre níveis ainda mais elevados.
A XP, de acordo com Megale, tem trabalhado com um juro neutro em torno de 5% em termos reais. “Se a inflação se estabilizar em torno de 5%, é difícil imaginar uma Selic abaixo de 10%. Se for uma inflação de 4%, talvez o Banco Central consiga cortar um pouco mais, mas ainda assim acho difícil. Depois dessa primeira ‘pernada’ de corte de juros, a segunda parte será mais desafiadora, principalmente por causa do lado fiscal expansionista.”
“Se o BC cortar os juros em um ritmo moderado e o governo começar a ficar ansioso porque a redução está sendo lenta e decidir fazer um programa de concessões do BNDES, vamos ter um problema do lado da taxa Selic”, observa Megale. “Talvez a taxa de juros tenha que ser mais apertada”, aponta o economista da XP.
O economista-chefe do UBS BB, Alexandre de Ázara, trabalha com uma Selic de 9% no fim do próximo ano e avalia que é possível, até mesmo, um número mais baixo, em torno de 8,5%, a depender do comportamento da inflação. “Por mais pessimista que eu seja e espere uma inflação de 4% ou 4,5% no ano que vem, não seria preciso um juro de 12%… Considerando um juro real neutro de 4,5% ou 5%, a Selic ficaria em 8,5% ou, no máximo, 9,5%”, observa o economista.
Ázara aponta para um juro neutro entre 4,5% e 5% e descarta um nível de taxa de equilíbrio em torno de 6% em termos reais. “Vimos esse nível de juro neutro alguns anos atrás, durante o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, mas não estamos em uma situação fiscal parecida. Há um temor de se chegar a um cenário fiscal parecido, mas, ao menos neste momento, não estamos perto desse nível extremo. Estamos em um meio termo, o que torna um juro neutro de 5% um valor ‘justo’”, afirma.
O ambiente repleto de incertezas na economia brasileira também é um ponto observado pelo economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo, ao apontar que, até o momento, o governo tem emitido sinais positivos e negativos. “Por um lado, temos o arcabouço fiscal, que é importante porque sinaliza que existe alguém no governo preocupado com a questão fiscal, mas ele não estabiliza a dívida, a não ser que tenhamos um grande aumento da carga tributária. E é um arcabouço que tende a gerar crescimento sistemático dos gastos do governo”, pontua.
Nos cálculos de Camargo, o juro neutro deve estar entre 5% e 6% em termos reais. “A política monetária precisa compensar esse lado fiscal mais expansionista e isso exige uma taxa de juros relativamente mais alta do que a que teríamos se a política fiscal fosse mais equilibrada ou contracionista”, afirma o economista. Ele, assim, justifica o cenário mais conservador da Genial, que projeta a Selic em 11% no fim de 2024.
Fonte: Valor Econômico