Desde 2006, a participação da quantidade de fundos da categoria multimercados em relação ao total do setor foi sempre da ordem de 50%. Em alguns anos foi um pouco mais, e em outros, um pouco menos.
O ano de 2023 pode ter marcado o início de uma reviravolta, com tendência de queda da superioridade da categoria. Pela primeira vez, a quantidade de fundos multimercados encolheu para 45% do total.
A contrapartida da redução da categoria multimercados foi a alta da quantidade de fundos de previdência. Também pela primeira vez na história, a categoria atingiu uma participação de 14% do total.
A razão para isso, ao que tudo indica, foi a mudança na legislação que taxou o rendimento dos fundos fechados e exclusivos a partir do fim de 2023.
É praticamente unânime o entendimento de que o sistema tributário brasileiro tem uma série de distorções. E a tributação no mercado financeiro não é exceção.
O rendimento de uma aplicação de renda fixa, com mesmas características, pode ser isento de imposto ou tributado na fonte. O percentual da tributação na fonte pode variar de 22,5% até 15%. E a forma do recolhimento aos cofres públicos pode ser no resgate da aplicação ou a cada seis meses.
Nesse cipoal de regras muitas vezes incompreensíveis e que não raramente são alteradas, uma categoria específica de fundo multimercados ficou popular entre os investidores endinheirados. São carteiras fechadas, que não podem ter resgates e as amortizações só podem ser feitas uma vez por ano.
Uma carteira da categoria multimercado com essa característica também é chamada de fundo exclusivo, no jargão de mercado. Isso porque somente um investidor, ou uma família, tem, na prática, condições de investir em fundos com essas particularidades.
Para o investidor comum, a possibilidade de aplicar ou resgatar os recursos a qualquer momento é uma condição inegociável. No máximo, é possível aceitar algum prazo de carência para as movimentações.
Os fundos da categoria multimercados também têm a flexibilidade de investir em qualquer tipo de ativo. Isso dá a oportunidade para os gestores tentarem explorar eventuais movimentos ou distorções do mercado. O resultado final pode ser um bom lucro ou um prejuízo significativo.
Essa característica na política de gestão dos recursos é um atrativo para os investidores em fundos exclusivos. Especialmente porque os recursos precisam ficar aplicados a longo prazo para garantir os maiores benefícios fiscais.
Os fundos de previdência também podem ser do tipo multimercados. A política de investimento da carteira pode ser estabelecida de uma forma ampla, para dar liberdade ao gestor montar as mesmas estratégias que faria em um fundo multimercados.
E com uma vantagem adicional para o investidor a partir de agora. O percentual de tributação sobre os rendimentos pode chegar a 10% e ser recolhido somente no resgate. Isso porque os fundos de previdência exclusivos não estão sujeitos às mesmas regras fiscais que os demais fundos de investimento.
Ao que tudo indica, uma parte dos investidores em fundos multimercados exclusivos pode estar migrando as aplicações para fundos de previdência exclusivos. Por isso o aumento da quantidade de fundos. É uma forma, também, de evitar o pagamento do chamado “come-cotas”, que é o recolhimento semestral do imposto de renda.
Para o investidor comum, que não tem recursos suficientes para aplicar em um fundo exclusivo, é importante entender as movimentações do setor para tomar decisões mais acertadas. O fato de centenas de fundos de previdência estarem sendo criados não significa, necessariamente, que um segmento passou a ficar mais interessante do que outro.
O setor de fundos de investimento no Brasil é muito amplo e acaba incorporando diversos nichos específicos do mercado. Como parece ser o caso da diminuição da quantidade de fundos da categoria multimercados e aumento do número de fundos de previdência.
Marcelo d’Agosto é economista especializado em administração de investimentos com mais de 20 anos de experiência no mercado financeiro.
Fonte: Valor Econômico

