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Os EUA têm cerca de 244 milhões de pessoas aptas a votar no ciclo eleitoral que se encerra nesta terça-feira, mas apenas algumas dezenas de milhares de pessoas irão decidir os rumos da eleição em sete Estados, onde a disputa entre Kamala Harris e Donald Trump está indefinida. Pelo Colégio Eleitoral americano, Estados com forte tendência a um partido não costumam ter disputas competitivas, fazendo com que dos 50 Estados americanos, só 7 sejam considerados competitivos nestas eleições: Arizona, Geórgia, Michigan, Nevada, Carolina do Norte, Pensilvânia e Wisconsin.
Na maioria do 50 Estados, com exceção do Maine e Nebrasca, o candidato mais votado recebe 100% dos delegados, “o vencedor leva tudo”, não importando a diferença. Em 2020, por exemplo, o democrata Joe Biden venceu na Geórgia por menos de 12 mil votos.
Entre os Estados de maior atenção nessa disputa eleitoral está a Geórgia, no sul do país, onde os republicanos tinham domínio sólido até 2020, quando Biden conseguiu a primeira vitória democrata no Estado desde 1992.
O Estado esteve no centro das alegações infundadas de fraude por parte da campanha de Donald Trump em 2020, quando ele pediu para que autoridades eleitorais do Estado para que “encontrassem” votos para ele. Ele e outras 18 pessoas foram acusados de conspirar para reverter o resultado.
Cerca de um terço da população da Geórgia é negra – uma das maiores proporções dos Estados Unidos – porém, esse grupo demográfico, de forte tendência democrata, pode não ser suficiente para garantir a vitória de Kamala Harris no Estado.
“A população negra na Geórgia é fortemente democrata, mas mesmo se 90% desse grupo votar em Kamala e cerca de 70% da população branca votar em Trump, os democratas ainda estão em desvantagem”, disse Andra Gillespie, professora de ciências políticas na Universidade de Emory, na Geórgia. “A questão será se Kamala conseguirá convencer pessoas de todas as raças a votar para ela”.
Assim como mostram as tendências nacionais, a situação na Geórgia deverá mostrar maior votação para Kamala em áreas urbanas enquanto Trump tem maior votação em regiões rurais, o que explica o esforço da campanha da vice-presidente nestas áreas.
Durante os meses que antecederam as eleições, democratas viajaram para o interior do Estado para dialogar com locais, buscando convencê-los de que as medidas econômicas de Biden foram benéficas para a região. O objetivo, porém, não é vencer nestes condados, mas diminuir a margem de vitória de Trump.
“Democratas não tem nenhum tipo de vantagem no Estado, eles precisam chegar a eleitores que não costumam votar neles, não podem deixar nenhum voto para trás. Mesmo que você perca em algumas áreas rurais, você precisa diminuir a margem da derrota”, disse Gillespie, ressaltando que o crescimento dos subúrbios também pode ajudar a campanha democrata. “O comparecimento será a chave para definir o vencedor”.
A dicotomia entre campo e cidade também será decisiva no Estado de Wisconsin, outro local que se tornou “pêndulo” desde o surgimento de Trump – dessa vez com os democratas perdendo o domínio que vinha desde 1988.
A importância do Estado ficou clara pela escolha republicana para o local da conferência que confirmou Trump como candidato, em Milwaukee, capital regional. O ex-presidente chegou a dizer que caso vença em Wisconsin, vencerá a disputa pela Casa Branca.
“Mudanças demográficas e econômicas deram aos democratas uma vantagem, embora precária”, explica Donald Downs, professor emérito e PHD em ciência política pela Universidade Wisconsin-Madison. “Entre as razões está a mudança dos subúrbios de Milwaukee, afastando-se dos republicanos, enquanto as áreas rurais sentem-se negligenciadas pelas elites e ativistas democratas tendem a ter um voto republicano”.
Para Downs, a grande questão do Estado será analisar qual tendência sairá dominante neste processo de mudança demográfica.
Outro Estado que se tornou pêndulo graças a mudanças demográficas é a Carolina do Norte, que vota a favor dos republicanos em eleições presidenciais desde 1980, com exceção de 2009.
A taxa de participação será a chave para definir o vencedor”
Desde 2020, a população da Carolina do Norte aumentou em quase 400 mil pessoas, ficando atrás apenas do Texas e da Flórida. Esse crescimento resultou em um aumento de eleitores brancos com educação universitária, um forte crescimento nas populações latina e asiático-americana, e cerca de 1 em cada 5 eleitores é negro, segundo levantamento da rede pública de rádio dos EUA, “NPR”.
A Carolina do Norte vem mudando. O eleitorado está mais jovem e menos branco”, explica Pope “Mac” McCorkle, professor de prática na Escola de Políticas Públicas Sanford da Universidade Duke. “O que tem acontecido no Estado é que, embora esteja ficando menos branco, cada vez mais eleitores brancos estão votando nos republicanos, especialmente pessoas mais velhas, que têm votado ou até mesmo se tornado republicanas”.
McCorkle explica que a Carolina do Norte tem um alto número de eleitores não afiliados que tendem a votar nos democratas por questões nacionais, como o aborto. “Eleitoras podem decidir o voto com base nas questões do aborto mesmo não sendo de esquerda”.
O fiel da balança. O caminho para a Casa Branca passa pela Pensilvânia. Com 19 delegados em jogo, o Estado é considerado o mais importante entre os competitivos. A importância é tamanha que os democratas gastaram cerca de US$ 159 milhões em propagandas no Estado enquanto os republicanos desembolsaram US$ 121 milhões.
A eleição na Pensilvânia deverá ser guiada por temas nacionais, como economia e aborto, segundo pesquisa do veículo local “Spotlight PA”. A pesquisa mostrou que o aborto é um tema que mobiliza principalmente mulheres, tornando a diferença de gênero um fator determinante no Estado.
Um levantamento da rede de TV NBC mostrou que a Pensilvânia registrou um alto número de novas eleitoras nos primeiros dias de votação antecipada, o que pode favorecer Kamala. Além disso, vai de encontro com o levantamento da CNN de que entre os eleitores que já votaram no Estado 57% escolheram a democrata.
“Provavelmente veremos a maior diferença de gênero na história recente das eleições americanas. O aborto será um tema muito importante e estará relacionado ao apoio relativo aos candidatos entre homens e mulheres. Mulheres tendem a votar em Kamala pelo apoio a este tema”, explica Michael Traugott, professor emérito do Centro de Estudos Político da Universidade de Michigan.
Influência geopolítica. Se temas nacionais e locais costumam guiar os eleitores na eleição americana, no Michigan uma questão geopolítica será determinante: o conflito no Oriente Médio.
Michigan tem a maior comunidade árabe dos EUA, com cerca de 300 mil pessoas, um grupo que ganhou importância desde o início das guerras no Oriente Médio por se opor ao apoio do presidente Biden ao governo israelense.
A crítica ao apoio dos EUA a Israel fez com que mais de 100 mil eleitores democratas registrados votassem na opção “não comprometido” nas primárias do partido.
O movimento foi uma maneira de expressar contrariedade, e pode se refletir na eleição.
“Lideres árabes pediram para não votar em nenhum candidato”, explica Traugott. “Movimento da população árabe pode afetar cerca de 100 mil votos, cuja maioria deveria ir para Kamala”.
Em 2020, Biden venceu no Estado por uma diferença de cerca de 154 mil votos, e neste ano a previsão é de um resultado ainda mais apertado, que pode ser definido pelas ausências de árabe-americanos, segundo Traugott.
Outro fator de atenção será a maneira como os trabalhadores das fábricas locais irão votar. Se Kamala recebeu forte apoio de líderes sindicais, Trump tem a preferência dos trabalhadores que temem perder seus empregos devido à entrada de produtos chineses, especialmente veículos elétricos.
“Há tarifas sobre veículos elétricos na China, mas até o momento não estamos vendo muitos nos EUA. Os veículos elétricos são uma questão relativamente importante, mas sob duas perspectivas diferentes entre um segmento da população com alta participação eleitoral”, explica Traugott.
O cinturão do sol. Além da Geórgia, os outros dois Estados-pêndulo no sul dos EUA são Arizona e Nevada, próximos da costa oeste e que compartilham não só o clima desértico, mas também a divisão partidária que marcou o país nos últimos anos.
Nevada era o grande “indicador” da eleição americana, votando – com exceção de 1976 – no vencedor da eleição. Trump quebrou essa escrita em 2016, quando foi eleito presidente, mas Biden retomou a tradição.
A condição de “indicador de resultado” de Nevada pode ser explicada pelo fato de que cerca de 40% dos eleitores registrados do Estado não tendem a nenhum partido, deixando a disputa aberta para qualquer cargo.
Outro fator que pode pesar na eleição é a economia, já que Nevada sofre com uma das piores recuperações pós-pandemia. O Estado tem uma das maiores taxas de desemprego de todos os Estados do país, com 5,4%, em comparação com a média nacional de 4,2%.
“A taxa relativamente alta de desemprego em Nevada provavelmente se deve a questões mais normais do ciclo econômico, como a oferta e demanda de empregos e trabalhadores disponíveis, além das taxas de juros mais altas, que reduzem o investimento em indústrias como a construção”, explica Jeremy Gelman, professor da Universidade de Nevada, Reno.
O Estado também tem uma porcentagem ligeiramente menor de adultos com diploma universitário, cerca de 29%, em comparação com 36% da média nacional. A divisão entre eleitores com ou sem diploma universitário tem sido uma das divisões políticas mais importantes das últimas eleições.
“Nos últimos anos, mudanças demográficas tornaram Nevada ainda mais competitivo, especialmente porque eleitores sem diploma, em uma proporção mais alta do que o normal em comparação com o resto do país, têm se alinhado cada vez mais com o Partido Republicano”, explica Gelman.
A mudança demográfica também está ocorrendo no Arizona, que vota republicano desde 1952, com exceções nos pleitos de 1992 e de 2020, quando Biden venceu por pouco mais de 10 mil votos.
“Arizona vive um momento político de transformação”, disse Lisa M. Sanchez, professora na Universidade do Arizona. “Historicamente, o Estado era uma vitória fácil para os conservadores. Com um aumento na população – especialmente a latina – começamos a ver o Arizona como um Estado que não é mais tão garantido”.
Segundo Sanchez, o crescimento populacional, a diversidade e as mudanças demográficas são os fatores que explicam porque o Arizona se tornou competitivo.
Fonte: Valor Econômico

