A sinalização mais concreta de que há um esforço do presidente Lula e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para chegar a um denominador comum em termos de corte de gastos alimentou um dia de alívio local, com um recuo mais expressivo do dólar e dos juros futuros e uma subida do Ibovespa.
Depois de um pregão em que a divisa americana chegou a R$ 5,86, em uma sessão marcada pelo forte ajuste para cima nos prêmios de risco, a notícia de que Haddad cancelou a viagem à Europa para sentar-se à mesa com ministros de outras pastas e com Lula para discutir as medidas de corte de gastos, na tarde de ontem, foi bem vista por agentes financeiros. Após uma longa reunião, assessores da Fazenda informaram que o quadro fiscal do país foi “apresentado e compreendido” e que mais ministérios serão chamados para novo encontro para discutir o assunto.
Ontem, o dólar comercial exibiu queda de 1,48%, a maior depreciação da divisa desde 23 de agosto, cotado a R$ 5,7831. O real foi, de longe, a moeda com melhor desempenho no dia entre as 33 mais líquidas acompanhadas pelo Valor.
O forte movimento do câmbio refletiu o alívio na percepção de risco local após Haddad permanecer no Brasil. “A viagem não só deixaria o mercado ‘no escuro’ por mais alguns dias quanto ao tema fiscal, como o advento de uma viagem trouxe interpretações de que o tema fiscal era de importância menor para o ministro”, afirma o economista-chefe da Somma Investimentos, César Garritano.
O especialista não descarta uma possível apreciação do real, a depender do que for apresentado pelo governo. “Na nossa concepção, caso o tema fiscal seja minimamente equacionado, há espaço para o nosso real apreciar: a atividade econômica segue pujante, o mercado de trabalho vem tendo desempenho forte, as contas externas seguem saudáveis, o diferencial de juros é gigantesco e seguirá aumentando, dentre outros fatores”, afirma. “Modelos de ‘preço justo’ de nossa moeda, no nosso modo de entender, dizem que o valor nominal na moeda está mais perto de R$ 5,00 do que de R$ 6,00.”
A desvalorização da moeda americana não ocorreu apenas contra o real e foi intensificada pela melhora nas chances de vitória da democrata Kamala Harris na corrida eleitoral americana e ajustes no chamado “Trump trade”, estratégia que inclui apostas na apreciação do dólar e em juros mais elevados nos EUA, diante de uma perspectivas de inflação maior. “Ainda que, na nossa visão, os mercados sigam espelhando maior chance de vitória do ex-presidente”, acrescenta Garritano.
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A curva a termo doméstica também passou por um forte movimento de alívio, após uma sessão de amplo estresse na sexta-feira, que levou os juros futuros às máximas desde março de 2023.
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) com vencimento de janeiro de 2026 caiu 13,09%, do ajuste anterior, a 12,88%; e a do DI de janeiro de 2031 despencou de 13,22% a 12,97%.
“É possível que o Brasil tenha uma performance mais positiva no curto prazo em relação a outros emergentes. Mas pensando a médio e longo prazo, acho que continuamos vivendo os mesmos problemas”, diz Guilherme Preciado, sócio e membro da equipe de gestão do fundo Opportunity Total, que tem pouca convicção em relação aos mercados no Brasil e, por isso, mantém um nível baixo de risco alocado no país.
Na visão de Preciado, a curva de juros futuros precifica um nível de risco “razoável”, levando em conta que o ciclo de aperto monetário do Banco Central e os riscos atrelados à questão fiscal e às eleições americanas. “Quanto mais olhamos no detalhe, mais percebemos que está realmente dividido”, diz o gestor em relação ao resultado da disputa entre Kamala Harris e Donald Trump à presidência dos EUA.
O movimento também foi positivo no Ibovespa, que conseguiu ganhar tração e encerrar a sessão no campo positivo, com alta de 1,87%, aos 130.515 pontos, perto da máxima do dia.
O fechamento mais significativo da curva futura de juros ajudou a elevar os ganhos de ações cíclicas domésticas, caso de Cogna ON, que ficou na liderança entre as maiores valorizações do Ibovespa, com alta de 11,03%, a R$ 1,51. O valor de mercado da companhia voltou a ser de R$ 2,83 bilhões. Montantes acima desse patamar não eram vistos desde 9 de agosto, quando chegou a R$ 2,85 bilhões.
Entre as blue chips, as units do BTG Pactual obtiveram destaque, ao subir 4,45%, a R$ 33,10, em uma sessão em que papéis com “beta maior” foram beneficiados.
Lucas Souza, sócio-fundador da Ciano Investimentos, conta que o banco responde pela maior posição da casa dentro do setor financeiro neste momento.
Segundo ele, a instituição tem conseguido alinhar crescimento, desenvolvimento e ganho de mercado no quesito experiência em banco de atacado, além de investimento em pessoa física e na parte de banking.
Souza acredita que o banco entregará um balanço positivo para o terceiro trimestre, com destaque para a abertura de contas pessoa física e captação de recursos para investimento.
Fonte: Valor Econômico

