O quadro econômico atual de desaceleração da atividade e melhora da inflação contrasta com a postura persistentemente conservadora de integrantes do Comitê de Política Monetária Copom) do Banco Central, o que leva à expectativa praticamente unânime do mercado de que o colegiado manterá a Selic parada em 15% nesta semana.
Das 112 casas consultadas, apenas duas esperam que o ciclo de cortes da taxa Selic se inicie já na reunião do dia 10. Para os economistas ouvidos pelo Valor, o Copom deve manter um discurso mais cauteloso e preservar algum grau de liberdade para a decisão de janeiro. O levantamento revela, ainda, uma divisão do mercado em relação à primeira reunião de 2026: 54% acreditam que será o mês do início do ciclo de flexibilização, ao passo em que 44% esperam que os cortes serão adiados para o encontro de março e adiante.
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A postura bastante cautelosa dos diretores do BC — em especial do presidente da autarquia, Gabriel Galípolo — deixa o mercado em dúvida acerca de possíveis sinalizações do comunicado da decisão desta semana. Entre aqueles que não esperam grandes alterações em relação ao documento da reunião de novembro do Copom, Marcela Rocha, economista-chefe para América Latina da Principal Asset Management, considera que há um incentivo pequeno para o Copom suavizar a sua comunicação neste momento. Para ela, o conteúdo deve ter pouquíssimas alterações e a projeção de inflação do BC dentro do horizonte relevante seguirá em 3,3%.
“Um corte em janeiro seria justificável, mas a comunicação do BC ainda tem sido dura. O BC não tem mostrado euforia com os números melhores de inflação corrente e não dá muita ênfase a essa desaceleração da atividade. O próprio Galípolo tem dado mais importância aos dados ainda resilientes do mercado de trabalho”, destaca.
Embora tenha em seu cenário-base um corte de 0,25 ponto percentual da Selic em janeiro — para 14,75% —, Rocha avalia que a convicção é baixa justamente por conta da postura conservadora do Copom, e entende que há mais chances de o primeiro corte passar para março.
“O que nos deixa ainda com janeiro foi a sinalização dada pelo Galípolo quando ele fala sobre o termo “bastante prolongado”. Havia um desconforto entre nós sobre pensar em cortar juros com essa frase [na comunicação], mas ele reduziu a importância dessa frase”, lembra a economista da Principal.
Rocha se refere à participação do presidente do BC em evento organizado pela XP Investimentos na segunda-feira (1), quando ele afirmou que a manutenção, ou não, do trecho do comunicado que descreve um “período bastante prolongado” de juros elevados não indica qualquer decisão do Copom à frente. “Não sei se a gente tem a necessidade ou obrigação de criar algum tipo de código dentro da comunicação que vá telegrafar quando o BC vai fazer algo”, disse Galípolo.
Nesse sentido, Rocha não vê mais na manutenção da frase no comunicado da reunião de dezembro um impeditivo para que o BC corte os juros em janeiro. No entanto, ela admite que, em relação à expectativa do mercado, “a régua para cortar fica ainda mais alta”.
“Precisaríamos ver uma evolução de dados surpreendendo positivamente, e não apenas em linha com o esperado, e talvez uma nova rodada de queda das expectativas de inflação do relatório Focus”, diz ela. Achamos que os dados de inflação podem vir na ponta mais otimista, mas o mercado poderia, sim, ficar ainda mais cético com o corte em janeiro.”
Para Rafaela Vitória, economista-chefe do Inter, a sinalização sobre o termo “bastante prolongado” tem pouca importância e não deveria significar nenhuma indicação sobre os próximos passos da política monetária.
“O ‘bastante prolongado’ se refere a todo o período de restrição monetária, que vai continuar. A Selic continuaria muito restritiva mesmo se fechar o ano [de 2026] em 12%, que é a nossa projeção”, diz. Ela admite, contudo, que um comunicado muito parecido com o da reunião de novembro indicaria pouca abertura para discutir cortes da Selic.
“Esperamos em outros parágrafos esse indicativo. Estamos muito distantes da taxa neutra [que não estimula nem comprime a demanda], o começo dos cortes servirá para tirar um pouco do excesso.”
Ivo Chermont, economista-chefe da Quantitas, considera que o presidente do BC foi bem sucedido ao desarmar o termo e diminuir a importância que a permanência da frase no comunicado teria para os próximos passos da política monetária. Nesse sentido, o BC não deve querer se comprometer com nenhum cenário, dada a grande quantidade de dados que ainda devem vir até a reunião de janeiro, avalia.
“O Galípolo costuma dizer que não é que ele sabe e não quer dar a dica; é que ele realmente não sabe. Acredito que a linguagem que o Copom utilizará será ‘neutra’ aos preços de mercado de hoje e não vai passar nenhuma sinalização concreta”, afirma o economista, que espera um primeiro corte da Selic apenas em março do ano que vem.
Ainda, na visão de Chermont, houve outras oportunidades em que o BC deu início aos cortes de juros com a projeção de inflação ainda “ao redor da meta”, mas a estratégia seria mais arriscada desta vez, já que as expectativas de longo prazo no Focus também estão desancoradas.
“Seria a primeira vez que o Copom cortaria os juros com o modelo fora da meta e com o Focus também fora da meta. É mais um motivo para esperar. Ganharia três ou quatro meses para o Focus se aproximar do centro da meta. Dados os preços de mercado, uma surpresa para o lado ‘hawk’ [mais restritivo] ajudaria na convergência das expectativas. E até o calendário ajudaria: de janeiro a março tem o carnaval e haveria pouco ruído político. Seria muito vantajoso.”
Chermont reconhece, no entanto, que se os dados de atividade do quarto trimestre derem sinais mais fortes de desaceleração da atividade, o cenário poderia mudar. A gestora espera uma Selic de 11,50% no fim de 2026.
Na ponta mais otimista, Vitória, do Inter, vê espaço para o ciclo de cortes começar em janeiro, com base no quadro de desaceleração da atividade e da inflação, o que deve se refletir no comunicado do Copom nesta semana, prevê.
“Nossa expectativa é por um comunicado um pouco menos duro, abrindo espaço para a discussão de queda da Selic em janeiro”, diz ela. Na sua avaliação, há espaço para um recuo adicional das expectativas de inflação do Focus, além de um cenário externo mais positivo, com a perspectiva de continuação do ciclo de cortes de juros pelo Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) mantendo o dólar comportado, o que ajuda no processo de desinflação.
Vitória também considera que os últimos dados de atividade, em especial o PIB do terceiro trimestre, mostraram um arrefecimento “mais claro” da atividade, além da desaceleração gradual que consta no cenário-base do Copom. “A desaceleração ficou mais clara, principalmente pela composição qualitativa [do PIB] com queda maior do consumo, o que favorece o cenário prospectivo de inflação em queda.”
O cenário-base do Inter é de uma Selic em 12% ao fim de 2026, projeção próxima daquilo que o mercado embute na curva de juros futuros. Por enquanto, segundo Vitória, não há por que identificar o cenário eleitoral como um impeditivo para a redução dos juros no curto prazo, mas se a volatilidade tradicional do período levar o dólar a patamares mais próximos de R$ 6, é possível que o Copom se veja obrigado a diminuir a extensão do ciclo de cortes da Selic.
Já Rocha, da Principal, espera um corte menor da Selic ao longo do ano que vem, para o patamar de 13%. Segundo ela, o mercado de trabalho resiliente e as medidas de estímulo à demanda esperadas para o ano eleitoral colocam um risco de alta para o crescimento da atividade, o que pode alimentar a inflação.
Além da volatilidade eleitoral e as perspectivas fiscais voltando ao foco, ela identifica um cenário externo menos favorável ao real. “Apesar de o diferencial de juros ser contra o dólar [com a flexibilização monetária do Fed], o crescimento da economia dos EUA ainda será de mais de 2%. Então, não vemos muito espaço para o dólar se desvalorizar. Com um dólar um pouco mais forte ou estável, o ambiente de maior incerteza por aqui por conta da eleição pode pesar na moeda brasileira”, afirma.
Fonte: Valor Econômico
