Por Victor Rezende e Augusto Decker — De São Paulo
19/06/2023 05h02 Atualizado há 7 horas
É praticamente certa a manutenção da Selic em 13,75% na decisão desta semana do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC). No entanto, a comunicação do colegiado será observada com lupa pelos agentes do mercado. Surpresas baixistas na inflação corrente, viés de queda nas expectativas de inflação, apreciação do câmbio e redução do risco fiscal são fatores que, nas últimas semanas, levaram o mercado a antecipar as expectativas para o início do ciclo de cortes na Selic e a esperar um tom mais suave do colegiado.
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Nível da Selic no fim do ciclo de cortes ainda é incerto
De 122 instituições financeiras ouvidas pelo Valor, apenas duas esperam que o colegiado já reduza a taxa básica de juros nesta semana, enquanto as outras 120 projetam manutenção. O levantamento aponta, ainda, que a mediana das projeções já indica uma redução na Selic em agosto – o que mostra uma antecipação em relação à pesquisa anterior, divulgada em 2 de maio, quando o ponto-médio das estimativas indicava o início do ciclo de cortes em setembro. Já para o fim do ano, a mediana das projeções passou de 12,5% para 12,25%.
Embora a manutenção dos juros em 13,75% nesta semana seja quase unânime, a decisão tende a ser relevante para moldar as expectativas dos agentes de mercado em relação aos rumos da política monetária. Com o IPCA de maio abaixo do esperado e a deflação expressiva de preços no atacado, as expectativas de inflação começaram a se ajustar para baixo e há, ainda, uma aposta de que esse processo pode se intensificar, após a reunião do Conselho Monetário Nacional (CMN) no fim do mês, se o ponto central da meta de inflação for mantido em 3%.
A melhora no cenário inflacionário, assim, abre espaço para que, na decisão desta semana, os agentes enxerguem um abrandamento do Copom em sua comunicação. No entanto, embora boa parte do mercado já espere uma redução nos juros em agosto, há ceticismo por parte dos agentes quanto a uma indicação mais direta de início de um ciclo de flexibilização.
“Naturalmente o tom do comunicado vai abrandar um pouco, como reflexo dos desdobramentos de um movimento desinflacionário forte na parte de bens”, enfatiza o superintendente de pesquisa econômica do Santander, Mauricio Oreng. “E, embora a inflação de serviços esteja bem alta, também vimos ela cedendo um pouco. Além disso, as expectativas deram um leve toque para baixo, as condições de mercado estão melhorando e o rali dos ativos continua, principalmente no câmbio. Isso sugere que parte dos vetores desinflacionários dos preços de bens pode esticar um pouco mais.”
Oreng pontua que alguns elementos para que o BC comece a trabalhar com a ideia de inflexão do ciclo já estão na mesa, “mas não para agora”. “Precisamos ver como o BC vai calibrar isso na comunicação. Tenho a impressão de que não haverá sinais tão claros de corte de juros em agosto, mas essa possibilidade vai ficar em aberto. Vamos ver um abrandamento do discurso, mas com alguns elementos de cautela ainda presentes”, observa.
O apontamento de Oreng se refere a apresentações recentes do presidente do BC, Roberto Campos Neto, em que ele mostrou um quadro de indicadores macroeconômicos e de mercado e os comparou com a situação de ciclos anteriores. “Pelas comparações feitas, o BC sugere que o progresso ainda não foi suficiente. Por isso tenho impressão de que vão abrandar o tom, mas não será algo extremo em que o BC já telegrafa a ideia de corte em agosto.”
É um sentimento compartilhado com o diretor de pesquisa para América Latina do BNP Paribas, Gustavo Arruda, cujo cenário contempla o início de um ciclo de flexibilização da Selic em setembro. “Eu ficaria bastante surpreso se tiver algo muito explícito indicando cortes nos juros agora”, diz.
“Vimos uma melhora conjuntural, mas ainda não dá para cantar vitória. Acredito que o Copom pode retirar a história de que pode voltar a subir juros. O papel desse trecho perdeu a razão de existir, até porque o mercado já precifica muitos cortes. Espero mais algo nesse lado do que uma mudança generalizada no discurso”, diz Arruda.
A melhora de cenário destacada por Arruda fez o BNP Paribas antecipar o início do ciclo de redução da Selic de 2024 para setembro. “A inflação despencou. A nossa projeção passou de 6,5% para 4,7% neste ano”, enfatiza o economista.
No entanto, ao apontar que as mudanças ainda são “muito recentes”, Arruda sugere cautela, ao se referir à convergência para a meta das expectativas de inflação. Além disso, ele lembra que agosto será a primeira reunião de novos membros do Copom. “Tenho a impressão de que, nessa transição, o BC ganharia mais se fosse um pouco mais conservador do que o que está precificado no mercado hoje.”
A economista-chefe da Canvas Capital, Camila de Faria Lima, também espera a retirada da menção à possibilidade de novas altas da Selic. “O segundo ponto [de mudança na comunicação] tem a ver com a descrição do cenário que temos e que estamos vislumbrando à frente. A meu ver, tivemos melhora no cenário prospectivo para a inflação, e acredito que deva haver reconhecimento dessa melhora”, diz.
O balanço de riscos não necessariamente deve ficar assimétrico, mas a aprovação do arcabouço fiscal na Câmara e a melhora na percepção de risco fiscal podem ajudar nessa avaliação, na visão da economista. A Canvas, inclusive, já sustenta há algum tempo o cenário de início dos cortes de juros em agosto, ao esperar uma redução no grau de aperto monetário.
“Há uma diferença entre um ciclo de corte de juros para que eles cheguem ao nível neutro ou ao campo expansionista, e um ciclo de corte de juros para reduzir o grau de aperto”, diz. “Hoje, acho que estamos com muito juro. Houve melhora de cenário desde que eles chegaram a esse patamar. Um juro de 13,75% com expectativa de inflação de 4% é um aperto muito expressivo. Acredito que ainda não podemos ter política monetária neutra, mas isso não significa que não haja espaço para corte.”
Nesse sentido, o economista-chefe da BB Asset Management, José Maurício Pimentel, diz esperar que o ciclo de desaperto tenha início em setembro, mas não desconsidera a reunião de agosto. “Não é possível descartar. Entendemos que há espaço”, diz. Para ele, inclusive, o comunicado deve reconhecer a melhora de cenário, especialmente com a inflação cadente.
“O que ainda não dá muito conforto para iniciar o ciclo é o fato de as expectativas de inflação no Focus estarem acima do centro da meta, em 4%. Elas estão recuando, mas, no nível atual, ainda não dariam conforto total para o Copom começar o ciclo”, diz Pimentel.
A BB Asset, no momento, sustenta um cenário de Selic a 12,25% no fim deste ano, com três cortes de 0,5 ponto a partir de setembro, e uma taxa de 9,5% em 2024. Pimentel, porém, enfatiza que as projeções para a Selic têm viés de baixa. “Vemos cortes de 0,5 ponto, mas talvez o ritmo acelere para 0,75 ponto, e não é de todo impossível que isso já aconteça neste ano”, enfatiza. “É uma possibilidade que não dá para ser descartada.” (Colaborou Anaïs Fernandes)
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Fonte: Valor Econômico

