Investidores estrangeiros, incluindo grandes fundos globais, estão participando ativamente de processos para a compra de centros de dados no país. Há crescente demanda por infraestrutura de dados combinada a uma intenção de diversificação de investimentos. O Brasil, que tem disponibilidade de energia para operar “data centers”, está na mira desses investidores, em operações bilionárias que já estão começando a sair do papel. O setor cresce a uma taxa de dois dígitos por ano.
A Scala Data Center, por exemplo, que já possui investidores estrangeiros como Rosewood Capital e Banco Mundial, recebeu neste ano investimentos de US$ 500 milhões, com aportes da gestora americana Coatue Tactical Solutions e do fundo de pensão canadense Imco, recursos que serão utilizados para acelerar a expansão da empresa.
Há também um movimento de venda de empresas, aproveitando o interesse dos investidores globais. Recentemente, por exemplo, a Scala contratou o Deutsche Bank para estruturar sua venda, apurou o Valor. Já a Ascenty não lançou processo de venda formal, mas a Brookfield, sua acionista, está sondando o mercado, antecipou o Pipeline, site de negócios do Valor. Há dois anos, o Pátria vendeu a Odata para a Aligned Data por US$ 1,8 bilhão.
A Elea Digital também estaria analisando a venda de uma fatia minoritária, segundo fontes. Procurada, a Piemonte Holding, controladora da Elea Data Centers, nega que busque a venda de uma fatia da companhia e diz que pretende seguir com seus planos de investimento no país no longo prazo. O fundador e CEO da Piemonte Holding, Alessandro Lombardi, reforça que “ qualquer venda seria uma violação de compromissos firmados com stakeholders”. “Embora bancos de investimento, locais e estrangeiros, frequentemente apresentem potenciais compradores, nenhuma dessas propostas foi adiante”, destacou.
A questão é que a demanda é crescente. Os clientes dos centros de dados de hiperescala, os de maior capacidade, são “big techs” como Google, Meta, Amazon e Microsoft. Além destas, clientes importantes são operadoras de telecomunicações, bancos, “fintechs” e grandes companhias de diversos setores. No caso das gigantes de tecnologia, há o investimento em infraestrutura própria, mas também fazem a contratação de serviços de terceiros, dada a alta necessidade de capacidade.
Essa é uma indústria relativamente nova, que vem com essa economia digital”
Provando a demanda no setor, a AWS, da Amazon, anunciou neste ano investimentos de R$ 10 bilhões no Brasil. A V.Tal, do BTG Pactual, por sua vez, informou um investimento peso-pesado no setor, depois de anunciar a criação de uma subsidiária que atuará só com data centers, batizada de Tecto, com aportes iniciais de US$ 1 bilhão. Já Piemonte anunciou que vai lançar uma gestora para investir em “data centers”. No país, grandes bancos têm seus próprios “data centers”, assim como a B3.
Estudo da consultoria Oliver Wyman, aponta que a tendência é que novos participantes desse mercado entrem no país por meio de aquisições, para depois crescerem organicamente. Segundo o estudo, a demanda tem sido puxada pelo maior tráfego de dados no país, diante do maior uso de serviços na nuvem e novas tecnologias, como a inteligência artificial e internet das coisas. A consultoria aponta que atualmente a oferta do mercado brasileiro de “data centers” é de 740 MW e outros 470 MW estão em fase de planejamento ou construção.
O sócio da prática de comunicação, mídia e tecnologia da consultoria, Felipe Hildebrand, diz que a estratégia de comprar operações é uma porta de entrada para os investidores, visto que com uma aquisição de um ativo estratégico se conquista reputação, relacionamento, além de contratos importantes. “A partir daí, se expande organicamente”, afirma.
Hildebrand lembra que hoje os múltiplos dos ativos do setor estão muito altos, em 20 vezes o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização). Ao contrário de outros setores em que esse indicador caiu, nesse ele segue em expansão, indicando interesse de investidores. O executivo frisa que, há alguns anos, o Brasil usava essa infraestrututra, principalmente, nos Estados Unidos, mas novas tecnologias trouxeram a necessidade dos “data centers” ficarem mais perto do consumidor.
“Essa é uma indústria relativamente nova, que vem com essa economia digital, com o crescimento exponencial do uso de dados”, diz. Com a inteligência artificial, observa, os holofotes voltaram-se ao setor, com mais centros de dados de supercapacidade chegando ao país. A projeção, segundo ele, é que a capacidade brasileira dobre em cinco anos. É natural, pondera, que grandes interessados no setor sejam os fundos de private equity (aqueles que compram participação em empresas), até por conta do retorno esperado desses negócios.
Hildebrand diz que outra agenda setorial está na mesa: transformar o Brasil em um “hub” para se exportar infraestrutura de dados, o que pode ser uma potencial alavanca de crescimento dessa indústria no mercado brasileiro. A favor do Brasil está a existência de energia barata e renovável, clima favorável – o país não é propenso a desastres naturais.
Mas para destravar essa agenda, o país precisaria criar incentivos ao longo da cadeia para ser competitivo e conseguir, com isso, atrair os investimentos necessários para o crescimento dessa indústria, diz Hildebrand.
O responsável pelo banco de investimento do UBS BB, Anderson Brito, aponta que a ampla necessidade de investimentos no setor tem impulsionado novos negócios. A necessidade por capacidade demandará, segundo ele, crescimento orgânico, que são intensivos em capital. Daí a necessidade crescente de novas injeções de capital.
Para o responsável pelo banco de investimento do Bradesco BBI, André Moor, o investidor estrangeiro tem olhado de perto esse setor no Brasil, inclusive grandes fundos globais, visto que os cheques para investimento são altos. “É natural que os estrangeiros venham para cá, e diluir um pouco os mercados [onde têm operações]”, diz o executivo. Segundo Moor, tanto o clima do país, quando disponibilidade de energia e dados traz ao país vantagem competitiva.
Procuradas, Scala e Brookfield não comentaram.
Corrida global
A corrida para construir centros de dados é disputada no mundo todo. Em meados de setembro a gestora de ativos BlackRock e a Microsoft lançaram um fundo de investimento de US$ 30 bilhões para construir “data centers” e tocar projetos de energia para atender às crescentes demandas decorrentes da inteligência artificial. A Microsoft e a MGX, a empresa de investimentos apoiada por Abu Dhabi, são sócias desse fundo. No Brasil, a Microsoft vai investir R$ 14,7 bilhões nos próximos três anos para ampliar a infraestrutura de computação em nuvem e IA – isso significa mais centros de dados. No início deste ano, a empresa já havia dito ao Valor que estava construindo ‘data centers’ na velocidade da luz. O mercado global de nuvem computacional no terceiro trimestre movimentou US$ 84 bilhões. E a Amazon Web Services (AWS), líder desse mercado, vê no Brasil uma fonte de energia renovável importante para seus projetos, disse, recentemente ao Valor, seu CEO, Matt Garman.
Fonte: Valor Econômico

