Ancorado em um primeiro bimestre de arrecadação provavelmente forte, mas refratário a contingenciamentos, o governo deve jogar a alteração da meta de resultado primário de 2024 para depois de março. Essa incerteza fiscal de curto prazo, no entanto, preocupa bem menos do que as dúvidas a respeito do que acontecerá com o arcabouço fiscal na segunda metade do governo. Essa é a avaliação de Gabriel Hartung, economista da SPX Capital.
“Minha preocupação não é tão grande em relação a se o fiscal desse ano vai ser exatamente [déficit de] 0,5%, 0,7% do PIB, se o governo vai precisar mexer na meta em março ou em maio”, afirma. O problema, diz, é que, ao mesmo tempo em que o novo regime fiscal criou limites para as despesas, ele também estabeleceu regras que aumentam os gastos, sobretudo a do reajuste do salário mínimo, que indexa várias outras contas.
“Todas essas regras de reajuste têm um efeito composto, você reajusta o salário mínimo hoje em 2,5%, depois em 2,5% de novo, vai tendo um efeito de composição que torna essa despesa cada vez maior e deixa cada vez menos espaço para o resto. Essa é a grande preocupação. E não é uma preocupação para 2024, é para 2025, 2026”, afirma o economista.
“O que o governo vai fazer ao se deparar com esse pouco espaço orçamentário que vai lhe restar no fim do mandato?”, questiona Hartung, acrescentando que mexer no arcabouço ao longo do governo “vai ser uma coisa muito grave”.
Em entrevista ao Valor, Hartung afirma que, se há algo do tema fiscal embutido na desancoragem das expectativas de inflação, é mais essa questão de médio prazo, além de dúvidas a respeito da composição futura do Banco Central.
Emprego no Brasil já foi para o limite de onde dá para ir sem gerar inflação hoje ”
Hartung diz considerar acertada a estratégia do BC de cortar a Selic em ritmo de 0,50 ponto percentual, porque isso permite ir ajustando o grau de restrição da economia em meio a um contexto cheio de incertezas, como o rumo dos juros nos Estados Unidos, os riscos e benefícios representados pela China e o mercado de trabalho apertado no Brasil.
Fonte: Valor Econômico

