O efeito líquido do tarifaço mundial implementado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil ainda é incerto, na avaliação de economistas. Por um lado, a taxação tende a gerar choques de incerteza e custos que afetam a atividade global e trazem, em alguma medida, viés baixista também para a economia brasileira, apontam. Por outro lado, dizem, o Brasil é um país relativamente fechado, e o governo federal local tem adotado uma série de medidas de estímulo à atividade que podem se sobrepor.
Segundo analistas, o tarifaço em geral traz um viés baixista para a atividade global pela via do aumento da incerteza e dos custos, o que sozinho já seria ruim para o Brasil, ainda que o país tenha sido menos afetado pelo tamanho da nova tarifa à importação nos EUA – de 10%, o piso anunciado.
Com as retaliações, em especial da China, porém, o Brasil fica mais exposto, já que tem uma correlação forte com a atividade no gigante asiático. Na última sexta-feira, a China retaliou as novas tarifas dos EUA com uma série de medidas, incluindo uma tarifa de 34% sobre todas as importações americanas, intensificando a briga comercial com Trump e derrubando ativos financeiros nos mercados pelo mundo, incluindo no Brasil.
Reportagem do Valor mostrou que discussões sobre o ritmo da atividade no Brasil, além das tarifas nos EUA, dominaram a reunião entre economistas do mercado financeiro e diretores do Banco Central na última segunda-feira (31). Segundo pessoas ouvidas pela reportagem, a preocupação com uma desaceleração mais acentuada da atividade tinha perdido força, e havia agora um viés de alta nas projeções para o PIB de 2025 com a adoção de mais medidas de estímulo pelo governo.
“Pode tirar um pouco o ímpeto da revisão altista do PIB [do Brasil], até porque temos de aguardar as respostas de outros parceiros comerciais e os possíveis resultados negativos para a economia global caso a guerra comercial se intensifique”, diz João Savignon, economista para Brasil da Kínitro Capital. “No entanto, acredito que as medidas para conter a queda da popularidade do presidente se sobrepõem no momento”, afirma.
De qualquer forma, continua Savignon, em termos relativos, o Brasil deverá perder menos que outros países, e a magnitude dessa perda dependerá de quanto a economia mundial se deteriorará.
Para Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos, o tarifaço seria negativo para o PIB do Brasil ao afetar as exportações do país. A parte positiva, diz, seria o Brasil entrar como substituto na relação entre EUA e outros países, mais tarifados. “Mas essa parte positiva ainda é só uma possibilidade, enquanto a tarifa nas exportações já é uma realidade”, afirma.
Nesse sentido, Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, também diz que o Brasil pode, eventualmente, se beneficiar do quadro global, “ainda mais se fizer por onde para ocupar o vácuo de abastecimento que os EUA criou”, afirma. “Mas é como dizem, vaca não dá leite, você tem de tirar. Se o Brasil não ocupar, outros ‘players’ o farão. Por enquanto, de líquido temos o efeito negativo de termos nossos preços elevados e uma perspectiva de desaceleração da atividade global.”
Os efeitos do tarifaço no mundo são considerados grandes principalmente no custo de capital e no câmbio. O Brasil não está imune, mas, por ser uma economia relativamente fechada, pode ter amortecedores, segundo economistas.
“Acho que no curto prazo não muda muito porque, como o Brasil é um país fechado, a desaceleração da economia mundial não ajuda, mas também não atrapalha muito”, diz Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners. “Para o ano que vem é que podemos ter algum efeito mais forte, que pode ser em ambas direções.”
Por um lado, diz, menos crescimento no mundo reduz investimentos; por outro, a queda das commodities e dos bens industriais pode ajudar a inflação e fazer com que a política monetária em 2025 não seja tão apertada quanto o esperado, ajudando o crescimento em 2026, pelos seus efeitos defasados.
Savignon, da Kínitro, pondera ainda que o efeito das tarifas nas exportações brasileiras tende a ser negativo em termos absolutos, mas pequeno no fim, dada a tarifa mínima aplicada e o fato de o Brasil exportar apenas cerca de 2% do PIB para os EUA.
Apesar da expectativa de recessão nos EUA, as medidas adotadas pelo governo brasileiro, algumas ainda em tramitação, devem sustentar um crescimento acima do previsto no Brasil, diz a equipe do ASA, citando, para 2025, o crédito consignado privado e, para 2026, a reforma do Imposto de Renda. Com isso, eles revisaram as estimativas de alta do PIB para 2,2% em 2025, de 1,5%, e para 2% em 2026, de 1,5%.
Além disso, dizem, o aumento da incerteza global com as tarifas nos EUA deve ter impacto baixista sobre o preço das commodities. Isso bem como os preços dos alimentos e dos combustíveis avançando menos do que o esperado e a valorização do real no começo de 2025, ante o fim de 2024, o que ajudou a conter a inflação de bens industrializados, fizeram o ASA revisar a projeção de inflação no Brasil em 2025 para 5,3%, de 5,6%.
A XP também elevou suas projeções para o PIB do Brasil em 2025 para 2,3%, de 2%, e para 1,5% em 2026, de 1%, mesmo depois do anúncio do tarifaço americano, refletindo a robustez do mercado de trabalho e medidas de estímulo do governo. Uma possível recessão nos EUA, porém, é um risco, reconhece a corretora. “Caso a visão mais pessimista se concretize, os EUA poderão arrastar outras economias para uma recessão, intensificando a aversão global ao risco”, diz, em relatório, o economista-chefe Caio Megale.
Fonte: Valor Econômico

