Por Daniela Chiaretti — De São Paulo
14/09/2023 05h00 Atualizado há 5 horas
Seis das nove fronteiras planetárias foram rompidas, o que aumenta o risco de mudanças abruptas em larga escala, algumas irreversíveis, como a perda de espécies. Isso não significa que alterações drásticas no funcionamento da Terra irão ocorrer da noite para o dia, mas que o planeta está agora “bem fora do espaço operacional seguro para a humanidade”, segundo estudo de 29 cientistas internacionais publicado ontem.
As nove fronteiras planetárias são um conceito proposto pela primeira vez em 2009, pelo sueco Johan Rockström, um dos maiores climatologistas do mundo. Mudança do clima é uma delas, água doce, outra. A camada de ozônio na estratosfera é uma terceira, ao lado da acidificação dos oceanos e as mudanças nos sistemas terrestres. A integridade da biosfera (o conjunto dos ecossistemas existentes no planeta), é outra.
Um indício de que limites terrestres foram ultrapassados, por exemplo, é o fato de algumas florestas do norte da Europa e regiões da Amazônia (como demonstrado pela cientista Luciana Gatti, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) estarem deixando de ser sumidouros de carbono e se tornando fontes emissoras em função do desmatamento e incêndios.
As fronteiras planetárias são processos interconectados no complexo sistema biofísico terrestre. Dito de outra forma, o foco global apenas na mudança do clima não é suficiente para aumentar a sustentabilidade do planeta. “Não significa que estamos indo para o colapso iminente, mas que o planeta está perdendo estabilidade e resiliência”, explica Rockström, diretor do Potsdam Institute for Climate Impact Research (PIK).
A co-autora Katherine Richardson, pesquisadora da Universidade de Copenhague diz que ultrapassar as fronteiras significa superar um limiar crítico para o aumento de riscos. “Pode-se pensar na Terra como um corpo humano, e nas fronteiras planetárias como a pressão arterial. Ter mais de 120/80 não quer dizer infarto imediato, mas que o risco aumentou e é preciso reduzir a pressão”.
“O planeta está perdendo estabilidade e resiliência” — Johan Rockström
O estudo “Earth beyond six of nine planetary boundaries”, publicado na Science Advances marca a primeira vez que uma equipe de cientistas globais consegue detalhar os nove-processos seguros para a estabilidade do planeta. “Não sabemos por quanto tempo podemos seguir violando estas fronteiras fundamentais antes que as pressões combinadas nos levem a danos irreversíveis”, diz Rockström. “Ninguém sabe quanto o planeta aguenta”, completa.
A fronteira que esteve ameaçada, mas não está mais tão sob pressão é a camada de ozônio. Isso aconteceu depois de fortes ações tomadas pelos países para banir e substituir gases que eram usados em refrigeradores e aparelhos de ar-condicionado, por exemplo, e causavam o fenômeno conhecido por “buraco da camada de ozônio”. Foi resultado do Protocolo de Montreal, o acordo multilateral para enfrentar o problema que provocava mais casos de câncer de pele e dificuldades de visão.
Duas fronteiras planetárias -poluição do ar e acidificação dos oceanos- não foram rompidas, mas estão perto de ser. Um limite ultrapassado é o fluxo de nitrogênio e fósforo no ambiente. Estes nutrientes vitais, quando usados em excesso (em fertilizantes, por exemplo), poluem as águas.
A integridade da biosfera, o segundo pilar da estabilidade do planeta ao lado do clima, está sob risco. “Para resolver o problema do clima estamos pressionando a natureza, trocando o petróleo por biomassa, por exemplo. Mas não vamos resolver a crise do clima se não respeitarmos os limites de quanto pode ser retirado das florestas. Uma coisa está ligada à outra”, diz Katherine.
Fonte: Valor Econômico

