Por Larissa Garcia e Alex Ribeiro — De Brasília e São Paulo
28/06/2023 05h03 Atualizado há 5 horas
Na ata de sua última reunião, divulgada ontem, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central suavizou o discurso conservador e indicou que há chance de começar a cortar a taxa básica de juros (Selic) já em agosto se o cenário continuar melhorando. O documento trouxe uma divergência entre os membros do colegiado sobre a comunicação dos próximos passos e detalhou que a maioria via condições de iniciar um “processo parcimonioso” de flexibilização no seu próximo encontro, mas uma minoria achou que ainda era cedo para qualquer sinalização.
Ao discutir os pontos que podem ajudar os juros a cair, o comitê faz uma referência indireta à decisão sobre a meta de inflação de 2026 a ser definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em reunião amanhã. A ata diz que “decisões que induzam à reancoragem das expectativas e que elevem a confiança nas metas de inflação contribuiriam para um processo desinflacionário mais célere e menos custoso”.
O Copom tem indicado que a incerteza sobre as metas é um dos fatores que contribuíram para a desancoragem das expectativas de inflação de longo prazo. O mercado passou a ter maiores dúvidas sobre a manutenção da meta no percentual atual, de 3% com tolerância de 1,5 ponto percentual, para 2026 e anos anteriores, depois de críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no início deste ano, quando disse que considerava algo próximo de 4,5% mais adequado.
Para o Copom, ‘flexibilizações prematuras podem ensejar reacelerações’ do processo inflacionário
Segundo dados do boletim Focus, as expectativas ficaram estacionadas em 4% para 2025 e 2026 durante um tempo, percentual que era aposta da maioria dos analistas para o novo patamar do objetivo a ser perseguido pelo BC, mas voltaram a cair nas últimas semanas com novas sinalizações da equipe econômica de que a meta seria mantida em 3%.
Embora tenha havido divergência quanto à indicação dos próximos movimentos de política monetária, o documento afirma que os diretores “foram unânimes” em concordar que os passos futuros vão depender da evolução da dinâmica inflacionária e repetiu que olha de perto os componentes de preços mais sensíveis aos juros, que são medidos pelos núcleos, as expectativas de maior prazo, suas próprias projeções, além do hiato do produto (medida de ociosidade da economia) e do balanço de riscos para a inflação.
“O comitê unanimemente avalia que flexibilizações do grau de aperto monetário exigem confiança na trajetória do processo de desinflação, uma vez que flexibilizações prematuras podem ensejar reacelerações do processo inflacionário e, consequentemente, levar a uma reversão do próprio processo de relaxamento monetário. A materialização desse tipo de cenário pode impactar negativamente não apenas a credibilidade da política monetária, mas também as condições financeiras”, diz a ata.
Por outro lado, o BC elevou sua estimativa para a taxa neutra real de juros – aquela que nem acelera nem contrai a economia e mantém a inflação estável- de 4% ao ano para 4,5%. Isso significa que, para desaquecer a economia e reduzir a inflação, seria necessária uma dose maior de juros que a projetada anteriormente.
“Os membros avaliaram os diferentes fatores que justificam uma elevação e convergiram na conclusão de que houve uma elevação da taxa neutra. Dentre os fatores citados que apoiam a elevação da taxa neutra, citou-se uma possível elevação das taxas de juros neutras nas principais economias, a resiliência na atividade brasileira concomitante a um processo desinflacionário lento, assim como a análise de modelos auxiliares que incorporam diferentes metodologias”, justificou o Copom.
A discussão sobre o nível de juro neutro já havia sido levantada em comunicados anteriores, mas só agora a autoridade monetária decidiu elevar o percentual utilizado em seus cenários. Apesar de ter indicado possível queda de juros em agosto, a ata mantém um tom sóbrio, repetindo que o contexto requer “parcimônia e cautela” duas vezes. Também assinala que a conjuntura é “marcada por expectativas desancoradas para prazos mais longos e caracterizada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento”.
Sobre o quadro fiscal, o colegiado afirmou que a apresentação e a tramitação do arcabouço fiscal “reduziram substancialmente a incerteza em torno do risco fiscal”, mas que “permanecem desafios” para o cumprimento das metas estipuladas para o resultado primário.
O documento informa, porém, que nos debates entre os membros do Copom foi “enfatizado o comprometimento e a apresentação de medidas para a consecução de tais resultados”. Ainda sobre a política fiscal, o colegiado voltou a dizer que não há relação mecânica entre a convergência de inflação para as metas e a aprovação do arcabouço fiscal pelo Congresso Nacional.
Fonte: Valor Econômico
