Depois de comparar o aumento da exposição ao Brasil à Odisseia, de Homero, a Kinea Investimentos agora decidiu se apoiar em O Fim da História e o Último Homem, de Francis Fukuyama, para contextualizar suas escolhas de investimento.
Em sua mais recente carta mensal, a gestora argumenta que a ascensão da China reflete o esgotamento de um modelo que antes era imaginado como estável e definitivo. “No atual conflito geopolítico, o erro do Ocidente foi confundir o sucesso do seu modelo com a universalidade da sua visão de mundo”, descreve.
Quando a obra de Fukuyama foi publicada, celebrava-se a queda do Muro de Berlim e havia expectativas de que o capitalismo liberal triunfaria como forma definitiva de organização humana. Na visão da Kinea, no entanto, o “fim” previsto pelo autor era, na verdade, uma “calmaria enganosa” entre novas ondas históricas.
A casa relembra o aumento das tensões entre Estados Unidos e China em outubro. No início do mês, o presidente Donald Trump anunciou novas tarifas sobre produtos chineses, e Pequim respondeu prometendo retaliações. Já no dia 30, o clima se amenizou: Trump se reuniu com Xi Jinping na Coreia do Sul, e os dois países chegaram a um acordo sobre o fornecimento de elementos terras raras, muito usados na indústria de tecnologia.
Para a Kinea, o embate tecnológico está no centro da disputa entre as duas potências. De um lado, Washington tenta conter o avanço chinês ao restringir o acesso a semicondutores. De outro, Pequim mantém o controle sobre as exportações de terras raras, essenciais para a produção de eletrônicos, baterias e sistemas de defesa.
“O resultado tende a ser um impasse tenso e prolongado, mas um impasse no qual os dois lados sabem da impossibilidade de escalarem as tensões sob o risco de destruição econômica mútua”, diz a gestora.
Diante desse cenário, a casa mantém posição comprada em ações globais, com foco no setor de tecnologia dos Estados Unidos. O crescimento dos lucros das empresas do segmento na atual temporada de resultados tem reforçado essa tese.
A Kinea entende que os EUA atravessam um momento favorável para ativos de risco, com S&P 500 em alta e o início de um ciclo de queda de juros. Apesar do apagão de dados causado pela paralisação do governo americano, métricas alternativas indicam que o mercado de trabalho segue enfraquecido e que a inflação ainda não reflete de forma significativa os efeitos das tarifas. Nesse contexto, a gestora projeta que o Federal Reserve (Fed) siga cortando juros até o fim do ano.
Kinea reduz posição em ouro
O ouro acumulou ganhos de 3% em outubro. Em um mundo que acreditava ter superado a necessidade de lastros físicos, o metal ressurgiu como o “ativo do ceticismo”, na visão da Kinea – uma espécie de refúgio para quem já não confia plenamente nas moedas, nos bancos centrais ou na capacidade dos governos de conter seus próprios desequilíbrios.
“O metal que parecia relegado à história volta a protagonizá-la, com crescente demanda de pessoas físicas”, descreve a gestora.
No entanto, após permanecer comprada na commodity desde 2022, a Kinea optou por reduzir seu posicionamento em ouro, justamente pelos influxos de pessoas físicas, que devem aumentar a volatilidade do metal no curto prazo.
E o Brasil?
No Brasil, a Kinea enxerga um cenário que reflete a experiência de um “mundo pós-Fukuyama”, mas sem que o País tenha atingido o ápice previsto pelo autor. “O ‘fim da história’ que prometia a consolidação da democracia liberal com o crescimento racional, guiado pela produtividade e eficiência, nunca foi plenamente atingido aqui”, avalia.
Em relação a 2026, a casa acredita que as variáveis econômicas terão menor peso na avaliação de um presidente. Em entrevista ao E-Investidor, Roberto Elaiuy, gestor de renda fixa da Kinea, já havia destacado que as posições da gestora não estão sendo montadas com base em cenários políticos.
Hoje, em sua carteira, a gestora mantém preferência pela renda fixa local, enquanto projeta um Produto Interno Bruto (PIB) rondando em torno de zero no segundo semestre e observa revisões baixistas nas projeções de inflação mais longas do Boletim Focus.
A casa avalia que, nos próximos meses, a divulgação de indicadores macroeconômicos criará condições suficientes para que o Banco Central inicie, no começo de 2026, um processo de redução de juros para um patamar menos restritivo.
A Kinea também mantém posição comprada em real, favorecida pelo nível elevado da Selic. Já na renda variável, diante da valorização recente dos preços no mercado doméstico, a gestora migrou a maior parte de suas posições compradas para os Estados Unidos.
Fonte: E-Investidor

