Por Sérgio Tauhata — De São Paulo
09/08/2023 05h04 Atualizado há 6 horas
Os bancos centrais globais têm sinalizado para um risco de política monetária que investidores, empresas e até as famílias parecem permanecer alheios: o da possibilidade de os juros subirem mais e permanecerem altos por mais tempo. Segundo o diretor do departamento Monetário e de Mercado de Capitais do Fundo Monetário Internacional (FMI), Tobias Adrian, e o chefe de divisão de Avaliação Financeira e de Política Monetária, Hiroko Oura, “os aumentos contínuos das taxas de juros pelos bancos centrais e a possibilidade de os custos de financiamentos permanecerem mais altos por mais tempo do que o esperado por investidores, negócios e famílias podem aumentar os riscos para a estabilidade financeira, além de impactar negativamente o crescimento econômico”.
Conforme a análise publicada no blog da instituição, um dos reflexos da combinação de elevações contínuas de juros e em ritmo acelerado resultou nos eventos que envolveram os bancos regionais dos EUA em março. “Os aumentos das taxas de juros pelos bancos centrais globais para conter o maior surto de inflação em quatro décadas geraram tensões para os bancos nos Estados Unidos e na Europa este ano.” Na visão dos economistas, “os aumentos das taxas são geralmente positivos para credores, se eles puderem receber mais sobre empréstimos do que pagam aos depositantes, mas dessa vez foi diferente e alguns bancos perderam dinheiro em títulos – até mesmo de papéis do Tesouro dos EUA”.
Adrian e Oura explicaram que, no início do ano, “isso causou temores em clientes [das instituições], que fizeram saques rapidamente, um movimento amplificado pela tecnologia e pelas redes sociais”. Conforme os dirigentes do fundo, “vários bancos faliram” diante dessa corrida de saques, em alusão ao eventos que envolveram instituições financeiras regionais americanas no fim do primeiro trimestre.
O FMI mantém uma ferramenta, o “Programa de Avaliação do Setor Financeiro” (FSAP, na sigla em inglês), como forma de acompanhar os riscos de estabilidade financeira para os países e avaliar o quão resilientes as nações podem ser. Os FSAPs “testam” riscos potenciais para os bancos e, recentemente, aprimoraram a avaliação de intermediários financeiros não bancários, como fundos de pensões, seguradoras e gestores de ativos.
Os especialistas do FMI apontaram que o rápido aperto da política monetária pode tornar voláteis os mercados de derivativos e de taxas de juros. “Até mesmo o valor dos títulos do Tesouro dos EUA [considerados os mais seguros] chegou a cair até 30% quando os juros básicos subiram 4 pontos percentuais, que foi o choque real para os rendimentos dos Treasuries de dez anos desde 2020.”
Adrian e Oura chamaram a atenção ainda para um cenário de os juros permanecerem altos por mais tempo nos EUA e na Europa sobre o setor financeiro fora dos bancos. “Antes de março, já tínhamos enfatizado os riscos dessas mudanças nos mercados de títulos para empresas financeiras não bancárias. Muitas têm grandes investimentos em papéis de dívida e sofrem perdas de avaliação. Os fundos de investimento podem enfrentar resgates rápidos se os clientes decidirem sair rapidamente de portfólios.”
Os economistas do FMI também lembraram que “as empresas que usam derivativos e outras transações complexas para aumentar os retornos podem sofrer chamadas de margem, pois seriam obrigadas a fornecer dinheiro caso esses instrumentos perdessem valor – como ocorreu com fundos de pensão do Reino Unido no ano passado”.
Os dirigentes do fundo enfatizaram que nem mesmo as reformas regulatórias implementadas após a crise financeira global de 2008 e os dispositivos de liquidez disponibilizados pelos BCs impediram a quebra de bancos menores. “No caso do Silicon Valley Bank, as salvaguardas não funcionaram bem. O valor dos títulos despencou em meio ao rápido aperto monetário, atingindo lucros, capital e reservas de caixa. Os depositantes perceberam essas tensões e retiraram recursos. O banco não estava preparado para acessar a liquidez do banco central a tempo e faliu, assim como outros credores americanos”, dizem.
Fonte: Valor Econômico

