O Itaú BBA realizou, nesta terça-feira (25), o Macro em Pauta, com a participação do economista-chefe Mário Mesquita e do vice-presidente sênior de pesquisa econômica Pedro Schneider. Durante o evento, ambos os especialistas deram diagnóstico e projeções do cenário econômico nacional e global — um dos destaques pautados foi o fortalecimento do dólar no curto prazo, interrompendo o movimento de enfraquecimento observado no primeiro semestre.
Segundo Mesquita, o início de 2024 foi marcado pelo “auge do excepcionalismo americano”, num momento em que investidores concentraram posições nos Estados Unidos. De lá para cá, o ambiente mudou conforme aumentaram as dúvidas sobre a política econômica da nova administração do presidente Donald Trump e sobre a sustentabilidade do crescimento. Nos últimos meses, porém, esse quadro se estabilizou. “Os investidores estão menos pessimistas com o dólar”, afirmou o economista-chefe do Itaú BBA.
A leitura da casa é de que o Fed se mantém relativamente conservador, o que reforça a resiliência da moeda americana. Schneider observou que, com a China e a Europa sem sinais claros de aceleração, o mercado “voltou o foco para o dia a dia do Fed”. O banco projeta o primeiro corte de juros nos Estados Unidos em dezembro, seguido de uma pausa em janeiro. A sucessão de Jerome Powell, ainda sem nome anunciado, não altera por enquanto as hipóteses centrais do cenário, embora Mesquita reconheça que “o Trump criou um nível de ruído grande com o Fed”, e que esse ruído pode aumentar.
A inteligência artificial também foi destaque, apontada como um dos principais vetores de crescimento dos EUA no primeiro semestre. Para os economistas, no entanto, esse impulso tem caráter concentrado e potencialmente frágil — embora nenhum deles seja incisivo sobre a ideia de bolha. Schneider destacou o ritmo de adoção da tecnologia por grandes empresas, enquanto Mesquita demonstrou preocupação com a dependência excessiva de um único setor: “A economia americana não teria apresentado crescimento no primeiro semestre se não fosse o boom de inteligência artificial. Tem uma fragilidade aí do ponto de vista de sustentabilidade”, avaliou.
Ao falarem sobre a China, os especialistas revisaram suas projeções para cima e esperam um crescimento de 5% em 2025 e 4,5% em 2026, apoiado em estímulos já anunciados. Eles observam que a demanda doméstica segue enfraquecida, e que as exportações de tecnologia, especialmente ligadas à transição energética, puxam a atividade. Schneider ponderou que a sustentabilidade desse modelo depende de maior proteção social e de um reequilíbrio entre poupança e consumo.
Cenário local
No Brasil, o real perdeu força nas últimas semanas após um período de valorização associado mais ao enfraquecimento global do dólar do que a fatores domésticos. O Itaú avalia que o câmbio tende a sofrer pressão adicional no fim do ano com a antecipação de remessas de lucros e dividendos, diante da perspectiva de tributação a partir de 2026. O banco também estima saídas entre US$ 25 bilhões e US$ 35 bilhões no quarto trimestre. Para 2026, Mesquita e Schneider lembram que, como é de praxe, o prêmio de risco aumenta em anos eleitorais, o que limita um cenário benigno para a moeda.
Os especialistas são firmes no entendimento de que a economia brasileira atravessa, neste momento, o “fundo do poço” no ciclo. Os indicadores do Itaú mostram desaceleração desde abril, embora haja sinais de estabilização em outubro e novembro — mas eles lembram que parte desse movimento pode estar distorcido pela antecipação de promoções atreladas à Black Friday. Também foi observado que, desde a pandemia, o padrão sazonal mudou, com o primeiro semestre passando a mostrar, em geral, resultados mais positivos que o segundo.
O Itaú mantém projeção de 1,7% para o crescimento do PIB em 2025, com viés de alta caso medidas adicionais de estímulo venham a ser adotadas. Para 2026, o impulso fiscal e o avanço do crédito consignado privado devem sustentar a atividade no início do ano, embora a política monetária siga contracionista. O mercado de trabalho, com bons índices, começa a perder força, com queda marginal na ocupação e estabilidade da massa salarial. O banco também observa desempenho relativamente melhor no crédito para veículos, após um período de baixa.
Nos preços, Mesquita e Scheiner destacam que a desinflação de 2024 foi puxada principalmente por alimentos e bens industrializados. O Itaú projeta IPCA de 4,5% em 2025 e 4,2% em 2026, com aceleração dos núcleos nos próximos meses. Os serviços seguem pressionados, e o banco alerta para uma recomposição natural dos preços mais sensíveis ao mercado de trabalho.
Em relação à política monetária, Mesquita foi claro ao dizer que considera improvável um corte da Selic em janeiro. Para que isso ocorresse, o Comitê de Política Monetária (Copom) teria de abandonar a sinalização de que “não hesitará” em subir juros se necessário — algo que, segundo ele, não combina com o início imediato de um ciclo de cortes. O banco acredita que as reduções começam no primeiro trimestre, provavelmente em março, e que a trajetória será mais lenta do que a projetada pelo mercado — a projeção é de Selic em 12,75% em dezembro de 2026, enquanto estimativas do mercado apontam para 12,20%.
A avaliação fiscal foi o ponto mais duro. Schneider chamou atenção para o aumento das exceções tanto na meta quanto na regra de despesa, o que, segundo ele, “é preocupante”. Mesquita reforçou que o país ainda enfrenta um déficit estrutural relevante e que um ajuste de cerca de 4 pontos do PIB será inevitável nos próximos anos. “Não vai haver debate sobre a necessidade de fazer ajuste, isso é consensual. A dúvida é se será gradual ou mais rápido”, afirmou.
Ainda segundo o banco, mesmo com a resiliência recente do mercado de capitais e do crédito não bancário, a combinação entre juro real elevado e crescimento próximo de 2% dificilmente se sustentará sem consolidação fiscal. O quadro para 2026, portanto, vai depender menos da dinâmica monetária e mais da disposição política para conter o avanço das despesas obrigatórias.
Fonte: Capital Aberto

