Por Fernanda Guimarães — De São Paulo
20/09/2023 05h03 Atualizado há 4 horas
Depois de um agosto e setembro mais fracos que o previsto para ofertas subsequentes de ações (“follow-ons”) no mercado brasileiro, fruto do aumento de volatilidade e da saída de recursos de estrangeiros da bolsa, os bancos de investimento que atuam no Brasil têm direcionado o olhar para os Estados Unidos. A atenção está voltada tanto para a trajetória de juros no país quanto para a retomada das ofertas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês) nas bolsas americanas, depois de dois anos de atividade morna por conta do ciclo de alta de juros naquele país.
Na semana passada, em um IPO que ganhou os holofotes globalmente, a Arm, empresa de chips do Softbank, marcou a maior operação do ano, avaliada em US$ 54,5 bilhões. A transação atraiu forte demanda entre os investidores e teve estreia positiva na Nasdaq. A Instacart, de entrega de produtos alimentícios, trouxe mais uma notícia positiva ao precificar sua oferta inicial no teto da faixa indicativa de preço, isso depois de ajustar o preço para cima, provando o retorno do apetite do investidor por renda variável nos Estados Unidos. Os papéis começaram a ser negociados ontem e subiram 12,33%. A Klavyo, plataforma de marketing, também observou alta demanda, o que permitiu que elevasse a faixa de preço almejada.
“Estamos sentindo a temperatura lá fora. Algumas ofertas foram lançadas nos Estados Unidos e estamos vendo um mercado mais construtivo”, afirma o corresponsável pelo banco de investimento do Bank of America no Brasil, Hans Lin.
As operações no maior mercado de capitais do mundo começaram a refletir no Brasil. O responsável pela área de mercado de capitais do Morgan Stanley na América Latina, Marcello Lo Re, afirma que, após as recentes ofertas de ações nos Estados Unidos, companhias no Brasil reengajaram conversas sobre ofertas no mercado local. “Os IPOs que aconteceram e que acontecerão nos Estados Unidos estão sendo emblemáticos. O nível de convicção aumentou.”
O mesmo, segundo o executivo do Morgan Stanley, tem acontecido com fundos de private equity, que compram participação em empresas e têm no mercado de capitais uma importante porta para saída de investimentos. Historicamente, esse gestores estão por trás de muitas empresas que estreiam no bolsa.
A melhora de humor, no entanto, pode não resultar em IPOs no mercado brasileiro neste ano. Segundo Lo Re a chance é maior de as operações se desenrolarem no primeiro bimestre de 2024.
Por aqui, o mercado tenta voltar ao ritmo observado em junho e julho, quando uma série de ofertas foi lançada depois da monotonia do início do ano, com os mercados fechados. O novo movimento ocorre após a volatilidade dos mercados de agosto e setembro ter deixado algumas operações para trás. A incorporadora Plano & Plano, por exemplo, que tinha anunciado sua intenção de acessar mercado em agosto, retirou momentaneamente a oferta da mesa por conta da piora das condições de cenário, que levou à queda das ações. Nos próximos dias, a oferta do banco do BR Partners será precificada. Já a empresa de componentes industriais Priner anunciou intenção de ir para rua com seu “follow-on”.
O responsável pelo banco de investimento do Bradesco BBI, Felipe Thut, afirma que os olhares no momento também estão na decisão do Federal Reserve, o banco central americano, sobre as taxas de juros do país nesta quarta-feira. Esse fator, diz, pode tirar uma pressão que vem sendo exercida sobre os mercados.
Para esta quarta-feira, a expectativa do mercado é que o Fed mantenha os juros na atual taxa, na faixa entre 5,25% e 5,5% ao ano, e que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central brasileiro mantenha o ritmo e reduza a Selic em 0,5 ponto percentual, para 12,75%.
Thut observa, no entanto, que a pauta o Brasil também segue dominada pelo tema fiscal e sobre a habilidade do governo em cumprir a meta proposta.
O responsável global pelo banco de investimento do Itaú BBA, Roderick Greenlees, afirma que o contexto volátil acabou empurrando algumas operações à espera de momento mais ameno, o que deixou tanto agosto quanto setembro aquém do imaginado. Um dos pontos-chave nessa equação, segundo o executivo, é exatamente a taxa de juros referencial americana, já que isso ditará a dinâmica do fluxo do capital estrangeiro, bolso relevante para as ofertas de ações. “A retomada dos mercados lá fora, de certa forma, é um indicador do que pode acontecer aqui.”
Segundo Greenlees, no entanto, as estreias devem ficar para 2024. “A expectativa segue construtiva”, diz. O executivo afirma que o segundo semestre será positivo, chegando a um total de 25 a 30 operações neste ano, mas com um volume de R$ 50 bilhões. “O volume vai ficar mais baixo porque se tem ofertas menores [subsequentes] no ‘pipeline’ [em preparação].”
No ano passado, o volume de ofertas de ações chegou em cerca de R$ 57 bilhões, incluindo nessa conta a megaoferta que culminou na privatização da Eletrobras, que girou R$ 33 bilhões. Já no ano até aqui o volume chega a cerca de R$ 30 bilhões. Assim como em 2022, neste ano a bolsa brasileira segue zerada para estreias.
Para Marcelo Millen, chefe de renda variável do Citi, é preciso de fluxo de recursos seja direcionada aos fundos de ações para se criar um “momentum” para renda variável. “O mercado para follow-ons segue bastante funcional, enquanto IPOs devem voltar a partir do próximo ano, com maior queda de juros e migração de renda fixa para renda variável. Os fundos precisam de retomada de fluxo positivo para decidirem voltar a acompanhar novas empresas”, explica.
A opinião de Lin, do Bofa, no entanto, é mais otimista. Ele acredita que se abriu espaço para a retomada dos IPOs acontecer ainda neste ano. Sua leitura está, segundo o executivo, ancorada, nos retornos de conversas entre as empresas e investidores.
Fonte: Valor Econômico

