Por Lucianne Carneiro e Marta Watanabe — Do Rio e de São Paulo
28/02/2024 05h02 Atualizado há 5 horas
O Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), prévia da inflação oficial do mês, mostrou alta de 0,78% nos preços em fevereiro. Apesar da aceleração ante janeiro, quando o indicador aumentou 0,31%, a variação em fevereiro surpreendeu positivamente parte dos economistas e foi puxada por educação, fator sazonal ligado ao início do ano letivo.
O indicador mostrou desaceleração em grupos importantes, como alimentação e bebidas, mas permanece a preocupação com a inflação de serviços e de seu eventual impacto no ciclo de redução de juros, apontam economistas.
O resultado de fevereiro ficou abaixo da mediana das 29 projeções de analistas de consultorias e instituições financeiras consultados pelo Valor Data, que estimavam alta de 0,81% em fevereiro. O intervalo das estimativas era de alta de 0,56% a 0,90%.
Divulgado ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o IPCA-15 acumulou alta de 4,49% em 12 meses até fevereiro, ante 4,47% até janeiro, também em 12 meses. O resultado também veio abaixo da mediana das estimativas do Valor Data, de 4,52%., com intervalo entre 4,26% a 4,61%. A meta de inflação perseguida pelo BC para 2024 é de 3%, com tolerância de 1,5 ponto percentual para baixo ou para cima.
Das nove classes que integram o índice, cinco tiveram aceleração na passagem entre janeiro e fevereiro. A principal alta ocorreu no grupo educação, que acelerou de 0,39% em janeiro para 5,07% em fevereiro, mês de início do ano letivo, reflexo de reajustes de mensalidades escolares. Alta na educação é sazonal e esperada, podendo se repetir em março e depois se dissipar, diz Helena Veronese, economista-chefe da B. Side Investimentos.
Laiz Carvalho, economista para Brasil do BNP Paribas, destaca que, apesar do aumento em educação, a taxa não veio tão alta quanto estimado. E, entre os preços que contribuíram para reduzir a inflação em fevereiro, destaca as passagens aéreas que, segundo o IBGE caíram 10,65% em fevereiro, após retração de 15,24% em janeiro. Ela também destaca a alimentação, que veio com desaceleração maior que a esperada. “A expectativa é que essa desaceleração continue nas próximas observações.” O banco estima IPCA de 3,5% para 2024.
“Expectativa é que desaceleração [de alimentos] continue nas próximas observações” — Laiz Carvalho
Após subirem 1,53% em janeiro, os preços de alimentação e bebidas voltaram a desacelerar, com alta de 0,97% em fevereiro. O grupo respondeu por 0,2 ponto percentual da alta do IPCA-15 no mês. Dentro do grupo, o maior impulso para desaceleração veio dos alimentos consumidos no domicílio.
Foram observadas taxas maiores de inflação, na passagem entre janeiro e fevereiro, também em artigos de residência, transportes, saúde e cuidados pessoais e comunicação. Nesse último grupo, a surpresa veio do preço de TV por assinatura, que subiu 4,02% em fevereiro, ante estabilidade em janeiro e alta de 2,5% em fevereiro de 2023. O combo de telefone, internet e TV por assinatura, subiu 3,29% em fevereiro, ante estabilidade em janeiro e aumento de 1,35% em fevereiro de 2023. Esses serviços costumam ter variação de preços nos meses em que há reajuste por parte das empresas que trabalham no setor.
Com esse movimento, os preços do grupo comunicação, que tinham recuado 0,03% em janeiro, subiram 1,67% em fevereiro. A influência foi de 0,08 ponto percentual no IPCA-15 de fevereiro. “O comportamento de preços de TV por assinatura e do combo de telefone, internet e TV foi uma surpresa e se juntarmos com alta de IPVA [Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores], da gasolina e de mensalidades escolares, o início do ano veio bem salgado”, diz Luis Otavio Leal, economista-chefe da G5 Partners.
Após quatro quedas seguidas, o preço da gasolina subiu 0,84% em fevereiro. A alta, afirma Leal, reflete a recomposição em parte, pelos Estados, do ICMS cobrado sobre o combustível.
Dentre os elementos que merecem atenção no IPCA-15 de fevereiro, Veronese destaca a média dos núcleos da inflação, que expurgam da conta os componentes mais sensíveis e voláteis. Essa média acelerou a 0,57% em fevereiro, vindo de 0,33% em janeiro, indica. Além disso, destaca, os preços de serviços subiram 1,13%, vindo de -0,11% em janeiro.
Parte do aumento nos serviços se explica pelas mensalidades escolares, diz Leal, da G5 Partners. “Mas as mensalidades escolares não são desculpa para os dados de serviços subjacentes, que saíram de 0,68% em janeiro para 0,65% em janeiro. Mesmo com desaceleração, 0,65% é um número muito alto e que corrobora a preocupação já demonstrada por Roberto Campos Neto [presidente do Banco Central] na semana passada sobre os serviços. Sobre isso, o IPCA-15 não tranquilizou nem um pouquinho.”
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Os serviços subjacentes mostram que os preços que são persistentes ainda estão altos, mesmo com a desaceleração de janeiro para fevereiro, explica Luca Mercadante, economista da Rio Bravo Investimentos. A medida de serviços subjacentes considera apenas a parte mais estrutural dos serviços e exclui itens como cursos, comunicação e turismo. “Os pontos de atenção se mantêm, apesar da surpresa positiva em relação ao indicador na margem”, diz ele.
Para Leal, o comportamento dos serviços pode repercutir no ciclo de corte de juros, principalmente a partir de junho. Para o economista, isso pode começar a levar a cortes de juros de 0,25 ponto percentual (pp) a partir desse período, e não mais de 0,5 pp. Leal projeta Selic a 9% ao fim do ano.
Mais otimista em relação à política monetária, André Cordeiro, economista do Banco Inter, diz que, apesar de a aceleração da média dos núcleos do IPCA-15 terem acelerado para 0,57%, a métrica ficou dentro do esperado para um mês de fevereiro. Ele concorda que o principal ponto de cautela continua sendo a dinâmica da inflação de serviços subjacentes.
“Mas devido à sazonalidade do início de ano, é precoce concluir alguma mudança de dinâmica. O cenário não deve alterar o plano de voo do Copom [Comitê de Política Monetária], que deve manter os cortes de 0,5 ponto percentual na taxa Selic nas próximas reuniões e a incerteza maior deve permanecer sobre a taxa terminal, uma discussão que deve se intensificar somente no segundo semestre”, diz Cordeiro. O Inter mantém projeção de Selic em 8,5% ao fim do ano.
Carvalho, do BNP Paribas, avalia que os serviços subjacentes devem se manter próximos do patamar atual até o IPCA-15 de abril, mas, para ela, há espaço para se chegar à Selic de 8,5% ao fim do ano.
Fonte: Valor Econômico

