Os investimentos em data centers estão paralisados enquanto as empresas esperam pela votação da medida provisória do Redata, regime tributário especial para o setor, segundo a ABDC (Associação Brasileira de Data Center).
De acordo com empresários do setor e representantes das big techs, as incertezas jurídicas causadas pela resolução da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), que começou a exigir a certificação desses equipamentos, acrescidas da demora em aprovar o Redata estão emperrando investimentos. O programa reduz a zero a alíquota dos impostos federais dos produtos comprados pelas empresas que estiverem construindo esses complexos no país.
“Desde que o ministro [da Fazenda] Fernando Haddad anunciou o Redata, em maio, os grandes investimentos estão congelados, esperando os benefícios tributários. Enquanto isso, vários outros países já implementaram incentivos e estão atraindo grandes investimentos”, diz Luís Tossi, vice-presidente da ABDC.
Ele cita a Argentina, que tem o programa RIGI (Regime de Incentivos para Grandes Investimentos), com benefícios fiscais para investimentos em tecnologia e energia. A OpenAI e a Sur Energy assinaram carta de intenções para um investimento de US$ 25 bilhões (R$ 136 bilhões) em um data center de 500 megawatts na Patagônia.
O TikTok anunciou neste ano que está investindo em um data center de 300 megawatts no Ceará, no Complexo do Pecém, com aporte de R$ 200 bilhões na primeira fase, vindo de vários sócios. O projeto terá benefícios tributários das ZPEs (Zonas de Processamento de Exportações).
Mas, segundo Tossi, fora esse, houve apenas anúncios esparsos de data centers de pequena capacidade este ano, por causa da incerteza tributária.
Segundo a ABDC, o Brasil tem 163 data centers, a maioria de pequeno porte. Os EUA têm 5.381, a Alemanha tem 521, o Reino Unido, 514 e a China, 449.
A estimativa de analistas é que o Brasil poderia receber cerca de R$ 60 bilhões em investimentos nesses equipamentos nos próximos quatro anos.
O governo havia costurado acordo para incluir no PL 2338 (PL de IA), o Redata, que prevê isenção de tributos na aquisição de componentes eletrônicos e de outros produtos de tecnologias da informação e comunicação. Seria uma maneira de angariar apoio para o marco regulatório de inteligência artificial, uma vez que há forte interesse do setor de energia e de tecnologia na medida.
O PL 2338 foi aprovado no Senado em dezembro de 2024 e agora tramita na Câmara. A expectativa era que o relator do projeto na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), divulgasse o relatório no fim de novembro, mas as tensões entre o governo e a Câmara atrapalharam.
Segundo apurou a Folha, o governo mantinha esperanças de que o relatório fosse apresentado nesta semana e seguisse para votação. Mas, segundo o portal Jota, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou a interlocutores que não será possível votar o texto antes do recesso parlamentar.
Com isso, volta a pressão para que o Congresso analise a MP 1318/2025, do Redata, que foi apresentada em 18 de setembro e pode caducar se não for apreciada nas próximas semanas. O deputado Aguinaldo Ribeiro deve ser o relator da medida.
O PL de IA é uma pauta cara ao governo e a ministros do Supremo Tribunal Federal como Gilmar Mendes. Mas, segundo representantes das big techs e pessoas envolvidas na negociação do texto, ainda há pontos sem consenso, que podem acabar ficando de fora, como a cobrança de direitos autorais sobre dados usados em treinamento de modelos de IA. Esse ponto enfrenta forte oposição das plataformas de internet.
Outro item sem consenso é a natureza das listas de IA consideradas de alto risco e sujeitas a maior supervisão. A proposta era que fossem exemplificativas, e pudessem ser ampliadas pela autoridade regulatória para acomodar inovações tecnológicas. As big techs acham que isso gera insegurança jurídica e insistem em listas taxativas.
“O próprio relator do PL 2338, que deverá também relatar a MP 1318, nos comunicou que há um acordo no Congresso para assegurar a votação do Redata caso haja qualquer dificuldade no avanço do marco legal da inteligência artificial. A ABDC acompanha de perto essa tramitação”, diz Tossi.
O Redata é criticado por ambientalistas e parte da esquerda pelo impacto ambiental dos data centers, que consomem muita água e energia. Mas os incentivos tributários previstos na medida têm pré-condições, como o uso de energia renovável; a disponibilização, para o mercado interno, de no mínimo 10% da capacidade de processamento, armazenagem e tratamento de dados; e o cumprimento de parâmetros de eficiência hídrica.
Enquanto isso, a resolução 780 da Anatel, que institui certificação e homologação obrigatória dos data centers, começa a ser implementada. A ABDC e entidades que representam empresas de tecnologia como a Câmara-e.net, Conselho Digital, AlAI e Brasscom (Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação) divulgaram carta pública na semana passada se posicionando contra a medida.
As entidades afirmam que nada semelhante é feito em outros países, que os data centers já são sujeitos a diversos licenciamentos, que a regra vai aumentar custos e inibir investimentos.
Segundo a resolução 780, os data centers que integram as redes de telecomunicações terão de ser homologados pela Anatel, que vai avaliar a eficiência energética e práticas ambientais deles.
Fonte: Folha de S.Paulo