A tensão comercial e o aumento na percepção de risco gerados pelo “tarifaço” do presidente americano, Donald Trump, levaram a um “colapso momentâneo” do segmento de venture capital (investimentos em startups) no Brasil, na avaliação de Carolina de Oliveira, sócia e responsável pela área na KPMG no Brasil e na América do Sul. Estudo da consultoria mostra que, no segundo trimestre, o volume de negócios fechados no país caiu 65%, para US$ 322,6 milhões, o menor desde 2023 e cerca de um terço do total do primeiro trimestre (US$ 927 milhões).
Segundo Oliveira, foi um “encolhimento agudo”. Ela conta que no Brasil houve claramente uma corrida para fechar algumas operações do primeiro trimestre até o início de abril, antes que novas medidas tarifárias se consolidassem, seguida de uma queda brusca. Além do recuo do volume total, uma análise das transações no período revela ainda outra fragilidade do país: 25% da soma de negócios entre abril e junho foram concentrados em apenas uma operação, a captação de US$ 80 milhões da fintech Clara, de gestão de gastos corporativos, finalizada em abril.
Para a executiva da KPMG, o mercado doméstico carece de transações de médio e grande porte que sustentem cifras robustas em trimestres isolados, o que o torna dependente destas operações fora da curva. “Quando esses ‘deals’ não se materializam, o volume despenca.”
Oliveira destaca ainda que, diante das incertezas do cenário externo e dos juros altos no Brasil, os investidores mantiveram o foco em “empresas com plano de negócios claro, marca consolidada e crescimento esperado”.
No entanto, ela ainda está otimista e avalia que, à medida que o ambiente se estabilize, a pauta de investimentos pode ser retomada, mas só vê chance de isso acontecer a partir de 2026, com foco em setores estratégicos como fintechs, healthtechs, energytechs e inteligência artificial. As janelas de liquidez global, inclusive, poderão abrir espaço para startups maduras buscarem abertura de capital na bolsa ou acordos de fusão e aquisição, em sua opinião.
Neste ano, acrescenta, o ambiente deve seguir cauteloso, e fintechs, healthtechs, logística tech e startups de soluções específicas dentro de inteligência artificial, com métricas de receita claras, devem continuar atraindo investimentos. Sem a estabilização do cenário internacional, alerta, o capital externo pode continuar distante. “Neste caso, investidores locais com perfil de private equity ou crédito estruturado podem preencher parcialmente o ‘gap’.”
De acordo com o relatório “Venture Pulse” da KPMG, referente ao segundo trimestre do ano, o investimento global em capital de risco caiu de US$ 128,4 bilhões no primeiro trimestre para US$ 101,05 bilhões no segundo trimestre de 2025. O estudo faz a ressalva de que a captação atípica de US$ 40 bilhões pela OpenAI elevou significativamente o total entre janeiro e março, mas, ao mesmo tempo, “demonstra a força e a resiliência do mercado diante da evolução das políticas tarifárias e comerciais dos EUA e das tensões e conflitos geopolíticos em curso”.
Conforme os dados da pesquisa, os Estados Unidos atraíram quase 70% do investimento global em venture capital, incluindo todas as seis rodadas de financiamento de mais de US$ 1 bilhão. Para o terceiro trimestre, diz o texto, a inteligência artificial provavelmente continuará sendo o setor mais aquecido, além de tecnologia de defesa e tecnologia espacial, fintech e tecnologia de saúde.
Fonte: Valor Econômico
