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O desempenho dos ativos locais na semana passada e, mais especificamente, na sexta-feira, denota que os riscos políticos voltaram de vez às mesas de operação. A baixa visibilidade sobre o cenário eleitoral do ano que vem, os receios de um novo tensionamento entre o Executivo e o Congresso e o temor de que as relações entre Brasil e Estados Unidos se deteriorem ainda mais, provocando novas retaliações americanas, ampliaram a cautela dos participantes do mercado, que relatam ao Valor terem reduzido sua exposição à bolsa, ao real e aos juros futuros nos últimos dias.
O movimento contrasta com o bom humor observado na virada de junho para julho. No fim do segundo semestre, diversas gestoras de recursos locais mostraram um viés mais otimista com os ativos domésticos, ao vislumbrarem a possibilidade de uma mudança na condução da política econômica a partir de 2027 e a manutenção de um ambiente externo benigno, que continuasse a favorecer o câmbio doméstico e, consequentemente, apostas em juros mais baixos à frente.
Participantes do mercado monitoram a piora na relação entre Brasil e EUA nos últimos dias, que culminou com a imposição pelos americanos de tarifas de 50% a produtos brasileiros. Como a justificativa dada pelo presidente Donald Trump para a taxação foi o processo contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, há temores no mercado de que a operação da Polícia Federal da sexta-feira acirre ainda mais os ânimos entre os países nos próximos dias.
Assim, sobretudo no mercado de câmbio, há a percepção de que uma nova investida dos EUA contra o Brasil poderia ampliar a pressão sobre o real. A postura mais cautelosa dos agentes acabou ficando clara com a alta firme do dólar na sexta-feira, que fechou o dia em alta de 0,73%, aos R$ 5,5874. Segundo relatos de operadores, houve baixa disposição do mercado de ir para o fim de semana “posicionado” na moeda, o que motivou as vendas durante a etapa vespertina do pregão.
É possível notar, ainda, algum descolamento do real em relação ao peso mexicano, não somente na cotação das moedas, mas também na volatilidade esperada à frente. Após Trump anunciar a imposição de tarifas de 50% contra produtos brasileiros a partir de agosto, a volatilidade implícita de um mês do real saltou a 14,3%, maior nível desde o fim de abril, enquanto a do México não mostrou variação relevante, mesmo com a indicação de que os produtos do país também sofrerão taxas mais altas ao entrarem nos EUA.
No Brasil, o “tarifaço” tem sido monitorado pelos mercados do ponto de vista eleitoral. Em diversas conversas com agentes financeiros em caráter reservado, há uma ampla preferência pela construção de uma chapa de centro-direito para a eleição presidencial do próximo ano, na crença de que pode haver uma mudança na condução da política econômica. Com Bolsonaro acuado e o governo sendo bem sucedido em capitalizar o episódio das tarifas, pelo que indicaram pesquisas de opinião recentes, posições otimistas em ativos brasileiros, que vinham sendo montadas nos últimos meses, acabaram sendo reavaliadas.
A tesouraria de uma grande instituição financeira local vê o saldo do episódio como negativo para os ativos domésticos. “A abertura [alta] dos juros prefixados nos últimos dias guarda relação com o ambiente político e com a PEC dos Precatórios, que acrescenta ainda mais dúvidas sobre o ambiente fiscal”, aponta um profissional do banco.
Ele também nota que, no acompanhamento diário feito por institutos de pesquisa, vem crescendo a avaliação positiva do governo Lula. “Isso indica que deve haver pouco interesse do governo em resolver essa questão das tarifas logo, já que os reflexos para Lula têm sido bastante positivos”, avalia.
Seis grandes gestoras locais relatam que reduziram suas posições em Brasil na semana passada, diante do crescimento dos riscos institucionais e de receios de uma escalada nas retaliações dos EUA. De acordo com o profissional de uma delas, a redução na exposição ao Brasil foi mais tática, diante da tensão elevada na relação com EUA. “É melhor esperar a poeira baixar”, diz o executivo. Ele revela, ainda, que o cenário base da casa continua a ser o de mudança de regime político em 2026. “Isso permanece intacto.”
No caso do Citi, o estrategista Ivan Riveros revelou ter encerrado, na semana passada, a posição comprada em papéis prefixados, além de ter alterado a recomendação para os títulos brasileiros de “overweight” (acima da média do mercado) para neutro no portfólio de renda fixa de mercados emergentes. “Embora sigamos estruturalmente otimistas com a curva de juros brasileira, já que continuamos a ver sinais de moderação na inflação e na atividade econômica, reduzimos a exposição ao risco no país diante da expectativa de semanas voláteis à frente para os mercados locais.”
“Apesar de a exposição comercial do Brasil aos EUA – cerca de 12% das exportações totais – ser bem menor do que a dependência do México em relação à economia americana, o fato de as tarifas terem sido politizadas no Brasil torna muito mais incerta a possibilidade de uma resolução positiva nas negociações com os EUA, especialmente com a proximidade do prazo de 1º de agosto”, diz Riveros.
Para ele, embora o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha reiterado que continua a negociar ativamente a reversão das tarifas anunciadas por Trump, a avaliação é que “a relação bilateral já se afastou demais do foco comercial e se tornou extremamente politizada, o que adiciona incerteza à possibilidade de uma resolução positiva nas negociações”.
Para um gestor local, era esperado que o mercado de câmbio exibisse uma reação negativa ao episódio, o que, de fato, aconteceu, com o real entre as moedas de pior desempenho na semana passada. Além disso, as ações brasileiras também foram um destaque negativo. Em Nova York, o EWZ, principal fundo de índice (ETF) de ações brasileiras, recua 6,47% desde que Trump anunciou as tarifas contra o Brasil. Para efeito comparativo, o EEM, que é o ETF que engloba as ações de mercados emergentes, exibiu valorização de 1,47% no mesmo período.
“Existe um receio de uma retaliação do Trump”, diz o profissional. Mas, passado o episódio das tarifas, a aposta é a de que o mercado já deve embarcar na discussão eleitoral, que tende a ser antecipada, na medida em que os candidatos da ala da centro-direita forem surgindo de forma definitiva. “Tendo a ver como um evento benigno para o mercado depois que esse medo do primeiro momento se dissipar.”
Fonte: Valor Econômico

