Por Marsílea Gombata e Lucianne Carneiro — De São Paulo e do Rio
11/11/2022 05h01 Atualizado
A inflação ao consumidor voltou a acelerar em outubro, subindo mais do que o esperado, com a alta sendo puxada pelos alimentos. Na abertura do indicador, a inflação subjacente aponta para preços altos nos próximos meses e sentenciam o fim do período de deflação. A alta maior do que o esperado levou à revisão de projeções por algumas consultorias.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) subiu 0,59% em outubro, conforme divulgou ontem o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com a alta, o IPCA interrompe uma sequência de três meses seguidos de deflação – em setembro, houve queda de 0,29%.
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No resultado acumulado em 12 meses, o IPCA atingiu a marca de 6,47%, ante 7,17% no dado até setembro. No acumulado do ano até outubro, a alta foi de 4,70%.
A leitura de outubro ficou acima da mediana das projeções de 43 instituições financeiras e consultorias, ouvidas pelo Valor Data, de alta de 0,49%. O resultado também ficou fora do intervalo das projeções, que ia de 0,30% a 0,54%.
O resultado de 6,47% no acumulado em 12 meses até outubro ficou acima do centro da meta inflacionária estabelecida pelo Banco Central de 3,5% para 2022 – sendo que a meta tem margem de tolerância de 1,5 ponto percentual, para mais ou para menos.
Três dos nove grupos de despesas usadas para cálculo do IPCA responderam por 73% do dado de outubro. Juntos, representaram 0,43 ponto percentual da taxa. Dentre eles, o maior impacto veio de alimentação e bebidas, com alta de 0,72% e 0,16 ponto percentual no IPCA geral.
Carlos Pedroso, economista do banco MUFG Brasil, diz que o fim dos três meses de deflação já era esperado, mas que o dado veio acima da projeção que tinham.
“Esperávamos 0,45% para outubro. Mas o movimento sazonal do aumento de preços de alimentos in natura, com agravante de chuvas fora de época, acabaram impactando a oferta de alimentos”, diz. “Também explica essa taxa o fim do impacto da queda de preços de combustíveis e de energia elétrica por alterações do ICMS.”
Já o grupo saúde e cuidados pessoais teve alta de preços de 1,16% em outubro (ante 0,57% em setembro), um impacto de 0,15 ponto percentual.
A terceira maior contribuição veio de transportes, que após deflação de 1,98% subiram 0,58% em outubro. Com um impacto de 0,12 ponto percentual.
A alta dos preços de alimentos no resultado acumulado em 12 meses se mantém bem acima da inflação geral no país, embora esteja em desaceleração nos últimos meses. Segundo o IBGE, os preços de alimentação e bebidas subiram 11,21% nos 12 meses até outubro, ante variação de 6,47% do IPCA.
A expansão de preços de alimentos em um período de 12 meses está em dois dígitos desde março de 2022 e chegou a um pico em 2022 de 14,72% em julho. Desde então, vem desacelerando.
Segundo o gerente do índice, Pedro Kislanov, os meses de março e abril foram marcados por alta expressiva dos alimentos por dois fatores. De um lado, questões climáticas internas (excesso de chuvas, por exemplo), pressionaram o preço de itens como cenoura. Do outro, a guerra da Ucrânia afetou o trigo e alimentos como um todo por causa da alta de preços de insumos como fertilizantes.
Também pressionada, a inflação de serviços acelerou de 0,40% em setembro para 0,67% em outubro.
“A gente tem observado uma retomada da demanda de forma mais pronunciada nos serviços em 2022. Os serviços vêm pressionando essa parte do IPCA. Passagens aéreas, por exemplo, têm um componente de demanda. Há um fator custo, mas nessa parte de serviços a gente vê o efeito da demanda”, disse, ao citar também hospedagem, pacote turístico, serviços de costureira e manicure.
Os preços de combustíveis caíram 1,27% em outubro, ante recuo de 8,50% em setembro. Com isso, chegaram ao sexto mês seguido de queda. No acumulado em 12 meses, a retração chega a 20,62%.
Item de maior peso no cálculo do IPCA, a gasolina teve recuo de 1,56% no preço em outubro, ante deflação de 8,33% em setembro.
Em relatório a clientes, o Alberto Ramos, do banco Goldman Sanchs, lembrou que o IPCA de outubro foi beneficiado pela queda nos preços dos combustíveis e comunicações (0,48%). Mas lembrou que as tarifas de telefonia fixa subiram 6,74%, assim como alimentos consumidos em casa (0,80% ante -0,86% em setembro), bens de consumo (móveis em 1,41% e eletrodomésticos em 0,84%), vestuário e cuidados pessoais (2,28% versus 0,30% em setembro).
Ramos afirma ainda que a inflação de bens industriais foi muito maior do que o esperado: 0,75%, sendo 10,79% na comparação com outubro de 2021. A de bens duráveis foi de 0,06%, levando a medida anual para 9,64%.
A trajetória descendente dos combustíveis, contudo, é incerta, e a perspectiva é de alta nos próximos meses. A alta prevista e a inflação subjacente de bens industriais e serviços alertam para riscos de preços altos no primeiro semestre de 2023, segundo Luiza Benamor, da Tendências Consultoria.
“Temos visto sinais de atividade acelerada, o mercado de trabalho aquecido, que acaba incentivando o consumo. O núcleo IPCAEX-3, que acompanha a inflação subjacente de bens industriais e serviços e representa 38% da cesta do IPCA, acelerou 0,71% em outubro”, diz. “O movimento desses núcleos indica inflação subjacente, mais persistente, difícil de se dissipar, e diz muito sobre a trajetória da politica monetária. Essa inflação subjacente continua elevada, o que indica risco altista para o ano que vem.”
Com a alta de outubro, a Tendências revisou a projeção de inflação para 2022 de 5,6% para 5,8%. Para 2023, esperam de 5%.
A aceleração de outubro também levou a LCA Consultores a revisar projeções. O economista Fabio Romão revisou para cima a taxa anual do IPCA para 2022 de 5,6% para 5,8%. A projeção para taxa de novembro foi elevada de 0,30% para 0,35%, e a de dezembro, de 0,68% para 0,70%.
“Entramos em uma rota de variações mais próximas da sazonalidade. Sai de cena a deflação que vínhamos tendo”, afirma Romão.
Ele prevê alta de 0,35% do IPCA em novembro, com desaceleração de artigos de residência da linha branca e marrom, assim como saúde e vestuário devido à Black Friday. “Mas existem alguns riscos como combustíveis, em que há defasagem. A Petrobras pode reajustar preços em novembro ou dezembro”, diz. “E os bloqueios de estradas diminuíram, mas podem influenciar os preços.”
Para 2023, Romão espera focos de descompressão e de pressão. “É provável que alimentação suba um pouco, mas deve parar de piorar. Outro foco são bens industriais, que tiveram alta de 11,90% em 2021, por pressões exercidas por commodities metálicas e energéticas”, diz.
Por outro lado, não haverá fatores como decisões envolvendo preços de energia, telecomunicações e combustíveis, afirma.
Pedroso, do MUFG Brasil prevê que a inflação seguirá pressionada no curto prazo e deve acelerar mais no início de 2023, a depender da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o ICMS.
Ele espera IPCA de 0,40% em novembro e de 0,52% em dezembro. Para 2022, a projeção é de 5,70%. Para 2023, de 4,70%. A grande dúvida, diz, é como ficará o ICMS no ano que vem. “Se derrubarem o teto do ICMS, a expectativa é que a gente tenha aumento do preço de serviços. Então devemos ter impacto de até 0,5 ponto percentual na inflação de 2023”, diz.
Fonte: Valor Econômico
