Assessores técnicos também tentam chamar a atenção dos governo para efeitos das mudanças climáticas na saúde
Um grupo de trabalho específico para temas de saúde finalizou na semana passada uma reunião em Salvador, na Bahia, para alinhar as principais propostas que serão debatidas no encontro ministerial do G20 em 31 de outubro, no Rio de Janeiro – evento que vai anteceder a cúpula de líderes de governo programada para 18 e 19 de novembro.
Uma das principais propostas, que está sendo desenvolvida pelos técnicos do grupo das 19 maiores economias do mundo, mais a União Europeia e a União Africana, é a criação de uma aliança para que a América Latina, a África e também os países do Sudeste Asiático passem a produzir localmente mais remédios, vacinas e materiais de diagnósticos em saúde.
As propostas estão sendo elaboradas para reduzir a dependência dos países em desenvolvimento em termos de insumos e materiais na cadeia de saúde. A vulnerabilidade ficou exposta durante a pandemia de covid-19, quando boa parte do mundo notou que dependia principalmente da China e da Índia para receber desde material básico e insumos para as vacinas até mesmo os próprios imunizantes e equipamentos para os hospitais.
“Estamos propondo a criação de uma aliança para efetivar a produção local de remédios, vacinas e materiais de diagnóstico. Já estamos discutindo isso desde o ano passado com todos os membros do G20. E temos conseguido um grau de atenção elevada”, disse ao Valor o chefe da assessoria especial de assuntos internacionais do Ministério da Saúde brasileiro, Alexandre Ghisleni.
Segundo Ghisleni, que é diplomata de carreira desde 1994, o objetivo é chegar em novembro com consensos bem definidos para que as propostas ligadas ao setor da saúde conquistem a atenção dos líderes de governo na cúpula com presidentes e primeiros-ministros, algo que não é fácil.
“Mesmo com a evolução positiva da discussão, não há certezas. A regra do G20 é o consenso e não sabemos se vamos conseguir a aprovação final”, diz. “O grupo de trabalho de saúde é só um dos vários e conseguir a atenção da cúpula de líderes não é necessariamente uma coisa muito óbvia”, completa.
Ghisleni, contudo, acredita que o momento é favorável para que os líderes de governo dediquem atenção ao tema de saúde na cúpula final, em novembro.
Temos conseguido um grau de atenção elevada [dentro do G20]”
— Alexandre Ghisleni
Além da necessidade de aumentar a capacidade dos países em desenvolvimento de produzir vacinas e medicamentos sensíveis a suas populações, outro assunto tratado com prioridade dentro do grupo é o efeito das mudanças climáticas sobre o sistema de saúde de todo o mundo.
Nesse ponto, a tragédia recente no Rio Grande do Sul e o fato de a cúpula do G20 ser no Brasil neste ano geram a expectativa de que o tema possa ser protagonista entre os chefes de governo.
“Tivemos um debate sobre o Rio Grande do Sul nesta semana [no grupo de trabalho de saúde]. O Estado foi explicitamente mencionado várias vezes e o que aconteceu lá está muito dentro do contexto da discussão para a maior parte dos países. Precisa usar o caso do Rio Grande do Sul como um exemplo para adotar medidas que garantam o funcionamento do sistema de saúde na eventualidade de acontecer desastres como esse”, comenta o diplomata.
Em meio à inundação da maioria das cidades no Rio Grande do Sul, hospitais foram alagados e houve receio de que todo o sistema de saúde do Estado entrasse em colapso. A ministra da Saúde, Nísia Trindade, chegou a ir a público negar que o sistema havia colapsado, mas a capacidade de resiliência da estrutura do setor em desastres naturais está em debate em todo o mundo.
Embora a produção local de vacinas e remédios e a resiliência da saúde contra mudanças climáticas sejam os principais temas do grupo de trabalho no G20, segundo Ghisleni, outros temas como saúde digital, telemedicina e o uso da inteligência artificial no setor também estão na pauta do grupo de trabalho e entrarão nas propostas que serão apresentadas aos chefes de governo.
“Vamos ter valores envolvidos quando passarmos para a próxima fase. Quando escolherem as doenças prioritárias que precisam ser combatidas e ver quais são os elementos que estão faltando, por exemplo. Ou quando terminarmos de identificar quais remédios estão faltando ou se precisamos incentivar pesquisa. Quando chegarmos nessa fase, veremos valores mais concretos. Por enquanto, ainda não chegamos lá”, declara Ghisleni, reforçando que o material estará mais refinado na reunião ministerial do G20 no fim de outubro.
Fonte: Valor Econômico