Com cerca de R$ 2 trilhões em títulos e instrumentos isentos de Imposto de Renda para a pessoa física, o governo federal deixa de arrecadar cerca de R$ 40 bilhões, comentou Marcos Pinto, secretário de reformas econômicas do Ministério da Fazenda, ao participar de evento da B3Cotação de B3 dirigido a investidores estrangeiros nesta terça-feira.
“O sistema tributário é complicado, composto e assimétrico e isso afeta o funcionamento do mercado”, afirmou Pinto, acrescentando que hoje o equivalente a um quarto da dívida do governo federal, na casa dos R$ 8 trilhões, corresponde a títulos com benefício fiscal.
“O resultado é que não tem almoço grátis, alguém está pagando por isso, a taxa de juros de longo prazo está aumentando por conta da demanda divergida para esses títulos e outras empresas, que não podem emitir, outros setores, estão pagando mais por conta das isenções.”
Pinto defendeu o projeto que reforma a tributação de investimentos, uniformizando a alíquota das diversas aplicações em 17,5%, independentemente do prazo, em comparação à taxação que vigora hoje, de 15% a 25%.
“Isso vai facilitar para que os investidores naveguem no ambiente tributário brasileiro, vai permitir coisas que não podíamos, como compensar perdas e ganhos e ser taxado só pelo ganho, é mais eficiente. O principal resultado disso é acabar com distorções no mercado.”
Desafios
Durante o evento, Pinto também afirmou que o mercado de capitais passou por uma transformação completa nos últimos 20 anos graças a uma série de reformas microeconômicas, com as ofertas de títulos e valores mobiliários passando de R$ 30 bilhões para a casa do R$ 1 trilhão no ano passado, mas eventos recentes mostram que há desafios a enfrentar.
“Embora ninguém discuta a qualidade das leis e da regulamentação, alguns casos de fraude no nosso mercado – um desses casos tivemos impactos para o mercado como um todo -, embora sejam exceção, lembraram que precisamos ser vigilantes e melhorar as regras para que não aconteçam novamente”, afirmou, sem mencionar as operações da Polícia Federal, Receita Federal e Ministério Público que investigam elos do crime organizado com o setor financeiros, ou ao caso do Banco Master, cuja aquisição pelo BRB foi vetada pelo Banco Central na semana passada.
Pinto citou o avanço de Projeto de Lei no Congresso que prevê a reforma o mercado de capitais. “As regras que temos hoje são boas, claras, protegem o investidor, não creio que hoje estejam abaixo do nível de qualquer país desenvolvido”, disse o representante da Fazenda. “Mas para melhorar a regulamentação, tentamos reforçar o poder da CVM, pela primeira vez aumentamos o orçamento, contratamos pessoas pela primeira vez em dez anos, ainda é preciso dar mais independência à gestão do seu orçamento.”
Ele comentou ainda que a CVM levanta dinheiro suficiente para cobrir alguns custos e que poderia aplicar o dinheiro arrecadado para melhorar a supervisão. “A CVM, apesar de ser superpoderosa, só pode impor multas, não podemos ordenar ninguém a pagar algum tipo de indenização a alguém que tenha sofrido perdas por quebra de regras no mercado de capitais.”
Para que o investidor possa ser ressarcido por fraudes cometidas por acionistas ou outros envolvidos, Pinto sugeriu que alguns mecanismos precisam ser aprimorados. “Não queremos ações coletivas infundadas, mas que os investidores sejam compensados.”
Para além do fortalecimento da CVM, Pinto disse que a abordagem regulatória precisa mudar. “Hoje o modelo está focado em produtos e segmentos e não necessariamente no objetivo que a regulamentação pretende atingir. Isso tem aberto a porta para uma série de distorções”, acrescentou.
“Os players de mercado escolhendo o melhor regime para si nem sempre é o melhor para investidores e consumidores”, disse Pinto. “Temos que reformar o sistema para que esse tipo de arbitragem regulatória não seja mais possível. Temos visto mais risco sistêmico no mercado, alguns fundos de investimentos estão começando a se parecer mais com bancos do que no passado”, continuou Pinto. “A CVM não tem ferramentas, nem mandato legal para lidar com isso, nem tem autoridade para fazer supervisão de fundos de investimentos de direitos creditórios”, exemplificou.
Pinto defendeu que o Brasil não pode ter um único regulador, mas um modelo de dois reguladores, cujo raio de atuação não seja definido por produtos, mas pelos objetivos que querem atingir, com “um regulador buscando garantir um sistema seguro e que a economia não será prejudicada por algum tipo de crise bancária e outro com função de proteger o consumidor, o investidor e evitar fraudes no mercado.”
Ele citou que países como Reino Unido e Austrália adotam esse modelo. “Não é um processo a ser feito da noite para o dia, mas temos que seguir esse caminho se quisermos continuar a ter um mercado de capitais regulado, eficiente para servir as pessoas.”
Otto Lobo, presidente interino da CVM, presente na abertura do evento, comentou que a autarquia tem o papel de proteger os investidores e garantir que os mercados permaneçam funcionais. “O alvo é crescimento, boa governança e liquidez, esse é o nome do jogo”, afirmou. Entre os novos projetos mencionou a conversão de toda a indústria de fundos ao padrão de contabilidade internacional IFRS.
A adoção começa pelos estruturados: fundos imobilários, Fiagro e FIDC, que têm operações mais próximas a de companhias abertas. “É uma iniciativa rápida para adotar a fim de melhorar as regras de governança e contábeis para a indústria de fundos que reúne R$ 9,5 trilhões.”
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Fonte: Valor Econômico

