Por Viktoria Dendrinou e Christopher Anstey — Bloomberg
10/07/2023 05h02 · Atualizado há 5 horas
Os dois dias de compromissos da secretária do Tesouro dos EUA, Janet Yellen, com autoridades chinesas em Pequim ofereceram uma via para EUA e China conterem os danos em suas economias infringidos pela intensificação da rivalidade entre as duas potências.
Enquanto no lado militar não houve uma retomada da comunicação bilateral – em meio a encontros de alto risco entre as forças aéreas e marítimas dos dois lados – a visita de alto nível de Yellen sugere esperança de alguma proteção na competição econômica.
Em 10 horas de reuniões na sexta e no sábado, Yellen disse que procurou convencer a nova equipe econômica da China de que os EUA não estão empenhados em buscar “vantagens econômicas” contra o país. Embora o governo Biden tenha intensificado os controles sobre algumas exportações críticas e esteja considerando restringir os investimentos das empresas americanas no exterior, Yellen enfatizou que as medidas que Washington toma são “direcionadas” e projetadas apenas para proteger a segurança nacional.
“Nenhuma visita resolverá nossos desafios da noite para o dia”, disse Yellen ontem em Pequim. “Mas espero que esta viagem ajude a construir um canal de comunicação resiliente e produtivo com a nova equipe econômica da China.”
A questão dos controles de exportação pode representar um teste inicial às “barreiras de proteção” que Yellen buscou erguer. Espera-se que a Casa Branca revele nas próximas semanas uma ordem executiva do presidente Joe Biden que estabelecerá revisões e, no fim, restrições a investimentos de empresas dos EUA em algumas áreas de tecnologia avançada. Essas restrições às exportações americanas têm o potencial de barrar certos investimentos em semicondutores, inteligência artificial e computação quântica na China.
“Tenho certeza de que eles [os chineses] vão monitorar de perto nossas ações”, disse Yellen na entrevista coletiva. “Queremos abrir canais para que eles possam se manifestar sobre nossas ações. E para que possamos explicar e, possivelmente, em algumas situações, responder as consequências não intencionais de nossas ações.”
Os comentários de Yellen foram a declaração mais clara até agora de que Washington levaria em consideração as opiniões ou comentários de Pequim ao implementar ou projetar medidas contra a China.
Na sexta-feira, o premiê da China, Li Qiang, disse a Yellen que “estender demais” o conceito de segurança “não é bom para o desenvolvimento econômico dos dois países e do mundo”, segundo a agência estatal de notícias Xinhua. Essa mensagem foi repetida nas cinco horas de reunião de Yellen com o vice-premiê, He Lifeng, recém-nomeado encarregado da política econômica, segundo a Xinhua.
A secretária do Tesouro americano procurou repetidamente enfatizar que relações econômicas bilaterais profundas e amplas são positivas. É importante que as duas nações “certifiquem-se de que as empresas entendam que há uma ampla gama de interações econômicas que não são polêmicas para ambos os lados”, disse ela.
Para a China, os encontros ocorreram em um cenário de recuperação econômica mais fraca do que o esperado após o fim das restrições da política de covid-zero.
A mensagem de Yellen pode aliviar as preocupações entre os aliados dos EUA de que Washington estaria determinado em fragmentar a economia global entre um bloco americano e um chinês. Washington pressionou o Japão e a Holanda a aderirem às restrições às exportações de produtos tecnológicos de ponta para a China.
Do ponto de vista da comunidade global mais ampla, a visita de Yellen – semanas após a viagem do secretário de Estado Antony Blinken a Pequim – oferece uma imagem de engajamento responsável em um momento em que muito países se opõem profundamente a ter que escolher um lado em qualquer nova guerra fria.
A linguagem de Yellen em Pequim “enviou um sinal muito forte para a comunidade empresarial e internacional, e para o resto do mundo, de que os EUA e a China devem trabalhar juntos”, disse Henry Wang, fundador do Centro para China e Globalização, um grupo de pesquisa em Pequim.
EUA e China têm intensificado esforços para aumentar a influência no chamado Sul Global. Yellen terá a oportunidade de aludir ao recém-restabelecido compromisso de alto nível com a China quando se reunir com os ministros das Finanças dos países do G-20 (grupo das principais economias mundiais) na Índia neste mês.
Suas declarações em Pequim também sugerem um novo termo para descrever os esforços dos EUA para promover o comércio e o investimento em outros lugares além da China. “Buscamos diversificar, não descoplar”, disse Yellen na sexta-feira. No dia seguinte, ela disse: “Ouvi meus colegas chineses expressarem ceticismo com o desacoplamento – e expressaram alguma preocupação de que diminuir o risco equivale a desacoplar. E senti que era extremamente importante abordar essa questão”.
Yellen destacou que “reduzir riscos envolve atenção a preocupações de segurança nacional claramente articuladas e estritamente direcionadas, bem como uma preocupação mais ampla com a diversificação de nossas cadeias de suprimentos”, aplicada apenas a “alguns setores importantes”.
Porém, um comentário da Xinhua publicado na sexta-feira dizia que “atos de miopia e uma mentalidade da Guerra Fria facilmente danificarão qualquer progresso já feito para reavivar os laços bilaterais”. E que pressionar pela redução de riscos “não levaria o lado chinês a acreditar que os EUA desistiram de seus esforços para conter a China”.
Uma verdadeira reaproximação exigiria indiscutivelmente que os EUA e a China desmantelem a série de aumentos de tarifas comerciais impostos durante o governo do ex-presidente Donald Trump.
A questão da tarifas foram levantadas nas negociações em Pequim, disse Yellen no sábado. Os EUA estão agora conduzindo, por lei, uma revisão de quatro anos dessas medidas. “Os resultados ainda não estão pronto”, disse ela.
Qualquer redução ampla nas tarifas envolveria risco político para Biden, que busca a reeleição em 2024. Os candidatos republicanos adotaram fortes posições anti-China, e os legisladores do Partido Republicano provavelmente atacariam uma normalização do relacionamento com a China.
“É irreal pensar que a economia pode ser divorciada das preocupações de segurança nacional”, as percepções chinesas e a retórica agressiva de ambos os lados, disse Mark Sobel, ex-funcionário sênior do Tesouro e hoje presidente do Fórum de Instituições Financeiras e Monetárias dos EUA. “A viagem de Yellen provavelmente não alterará a dinâmica subjacente do relacionamento econômico.”
Fonte: Valor Econômico