Por Lu Aiko Otta — De Brasília
26/05/2023 05h00 Atualizado há 4 horas
Num momento em que a nova regra fiscal é questionada por especialistas por depender muito fortemente de aumentos na arrecadação para ficar em pé, o governo anunciou dois novos buracos na receita de naturezas diferentes.
Para socorrer montadoras, foi decidido que haverá cortes no IPI e PIS/Cofins. O outro buraco ocorrerá a partir do ano que vem. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sinalizou com um programa de depreciação acelerada, que permitirá às empresas que fizerem investimentos abater os valores mais rapidamente de seu Imposto de Renda.
A ajuda às montadoras atropela a estratégia de Haddad, de várias formas. Primeiro, porque vai na direção contrária de elevar a arrecadação, algo de que ele necessita para fazer o ajuste fiscal. Segundo, porque se trata de um gasto tributário. Haddad tem atacado com frequência a conta de R$ 600 bilhões em descontos e isenções de impostos que minam a base da arrecadação federal.
Terceiro, porque o governo abrirá mão de receitas para incentivar o consumo de automóveis movidos a combustíveis fósseis, ainda que se tenha estabelecido privilégio para os menos poluidores. Não fica bem em meio a uma agenda, ainda em construção, focada em transformar o Brasil em potência ambiental e tecnológica.
Além disso, estimular o consumo de automóveis que, na melhor das hipóteses, custarão pouco menos de R$ 60 mil, dificilmente poderia ser classificado como uma medida para “colocar o pobre no orçamento”. Especialistas apontam que medidas de estímulo à economia devem ser destinadas a todos os setores, e não a um especificamente. O governo relativiza essa visão, no momento em que decide fazer uma política industrial.
O ministro do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin, foi questionado sobre os motivos que levaram o governo a dar estímulos tributários para a indústria automobilística. Não respondeu. Haddad conseguiu adiar por 15 dias o detalhamento dos cortes nos impostos dos automóveis. É uma cautela em prol da responsabilidade fiscal, explicou Alckmin.
Segundo o presidente da Anfavea, Marcio Lima Leite, avalia-se por quanto tempo haverá imposto reduzido. A indústria gostaria de 12 meses, pelo menos. Impactos na arrecadação serão produzidos pelo programa de depreciação acelerada. Essa é, porém, uma ideia mais alinhada com as recomendações de especialistas, pois beneficia todos e estimula investimento e modernização.
Os novos desafios à implementação da nova regra fiscal reforça dúvidas quanto à sua governança e ao ajuste das contas públicas. Não ajudam a criar ambiente propício ao corte de juros.
Fonte: Valor Econômico

