Por Financial Times
12/04/2022 05h02 Atualizado há 4 horas
Quando o CEO da maior gestora de ativos do mundo proclama o fim da globalização, deve-se prestar atenção. Larry Fink, fundador da BlackRock, escreveu recentemente aos acionistas que a guerra na Ucrânia, junto com mudanças nas cadeias de suprimentos causadas pela pandemia, pôs fim às últimas três décadas de globalização.
Ele crê que mais empresas e governos passarão a fabricar e comprar nacional e regionalmente, em vez de globalmente. A guerra, escreveu, é “um ponto de inflexão na ordem mundial da geopolítica, das tendências macroeconômicas e dos mercados de capitais”.
Isso é uma mudança que, na verdade, vem ocorrendo há uma década ou mais. Em alguns sentidos, a separação entre EUA e China, as maiores economias do mundo, realmente começou um dia depois do colapso do banco Lehman Brothers, quando a China lançou seu enorme programa de estímulo fiscal e começou a repensar a liberalização do mercado financeiro ao estilo anglo-americano.
Pequim não está sozinha nisso. Muitos países decidiram que o capital global voou, nos últimos 40 anos, muito à frente das economias nacionais, criando tensões e desigualdades nas sociedades. Essas tensões às vezes resultaram em reações populistas contra a globalização – geralmente definida como a capacidade de bens, pessoas e capital se deslocaram para onde for mais produtivo para eles.
Essas últimas décadas de globalização criaram prosperidade sem precedentes no âmbito global. Mas, dentro da maioria dos países, a desigualdade cresceu. Parte da insatisfação diz respeito à estagnação dos salários, perda de empregos, especialmente para os trabalhadores braçais e as classes médias e baixas nos países ricos.
A maior parte disso se deve à ruptura tecnológica dos mercados de trabalho, mas parte se deve ao que acadêmicos como David Autor chamaram de “o choque da China”, ou seja a entrada da China na Organização Mundial do Comércio (OMC).
A partir de 2000, o fluxo de capital ocidental para um país com uma força de trabalho barata e de tamanho sem precedentes conteve os salários industriais e os empregos nos EUA. Isso contribuiu para a dinâmica do “vencedor leva tudo”, em que a maior parte do crescimento da renda foi capturado por grandes empresas multinacionais, pela China e por outros países asiáticos de crescimento acelerado.
Isso foi possível devido à ausência de uma política antitruste adequada dos EUA e a uma excessiva desregulamentação financeira e corporativa no Ocidente. A globalização, na verdade, nunca foi total, pois a China isolou os seus mercados de capitais e protegeu setores estratégicos de modos que não se enquadram nas regras da OMC.
Os países em desenvolvimento menores há muito reclamam que o livre comércio irrestrito os prejudica. Agora, países ricos também estão reclamando. A solução não são guerras comerciais, e sim mudanças nas políticas internas e instituições internacionais para ajudar a salvar o que há de melhor na globalização, ajudando ao mesmo tempo a reconectar a economia mundial à prosperidade interna, de maneira a fazer com que os eleitores sintam que seus líderes estão cuidando dos seus interesses.
Crise financeira, pandemia e guerra realmente mostrara, às mentes corporativas como as cadeias de suprimentos globais podem ser vulneráveis em períodos de tensão. Os planos de China de uma economia circular poderão deixar o mundo mais bipolar. Uma maior regionalização será o futuro. Salários em alta na Ásia, preços maiores da energia e padrões ambientais e sociais tornam mais caras as cadeias de suprimentos longas. As regiões diferem sobre como regular dados e economias digitais e terão políticas próprias.
O pêndulo econômico oscila. Este ciclo particular de globalização durou 40 anos. A esperança é que as coisas não oscilem para muito longe, na direção oposta, enquanto avançamos para uma nova ordem mundial.
Fonte: Valor Econômico
