Nova ministra da articulação política, Gleisi Hoffmann (PT-PR) tomou posse do cargo na segunda-feira (10) e prometeu dialogar tanto com outros ministros do governo como com parlamentares do Congresso Nacional, com os quais terá que negociar diariamente a partir de agora. O tom amigável foi lido como resposta às críticas à escolha dela – conhecida pela postura combativa – para a Secretaria de Relações Institucionais (SRI), que exige capacidade de negociação.
Gleisi substituiu Alexandre Padilha, que, por sua vez, assumirá a pasta da Saúde, no lugar de Nísia Trindade. A cerimônia no Palácio do Planalto marcou o início da gestão de ambos. A solenidade foi ainda a despedida oficial de Nísia do cargo. Em seu último discurso como ministra, ela afirmou ter sido alvo de uma campanha de desvalorização “sistemática e misógina”.
Um dos acenos de Gleisi Hoffmann foi ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de quem ela já discordou publicamente por conta dos rumos da política econômica, especialmente em relação ao controle das contas públicas. “Tenho plena consciência do meu papel que é da articulação política. Estarei aqui, ministro Haddad, para ajudar na consolidação das pautas econômicas deste governo, as pautas que você conduz e que estão colocando novamente o Brasil na rota do crescimento, com emprego e renda”, disse a nova ministra, numa clara correção de discurso.
A nova chefe da SRI fez o mesmo movimento em relação ao ministro da Casa Civil, Rui Costa, considerado o braço direito do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nos bastidores, integrantes do PT diziam, antes da nomeação dela, que a presença de Gleisi no Planalto poderia enfraquecer Costa politicamente.
“Estarei aqui, ministro Rui Costa, para dar apoio à execução dos programas de governo que você coordena e que foram rapidamente restabelecidos em dois anos. Juntos, e somente juntos, seremos capazes de reacender a esperança e atender as justas expectativas da população. O Brasil quer paz, justiça e uma vida melhor para todos e todas”, argumentou a petista.
Os recados da nova ministra foram estendidos também aos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), que marcaram presença na posse. Em seu discurso, Gleisi, que é deputada federal, prometeu aos dois que entregará uma relação “respeitosa, franca, solidária e direta”.
“Faço um agradecimento muito especial aos presidentes Hugo Motta, que preside a Casa à qual pertenço, e Davi Alcolumbre, que preside a Casa à qual já pertenci. Obrigada por suas manifestações de estímulo e acolhida. Vamos ter uma atuação conjunta em defesa do povo e do país. Presidente Hugo, presidente Alcolumbre, com vocês quero manter a relação respeitosa, franca, solidária e direta. Não tenham dúvidas, estarei sempre aqui para conversar, ouvir críticas e acolher sugestões”, ponderou.
Ainda em relação ao Congresso, Gleisi prometeu construir uma base aliada “estável”, o que tem sido um calcanhar de Aquiles para a gestão Lula. Em seguida, indicou que tratará como prioridade a isenção do Imposto de Renda para pessoas que recebem até R$ 5 mil – promessa de campanha de Lula em 2022.
Os recados foram dados diante de uma plateia de parlamentares e ministros, inclusive os indicados pelo Centrão, como André Fufuca (PP-MA) e Silvio Costa Filho (Republicanos-PE). A cerimônia não contou, no entanto, com a presença de presidentes de partidos de centro, no momento em que o governo busca ampliar apoios para as eleições de 2026.
Entre parlamentares, além dos chefes das duas Casas, uma presença que chamou atenção foi a do líder do MDB na Câmara, Isnaldo Bulhões (AL), que chegou a ser cotado para o cargo na SRI. Surpreendeu a presença do ex-presidente José Sarney, um dos principais caciques do MDB.
O discurso de despedida de Nísia ocorreu antes da assinatura dos termos de posse. A ex-ministra abordou diretamente o processo de fritura que culminou em sua demissão, ao afirmar ter sido alvo de uma campanha contra seu trabalho.
Criticada por supostamente não defender com firmeza as mudanças na pasta em relação à gestão Jair Bolsonaro, e com o cargo sempre cobiçado pelo Centrão, ela afirmou que não se pode “aceitar como natural” esse tipo de comportamento.
“Não posso esquecer que durante os 25 meses em que fui ministra uma campanha sistemática e misógina ocorreu de desvalorização do meu trabalho, da minha capacidade e da minha idoneidade”, disse Nísia. “Não é possível e acho que não devemos aceitar como natural comportamento político desta natureza.”
Além disso, ela buscou se defender em relação aos recordes de casos de dengue registrado no ano passado, outro tópico que a fazer perder força no cargo. Sobre isso, afirmou que a doença tornou-se um “problema de saúde global” e destacou que soluções não vêm apenas da Saúde, necessitando de obras em áreas como o saneamento.
Padilha, por sua vez, prometeu que, no novo cargo – que já ocupou no governo Dilma Rousseff – irá “enterrar” a tabela SUS a fim de sinalizar uma disposição do governo de remunerar melhor os profissionais da área e, assim, garantir mais acesso à população a especialistas.
O atraso no programa Mais Especialistas também foi uma das razões que levaram à demissão de Nísia e sua substituição por Padilha, segundo fontes do governo. O programa deverá ser rebatizado por Padilha e o ministro da Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom), Sidônio Palmeira. O Valor apurou que a tendência é que o programa ganhe a alcunha de “Minha Vez”.
“Teremos a coragem e a ousadia necessária para superar esse modelo da tabela SUS. Enterrá-la de uma vez por todas e garantir acesso [da população a especialistas]”, afirmou. “Queremos um novo modelo de remuneração que sinalize aos Estados, municípios, Santas Casas que pagaremos mais e melhor pelo atendimento especializado no tempo correto.”
A tabela SUS é a referência oficial de valores pagos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para procedimentos médicos, hospitalares, exames, cirurgias e outros serviços prestados por hospitais e clínicas conveniadas. Estabelecida pelo Ministério da Saúde, a ela define o reembolso por cada atendimento realizado na rede pública e contratada, sendo frequentemente criticada por valores defasados em relação aos custos reais dos procedimentos.
O novo titular da Saúde afirmou ainda que irá buscar apoio no setor privado para garantir o acesso da população a esses médicos. Mas advertiu que o problema não será sanado de maneira repentina.
Fonte: Valor Econômico

