Salgo (esq.) e Alves: com nova regulação de fundos, atualização dos ativos a valor de mercado vai se tornar mais sensível — Foto: Gabriel Reis/Valor
Numa régua de 0 a 5, as gestoras de recursos que atuam em estratégias de ações, renda fixa crédito privado e multimercados apresentam uma nota média de 3,5, segundo mapeamento da Luz Soluções Financeiras. O resultado é fruto de um processo de diligência feito pela consultoria nos últimos meses em 40 das principais assets de fundos líquidos brasileiras, que reúnem cerca de R$ 5,6 trilhões, mais de 60% do total do setor ao fim de junho, com seus R$ 8,9 trilhões.
Porém, se na média a indústria é um aluno que passa de ano, ao se olhar para os detalhes do boletim, ainda é preciso algum reforço. A avaliação da consultoria incluiu governança, riscos, investimentos, compliance e carteira teórica, além de subitens em cada um desses temas. Como tem como clientes os fundos de pensão, o objetivo dessa abordagem é ajudar o investidor institucional na escolha das melhores alternativas para os seus portfólios.
O item que analisa a carteira teórica dos fundos foi o mais bem avaliado nas métricas da Luz. Em média, as assets obtiveram nota 4,39. Já o de pior pontuação foi o relacionado a risco, com apenas 2,77, sendo 1,8 na ponta mais baixa e 4 na mais alta.
Na classe renda fixa crédito privado, as notas finais variaram de 3,1 a 4,1, com média geral em 3,5, puxada também pela carteira teórica, que mede, por exemplo, a diversificação e a limitação de ativos por contraparte. No entanto, de acordo com técnicos da consultoria, houve algumas deficiências relacionadas à seleção, ao monitoramento e até à reprecificação.
Um dos dilemas do mercado de gestão de crédito é que a proporção de ativos sem referência de preços no secundário com aqueles que têm é gritante, diz Suelem Salgo, executiva-chefe (CEO) da Luz. Com a nova regulação de fundos, a resolução 175 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a atualização dos ativos a valor de mercado vai se tornar ainda mais sensível. Essa é uma função que hoje recai sobre o administrador.
“A 175 busca a corresponsabilidade do administrador, do serviço de custódia e do gestor para que ele também assuma a responsabilidade de reprecificação no seu processo de diligência. É mais um item a inserir na tomada de decisão”, afirma Salgo. Entre o papel de cada um há uma discussão que envolve o spread de crédito e a marcação [atualização] do ativo, “vale uma investigação para saber se o gestor não está tomando um título de dívida abaixo do valor de mercado”, exemplifica. A questão, acrescenta, é levar para a mesa de operações o preço justo para negociar os ativos que estejam no seu espectro de investimentos.
Na sua diligência, a Luz não chegou a pesar os efeitos de um excesso de recursos indo para os fundos de crédito, como tem acontecido. Porém, nas diversas métricas há a de liquidez para os ativos e para as carteiras, diz Jadson João Alves da Silva, consultor de investimentos da Luz. “A gente olha a asset como um todo por estratégia, não leva em conta os eventos, quer garantir que esteja preparada para eles.”
Em paralelo aos preços de títulos de crédito no mercado secundário capturados pela Anbima, que levam em conta a negociação dos papéis, a Luz tem uma base de 5,3 mil ativos que acompanha entre certificados e letras de crédito imobiliário e do agronegócio (CRI, CRA, LCI e LCA) e outros papéis bancários. Busca levar uma referência para aqueles com baixa liquidez a partir da análise fundamentalista e qualitativa de crédito, avaliando o emissor, criando curvas, parâmetros de definição do spread e de precificação dos ativos.
No caso da estratégia de renda variável, entre os cinco pilares pesquisados, o que analisa a carteira teórica dos fundos foi também o mais bem avaliado. Em média, as assets obtiveram nota 4,39. Já o vértice com a pior média foi o relacionado a risco, com apenas 2,77, com as notas variando entre 1,8 e 4.
De acordo com Silva, um dos principais pontos críticos foi a falta de independência das equipes de risco, com alguns gestores apresentando nota 1. “A independência é fundamental para garantir que as avaliações e as ações tomadas sejam imparciais e focadas exclusivamente na proteção dos interesses dos investidores”, afirma.
Já na radiografia de assets que atuam com multimercados, apesar de a média final também ter ficado em 3,5, os itens que compõem a análise diferem das demais estratégias. Houve destaque para a gestão, com a maior nota para o processo de decisão, com média de 3,6. A abordagem de risco também foi um pouco melhor, com média de 3,2, com as notas variando entre 2,6 e 3,6.
De acordo com Salgo, o que as gestoras teriam que aprimorar é a distribuição e rateios das ordens nos diversos portfólios de uma mesma estratégia. “Os processos e sistemas precisam ser muito bem assessorados para que não abra margem para transferência de riqueza. Ao selecionar as cerejas, tomar o cuidado de que a escolha não seja feita pela mesa de operações.”
Em alguns casos, quando se questiona qual é a forma de controle, acaba-se caindo no velho Excel, com muitos sistemas quebrados por equipes e sem integração do fluxo entre a boleta e a finalização da negociação que atribui determinado ativo a diversas carteiras. “É o ‘SAP’, o sistema avançando de planilha”, brinca Salgo. “Quando você vai avaliar a mesa de operações, vê sistema tomando decisões em cima da rentabilidade, o risco vem a posteriori. Fica claro que o risco não está inserido na tomada de decisao. Risco é alçada.”
Fonte: Valor Econômico

