Até 2026, a brasileira gen-t pretende ter sequenciado o genoma de 200 mil brasileiros
Por Stella Fontes — De São Paulo
09/10/2023 05h02 Atualizado há 4 horas
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A Gen-t Science, ou simplesmente gen-t, startup brasileira que está construindo o que pretende ser o maior banco genético da América Latina, acaba de levantar mais US$ 1,3 milhão para investir no ambicioso projeto lançado pela geneticista Lygia da Veiga Pereira, professora titular da Universidade de São Paulo (USP).
Como na primeira rodada, a startup, que chegou a um total de R$ 16 milhões (US$ 3,3 milhões) em recursos captados, chamou a atenção de pesos pesados em investimentos de impacto e inovação radical, agora atraiu a Eurofarma, uma das maiores e mais conceituadas farmacêuticas brasileiras.
Por meio de seu fundo de venture capital, Eurofarma Ventures, a companhia se tornou a primeira do setor, no país, a apostar no projeto. O fundo foi lançado neste ano e terá investimentos de até US$ 100 milhões da farmacêutica, com foco em empresas que estejam em fases iniciais de descoberta e desenvolvimento de medicamentos e terapias com inovação radical.
Até 2026, a gen-t pretende ter sequenciado o genoma de 200 mil brasileiros, montando um banco de dados genéticos e de saúde diverso e de valor inestimável para a evolução da medicina de precisão. Hoje, conta com 7 mil participantes recrutados e deve chegar a 10 mil até o fim do ano. Para 2024, o plano é alcançar a marca de 25 mil, no caminho para cumprir a meta de 2026.
“Entendemos a Eurofarma como um investidor estratégico, por trazer a visão do cliente”, disse Lygia ao Valor. Investidores que haviam entrado na primeira etapa da captação, que movimentou US$ 2 milhões no fim de 2021, acompanharam os novos.
Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central e fundador da Gávea Investimentos, já era investidor da startup, ao lado de Eduardo Mufarej (GK Ventures) e do americano Daniel Gold, da QVT Financial LP, especializado em biotecnologia. Dan trouxe a biofarmacêutica Roivant Sciences como investidora ainda na primeira etapa. No futuro, esses aportes poderão ser convertidos em ações da empresa.
Dada a diversidade de sua população, explica a especialista, o Brasil pode contribuir com a medicina de precisão de forma universal. Hoje, do total de genomas sequenciados no mundo, 80% são europeus, 10% são asiáticos, 7% não-identificados, 2% são africanos e apenas 1% é hispânico ou latino-americano.
Para alcançar esse objetivo da diversidade, um gargalo em projetos similares que foram executados em países desenvolvidos e que leva a desigualdades nos avanços médicos, a gent-t está se concentrando nas classes C e D, tradicionalmente excluídas de estudos dessa natureza.
Não à toa, o primeiro parceiro da startup para recrutamento de voluntários foi a Dr. Consulta, rede de clínicas médicas voltada à baixa renda. Mais recentemente, a gen-t colocou em prática outra modalidade, de parceria com prefeituras. Começou pelo Estado de São Paulo, fez um piloto no Amazonas e se prepara para chegar no Norte e Nordeste do país. Neste momento, o ritmo de entrada de voluntários está entre 800 e 900 ao mês, atingindo um dos marcos estabelecidos em contrato com os investidores.
“O objetivo é incluir a população brasileira na medicina de precisão”, disse a geneticista, que apesar de ter se lançando em um empreendimento privado, pretende que a saúde pública também possa se beneficiar das descobertas feitas pela gen-t. Uma das maiores dificuldades é convencer o voluntário a fornecer suas informações – da mesma forma, ter a segurança jurídica de que tudo está sendo feito da forma legal demandou investimentos elevados da startup.
Com acesso a dados genéticos e informações sobre a saúde de milhares de voluntários, que serão acompanhados por anos, será possível acelerar a prática da medicina preventiva, com redução dos custos no sistema público, e desenvolver medicamentos e terapias inovadores.
“Quando se olha para o privado, a escala é maior e há maior liberdade de escolha dos parceiros. São projetos caros. Seremos aceleradores da inovação radical, com planos de ser uma biotech [que desenvolve medicamentos e terapias] mais para a frente”, contou.
A gen-t está em vias de fechar seu primeiro contrato, com uma farmacêutica internacional que está interessada em uma característica específica da população – que não é revelada e será incluída no protocolo atual se o acordo for firmado. A ideia é que os recursos dessa segunda etapa da captação garantam fôlego financeiro aos trabalhos até 2024, quando a startup já teria condições de ser autossuficiente em receitas.
O embrião do Projeto gen-t do Brasil surgiu em 2019, quando, pelas mãos da cientista, foi criado o programa de genômica populacional “DNA do Brasil”, dentro da USP. Em 2022, já eram 4 mil genomas sequenciados, da junção de quatro estudos independentes, realizados em São Paulo, no Rio Grande do Sul e no Amazonas. Na transição para a esfera privada, Lygia delegou a liderança do programa público para outra renomada especialista, Tábita Hünemeier.
Fonte: Valor Econômico