Por Sha Hua e Phred Dvorak — Dow Jones Newswires, de Cingapura e Houston
22/11/2023 05h01 Atualizado há 4 horas
Os mais novos fabricantes chineses de equipamentos para a geração de energia solar incluem um produtor de leite e um fabricante de brinquedos. Os novos concorrentes são exemplos de uma explosão de gastos com energia verde na China que está alimentando o rápido desenvolvimento das energias renováveis no país, ao mesmo tempo que cria um excesso de oferta de componentes solares que está se espalhando pelo setor e afetando as tentativas de desenvolver essa produção em outros lugares, especialmente na Europa.
Desde o começo do ano, os preços do polissilício chinês, o componente básico para a produção de painéis solares, caíram 50% e os dos painéis 40%, segundo dados da Opis, uma empresa que monitora dados e é controlada pela Dow Jones.
Dentro da China, algumas companhias temem que uma “bolha verde” esteja prestes a estourar. A economia chinesa, guiada pelo Estado, investiu quase US$ 80 bilhões na produção de energia limpa no ano passado, cerca de 90% dos investimentos mundiais nesta área, segundo estimativa da BloombergNEF. Os gastos anuais do país com as energias limpas em geral aumentaram mais de US$ 180 bilhões por ano desde 2019, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE).
A corrida por financiamentos atraiu uma variedade incomum de empresas para esse movimentado negócio. No terceiro trimestre, a gigante chinesa dos laticínios Royal Group anunciou planos para três novos projetos: uma fazenda com 10 mil vacas leiteiras, uma unidade de processamento de produtos lácteos e uma fábrica de US$ 1,5 bilhão para a produção de células e painéis solares.
“A indústria da energia solar vai melhorar no longo prazo e o mercado potencial é enorme”, escreveu o Royal Group em um documento em que esboçou o projeto no ano passado. Mais recentemente, o Royal Group disse que quer criar sinergias entre seus principais negócios agrícolas e a energia fotovoltáica, e “promover a tecnologia solar para capacitar os produtores de laticínios a reduzir os custos e aumentar a eficiência”, segundo disse a companhia em uma resposta ao diário americano “The Wall Street Journal”.
O Royal Group não foi o único a aderir à onda da energia solar na China nos últimos dois anos. Outros novatos incluem uma rede de joalherias, uma fabricante de equipamentos para controle de poluição e uma companhia de produtos farmacêuticos.
Gastos anuais do país com energia limpa crescem mais de US$ 180 bi por ano desde 2019, segundo a AIE
Os recém-chegados estão ajudando um ambicioso esforço da China na energia solar – só neste ano o país deverá instalar uma capacidade de geração de energia solar igual a capacidade total dos Estados Unidos, segundo estima a Rystad Energy.
Enquanto isso, as exportações chinesas de tudo que vai de baterias e veículos elétricos a painéis solares a turbinas eólicas aumentaram, provocando polêmica em lugares como a Europa e os EUA, que estão tentando desenvolver suas próprias produções internas de energias limpas.
Efeitos em todo os mundo. Na energia solar, o investimento é um motivo importante para o enorme excesso de oferta de componentes e a queda nos preços que estão afetando os lucros de fabricantes do mundo todo. Muitas empresas chinesas de energia solar já estabelecidas estão alertando que as consequências poderão ser amargas, com prejuízos e falências.
“O setor inteiro está para entrar em uma fase eliminatória”, disse a Longi Green Energy Technology, uma das maiores empresas da área de energia solar da China, em seu relatório financeiro semestral divulgado em agosto.
Pelo menos 13 empresas, incluindo as líderes setoriais chinesas Jinko Solar, Trina Solar e Canadian Solar, suspenderam seus planos de ampliação da capacidade de produção, segundo a TrendForce, uma firma de inteligência de mercado que tem sede em Taiwan.
Muitos fabricantes chineses vêm tentando se desfazer de estoques a preços de banana na Europa, um dos poucos grandes mercados de energia solar sem tarifas ou outras barreiras às importações de painéis solares. Embora os desenvolvedores de energia solar europeus estejam satisfeitos, os fabricantes da região, já pressionados, estão reclamando.
Alguns produtores europeus já enfrentavam desafios internos, como a lentidão na concessão de licenciamentos, uma falta de mão de obra capacitada e os altos custos da energia, tornando difícil competir com os concorrentes chineses.
O excesso de oferta foi intensificado pelas barreiras às importações na Índia e nos EUA, que frustraram as previsões dos fabricantes chineses e deixaram seus painéis vegetando em portos e depósitos. Os EUA mostraram ser particularmente imprevisíveis com a ameaça de imposição de impostos antidumping e a implementação da Lei de Prevenção ao Trabalho Forçado Uigur, que acabou impedindo a entrada no país de painéis feitos com polissilício chinês.
A indústria chinesa de produção de energia solar já passou por altos e baixos antes e teve sua cota de participantes iniciantes e estranhos. A Tongwei Solar começou como fornecedora de ração para peixes que adquiriu uma fabricante de painéis solares durante a recessão de 2013 para complementar seu negócio de aquicultura com parques solares. Hoje, a Tongwei Solar é a maior fabricante de polissilício do mundo.
Desta vez, mais de 70 companhias de capital aberto – que vão de moda, produtos químicos e imóveis a eletrodomésticos – entraram no setor solar em 2022, segundo dados da companhia de inteligência InfoLink.
Em fevereiro, a Zhejiang Ming Jewelry, que administra 1.000 joalherias especializadas em ouro na China, anunciou planos de investir US$ 1,5 bilhão para construir uma fábrica de células solares. Em agosto, a fabricante de brinquedos Mubang High-Tech anunciou uma joint venture com o governo local para uma base de produção de células solares de US$ 660 milhões.
Pandemia causou interrupções. As interrupções na cadeia de abastecimento causadas pela pandemia comprimiram os estoques e elevaram os preços anos atrás. Os compradores europeus de energia solar encomendaram grandes quantidades de painéis solares à medida em que eles forem sendo disponibilizados, enquanto os fabricantes chineses superestimaram a demanda, segundo afirma Matthias Taft, presidente-executivo da BayWa r.e., maior distribuidora de produtos de energia solar da Europa. “Nós e outros fizemos muitos pedidos” durante o segundo semestre de 2022, diz ele.
A recente queda dos preços no setor de energia solar significa que os painéis chineses estão sendo vendidos por um preço que alcança cerca de metade dos custos de fabricação para membros da associação da indústria europeia de produção solar, diz Johan Lindahl, o secretário-geral do grupo. Cerca de 40% dos painéis fabricados este ano pelos membros que responderam a uma pesquisa da associação, estavam parados nos estoques.
Um produtor norueguês de wafers solares, um componente fundamental na fabricação dos painéis, quebrou em agosto. Sua única concorrente restante na Europa, a NorSun, parou a produção nas últimas semanas porque seus clientes – a maioria fabricantes europeus de células e painéis solares – não estão conseguindo vender seus produtos, segundo Carsten Rohr, diretor comercial da NorSun.
Nesse ritmo, a dependência da Europa da indústria chinesa de energia solar está aumentando, em vez de diminuir, segundo Gunter Erfurt, presidente-executivo da Meyer Burger, uma fabricante suíça de células e painéis solares. A companhia optou por adiar sua planejada expansão na Europa, transferindo em vez disso equipamentos de produção para uma nova fábrica nos EUA, aproveitando os grandes subsídios oferecidos pelo governo americano aos fabricantes de equipamentos de geração de energia solar.
Observadores do mercado afirmam que o excesso de oferta poderá se resolver mais rapidamente do que o esperado, porque algumas companhias deverão cancelar ou adiar seus planos de expansão e outras estão aposentando fábricas antigas em favor de outras novas.
Ainda assim, alguns executivos chineses do setor, como Liu Yiyang, vice-secretário-geral da China Photovoltaic Association, estão pedindo que os governos locais para que pisem no freio nos investimentos em tecnologia verde.
Em janeiro, a Bolsa de Valores de Shenzhen emitiu uma carta de preocupação à Suzhou Shijing Technology, conhecida por seus equipamentos de controle de poluição. A bolsa perguntou de onde ela estava tirando seu investimento de US$ 1,5 bilhão para construir uma fábrica de células solares. Os ativos totais da companhia estão avaliados em apenas US$ 450 milhões.
Em sua resposta, a Shijing disse que 60% do investimento seria fornecido pelo governo local, incluindo a construção da infraestrutura da fábrica e dormitórios, além da concessão de subsídios para equipamentos e eletricidade.
Quando indagada sobre o progresso do projeto solar, a Shijing mencionou suas declarações públicas. No último relatório trimestral, divulgado em outubro, a companhia observou que estava “procedendo de maneira ordenada”.
Fonte: Valor Econômico
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