Os fundos de investimento imobiliário (FIIs) conseguiram captar até julho R$ 21 bilhões, cerca de 20% a menos que em igual período do ano passado, mostra levantamento do Santander a pedido do Valor. Em meio ao cenário adverso de juros altos e instabilidade macroeconômica, o resultado é considerado bom, mas obtido à custa de muita criatividade.
Segundo o autor do estudo, o analista de FIIs do banco, Flávio Pires, parte significativa das emissões foi de cotas para troca por ativos, negociação raramente vista até então no segmento.
“O ambiente não melhorou, mas a janela das novidades está longe de fechar”, diz Brunno Bagnariolli, sócio e diretor de investimentos da estratégia de imobiliário da JiveMauá. “O mercado está descobrindo o poder das inovações.” De acordo com ele, o espaço para esse tipo de oferta em fundos concentrados em ativos físicos, conhecidos como “de tijolo”, é grande. “Comprar ativos pagando com cota vai ser o novo motor do mercado”, avalia o gestor, que espera que o ambiente continue difícil ao menos até dezembro.
Uma das transações do tipo que chamaram a atenção foi a do TRX11, que adquiriu em junho R$ 543,5 milhões em 13 imóveis de uma mesma família, pagando 100% do valor em cotas emitidas pelo FII. É uma forma de driblar a dificuldade para captar, enquanto, do lado dos proprietários, é possível ir se desfazendo das cotas no mercado. “O cenário segue desafiador mas já se sabe que os juros pararam de subir e temos a sinalização de que no próximo ano haverá cortes”, afirma Pires.
Se considerado somente o primeiro semestre, foram R$ 17,3 bilhões em ofertas iniciais e subsequentes de FIIs, volume 22% abaixo dos R$ 22,4 bilhões registrados entre janeiro e junho de 2024. O período inclui a base forte do primeiro quadrimestre do ano passado, quando o grande otimismo com relação ao início do afrouxamento monetário abriu caminho para transações bilionárias, como a captação de R$ 1,8 bilhão do XP Malls em abril. Com a piora do cenário no ano passado, os FIIs acabaram fechando o ano com captação de R$ 44 bilhões. Até julho, portanto, em 2025 a captação se aproximou da metade do total do ano passado.
Diante dos juros altos, os fundos concentrados em crédito, conhecidos como “de papel”, obtiveram a maior fatia captada, 32% do total até julho. A Éxes aproveitou a demanda mais propensa a esses FIIs e levantou R$ 100 milhões para o EXES11, FII composto na maior parte por certificados de recebíveis imobiliários (CRIs) de médio risco que até então era concentrado no público institucional. Agora o objetivo é chegar ao varejo para dar mais liquidez à negociação das cotas. O patrimônio atual é de R$ 69 milhões, portanto a oferta irá mais que dobrar o fundo, explica Artur Carneiro, sócio fundador da gestora.
Em segundo lugar, mas bem atrás na participação no total, vêm os de ativos físicos, os “FIIs de tijolo”, sendo os de imóveis logísticos com 14%, renda urbana, 13% e de shoppings, com 5%. Os que investem em cotas de outros fundos levaram 14% do total ofertado.
De acordo com Pires, os galpões logísticos nas mãos de FIIs têm taxa de ocupação de 96%, acima dos 91% do país no segundo trimestre de 2025. Ele explica que isso acontece porque os fundos detêm os melhores ativos do segmento, quadro que não é o mesmo verificado em lajes corporativas. “As melhores estão nas mãos de outros players.” Com isso, a taxa de ocupação de ativos de FIIs é de 91,6% (de abril a junho deste ano), acima da geral de São Paulo, por exemplo, de 85,5%, mas em queda frente ao mesmo período de 2024 (95,2%).
Já no segmento de renda urbana, que compreende lojas alugadas para grandes varejistas, como lojas de material esportivo e farmácias, a ocupação é de 98%. No de shoppings a taxa de ocupação é de 95,2%, igual à geral do país.
Outro dado considerado positivo por Pires é o fato de o número de investidores ter ficado estável em 2,8 milhões de pessoas físicas no terceiro trimestre deste ano, frente a 2024. Ele lembra que o valor das cotas fechou janeiro na média de 22% em relação ao valor de mercado, percentual que agora caiu a 15%. No ano, o Ifix, índice de referência do segmento, também vem apresentando um bom resultado, com alta de 11% até agosto e somente dois meses negativos (janeiro e julho). Em 2024, o índice encerrou com queda de 5,89%.
Os dados do Santander não consideram os chamados fundos “cetipados”, que são negociados fora do pregão da B3. Vitor Duarte, diretor de investimentos da Suno Asset, diz que o investidor de varejo, que predomina nos FIIs, se mantém arredio. Por isso, afirma, cresceram as ofertas dos fundos negociados no ambiente de balcão, cuja cota não tem a volatilidade dos negociados no pregão. No entanto, a desvantagem é a falta de liquidez, o que na hora de o investidor se desfazer pode fazer com que a venda tenha um deságio inesperado.
Duarte estima que esse segmento já corresponde a 50% do patrimônio dos FIIs listados, hoje em torno de R$ 400 bilhões, em 1,1 mil fundos. Nos Estados Unidos, para efeito de comparação, o mercado correspondente tem patrimônio total de US$ 1 trilhão em cem Real Estate Investment Trusts (Reits).
Outra inovação da qual os gestores lançaram mão foi a criação de fundos com subclasses, nas quais o fundo, também cetipado, oferece cotas seniores, com menor risco e também menor rendimento, e subordinadas, geralmente voltadas ao público institucional. “Se a troca de ativos por cota está movimentando o segmento de tijolo, a estrutura de subclasses é que está conseguindo trazer dinheiro novo para os FIIs”, diz Bagnariolli, da JiveMauá.
A gestora, inclusive, abriu caminho na categoria em janeiro, com uma oferta de R$ 1,2 bilhão para um fundo de galpões logísticos. A cota sênior, voltada ao varejo, tem garantida remuneração de IPCA mais 9% ao ano e prazo determinado de cinco anos. A subordinada, por sua vez, ficou com investidores institucionais, com tempo indeterminado e uma rentabilidade que pode chegar a 30% ao ano, no momento da venda dos ativos.
Já a Manatí lançou em abril a oferta inicial de seu fundo de Renda CDI, focado em CRIs originados e estruturados pela gestora. O veículo é cetipado e com prazo determinado. “São artifícios que ajudam a manter a captação”, afirma Eduardo Mekbekian, sócio e co-fundador da gestora. Segundo ele, é um público diferente do que investe nos FIIs listados, o que torna os cetipados concorrentes mais diretos das letras de crédito imobiliário (LCIs), emitidas pelos bancos, por terem maior característica de renda fixa. A operação levantou R$ 181 milhões, já inteiramente alocados. “Os momentos de difícil captação geralmente são os melhores para alocar.”
Fonte: Valor Econômico

