O declínio populacional da China acelerou em 2023, com sua economia registrando um dos menores crescimentos em décadas e apontando para desafios persistentes para a segunda maior economia mundial que vão de uma crise no setor imobiliário à deflação e pressões demográficas.
O Produto Interno Bruto (PIB) chinês cresceu 5,2% em 2023, superando o crescimento de apenas 3% de um ano antes, quando a economia foi refreada pela política draconiana de Pequim de combate à covid-19, e superando também a meta oficial do governo de cerca de 5%, que já era o menor número em décadas.
Mas a população caiu pelo segundo ano seguido, com as mortes aumentando e os nascimentos diminuindo. Wang Feng, um especialista em demografia chinesa da Universidade da Califórnia em Irvine, diz que o declínio de 2 milhões de pessoas revela a “pegada da covid-19”, que se espalhou pelo país no começo de 2023, depois que as autoridades suspenderam apressadamente as medidas de combate à pandemia.
Segundo analistas, os dados enfatizam o desafio enfrentado pelo presidente Xi Jinping, que iniciou um inédito terceiro mandato de cinco anos no poder em 2023, para arquitetar uma recuperação econômica mais vigorosa.
“Em alguns sentidos, o forte número [do crescimento] é um pouco enganoso”, diz Fred Neumann, economista-chefe do HSBC para a Ásia. “Ele vem de um ano anterior muito fraco e realmente mascara algumas das fraquezas fundamentais que estamos vendo em termos de demanda agregada.”
As ações chinesas perderam terreno após o anúncio do número. O índice Hang Seng Mainland Properties Index, de Hong Kong, caiu 4,9%, para o menor patamar histórico, enquanto o Hang Seng China Enterprises recuou 3,5%, acumulando uma desvalorização de 9% no mês. O índice mais amplo Hang Seng cedeu 3,4%, enquanto o CSI 300, de ações listadas nas bolsas de Xangai e Shenzhen, caiu 1,1%.
O setor imobiliário, mergulhado em uma crise há três anos, continuou sofrendo em 2023, segundo mostram estatísticas oficiais. Os investimentos em desenvolvimento imobiliário caíram 9,6% em 2023, comparado ao ano anterior, enquanto os preços das novas moradias recuaram 0,4% em dezembro em relação a novembro, maior queda desde fevereiro de 2015.
A população da China caiu para 1,4 bilhão em 2023, com 11 milhões de mortes superando os 9 milhões de nascimentos. Demógrafos preveem novas quedas, uma vez que a população vem envelhecendo rapidamente. O número de mortes em 2023 foi de quase 600 mil, mais do que em 2022, superando o aumento de mais de 200 mil entre 2021 e 2022.
“É muito provável que o rápido aumento do número de mortes venha do fim caótico da política de covid zero, que levou a muitas mortes adicionais”, diz Wang da Universidade da Califórnia.
A população, que caiu pela primeira vez em 60 anos em 2022, é o resultado de uma política dos anos 1980 que restringia a maioria dos casais a terem apenas um filho, número bem abaixo da média de 2,1 necessária para manter o nível populacional. A taxa nacional de mortalidade foi de 7,87 por 1.000 habitantes em 2023, a maior desde o começo dos anos 1970 e acima do número do ano anterior, de 7,37.
O premiê da China, Li Qiang, antecipou na terça-feira a divulgação oficial dos dados, anunciando o número do crescimento do PIB no Fórum Econômico Mundial em Davos. Li elogiou o foco das autoridades no “fortalecimento dos motores internos”, em vez de desencadear grandes estímulos, aos quais alguns especialistas apelaram para a retomada do crescimento.
Economistas disseram que o crescimento anual chinês provavelmente foi diminuído em até 2 pontos percentuais em razão de uma comparação com o crescimento baixo durante a pandemia, e sugeriram que Pequim terá de fazer mais neste ano para estabilizar o mercado imobiliário e aumentar o consumo para anular a pressão deflacionária.
O PIB do quarto trimestre foi 1% superior ao do terceiro trimestre e seu crescimento foi de 5,2% em relação ao mesmo período do ano anterior, ficando por pouco abaixo das expectativas dos analistas, de 5,3%. A taxa de crescimento trimestre sobre trimestre foi menor que o 1,5% registrado no terceiro trimestre, revista para cima.
Julian Evans-Pritchard, chefe de economia da China da Capital Economics, disse que isso não parece consistente com as indicações de que a economia se fortaleceu no quarto trimestre, depois de fontes de dados alternativas terem apontado para uma contração no terceiro trimestre.
“Vimos no passado que durante as recessões, frequentemente o dado oficial do PIB não reflete totalmente a extensão da fraqueza e depois eles compensam isso mais adiante, ao não mostraram também totalmente a extensão da recuperação”, disse ele. “Então, suspeito que estamos vendo algo parecido no momento.”
Os investimentos em ativos fixos, excluindo habitações rurais, aumentaram 3% em 2023 em relação a 2022, com os investimentos em infraestrutura crescendo 5,9% e os industriais 6,5%. Os investimentos privados caíram 0,4%, segundo a Agência Nacional de Estatísticas da China.
As vendas no varejo, um indicador do consumo, aumentaram 7,4% em dezembro, sobre o mesmo período de 2022, comparado aos 8% previstos pelos analistas, enquanto a produção industrial cresceu 6,8%, acima das expectativas de 6,6%.
Os principais líderes da China disseram que a economia está no caminho certo e “nenhuma medida de estímulo apressada é necessária”, disse Eswar Prasad, pesquisador sênior do centro de estudos Brookings Institution.
Mas os dados revelaram uma economia que registra “na melhor das hipóteses um crescimento baixo caraterizado pela demanda interna fraca e pressões deflacionárias persistentes”, acrescentou ele. “Parece prematuro dizer que a economia está fora de perigo.”
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— Foto: AP Photo/Andy Wong
Fonte: Valor Econômico
