Por Andrew Edgecliffe-Johnson, Valor — Financial Times
17/09/2023 14h20 Atualizado há 33 minutos
Na semana passada, antes de Howard Schultz se aposentar do conselho da Starbucks, ele lamentou em entrevista que os partidos Democrata e Republicano haviam sido, ambos, “sequestrados pelos extremos”.
O magnata do café, que desistiu de uma candidatura independente à Casa Branca em 2019, já havia destacado a capacidade das empresas de unir um país dividido em várias ocasiões. No entanto, à medida que os EUA se preparam para outra eleição, o coro de executivos preocupados com o extremismo vem se tornando mais numeroso.
Antes, as empresas se consideravam “um empreendimento bipartidário”, que conseguia encontrar moderados em ambos os lados, disse recentemente Andrew Liveris, ex-executivo-chefe da Dow, enquanto promovia seu novo livro, “Leading through Disruption” (na tradução livre, “liderando por meio da desestabilização”). De acordo com Liveris, à medida que polarização se intensificou, as empresas “permaneceram no meio”. “Mas elas não encontram praticamente ninguém para conversar”, acrescentou.
A desestabilização que agora preocupa os executivos-chefes, ou CEOs, é diferente dos receios que costumavam ter em eleições anteriores, sobre impostos ou comércio exterior. Um número cada vez maior de executivos está preocupado com a intolerância e retóricas nocivas que dividem seus funcionários, inflamam o consumidor e colocam até a segurança em seus locais de trabalho em risco.
Neste verão americano, o assédio a funcionários da Target e as ameaças a instalações da AB InBev em razão de promoções relacionadas a temas LGBTQ+ intensificaram a apreensão. As divisões entre eleitores de Donald Trump e de Joe Biden estão “levando a todo tipo de conflitos no local de trabalho”, diz Johnny Taylor Jr., executivo-chefe da associação de profissionais de recursos humanos Society for Human Resource Management. Seus membros têm relatado “uma preocupação real” sobre como os apoiadores de Donald Trump reagirão aos julgamentos dele na Justiça, diz.
Quanto à possibilidade de tensão no período que antecede as eleições presidenciais de novembro de 2024, Taylor Jr. disse não acreditar “que demorará 14 meses”. “Acho que já estamos começando a sentir isso palpavelmente. Já há uma inquietação.”
Em vez de ficar apenas na preocupação com o extremismo, alguns executivos concluíram que cabe a eles trazer o discurso de volta ao centro — ou pelo menos ao que eles definem como centro.
A organização de Taylor está lançando uma iniciativa de “civilidade no local de trabalho”, retratando diferenças políticas como uma questão de diversidade. Nas esferas estaduais, grupos como o Idaho Leaders United vêm fazendo algo semelhante, mobilizando líderes empresariais para rejeitar o fanatismo e a violência política.
Empresas não têm como prosperar sem comunidades seguras e inclusivas para onde pessoas talentosas queiram se mudar, explica Tommy Ahlquist, executivo-chefe de uma incorporadora imobiliária e um dos fundadores do grupo de Idaho. “O mundo de hoje está forçando mais pessoas a dizer que, se não defendem algo, então não defendem nada”, disse, após ter testemunhado ataques on-line contra líderes locais e, em um caso, “multidões” do lado de fora da casa de um deles.
Ahlquist, um republicano que concorreu ao cargo de governador em 2018, chegou a pensar que um executivo-chefe poderia enfrentar esses problemas entrando na política. Ele conta ter percebido, contudo, que se tratava de “um mundo diferente”.
Liveris acredita que não se trata de “wokismo” [o movimento pelo “despertar” da consciência racial e social] quando líderes empresariais se inserem na política a partir de seus trabalho profissional. “Você precisa ajudar o pêndulo a achar o centro”, diz. “Essa é a função das empresas”.
A noção de “responsabilidade política empresarial” já preocupa pessoas de diversas convicções políticas, que nutrem desconfiança em relação ao poder das empresas e questionam por que executivos não eleitos deveriam influenciar o processo eleitoral. Há vários motivos para pensar que haverá oposição mesmo contra os esforços em prol de um debate mais consensual, simplesmente por ser uma iniciativa de executivos-chefes. Se as iniciativas de civilidade no local de trabalho conseguirão reverter a longa tendência de polarização dos EUA é uma questão em aberto.
Ainda assim, líderes empresariais americanos parecem cada vez mais convencidos de que precisam tentar algo, e a preocupação deles só aumenta. As eleições nos EUA tendem a “aumentar a temperatura”, observa Ahlquist. “Acredito que os tempos mais desafiadores para nós ainda estão por vir”, diz.
Fonte: FT / Valor Econômico

