Os investidores temem que a tolerância de Donald Trump a uma queda acentuada das ações seja maior desta vez do que em seu primeiro mandato, à medida em que perdem a confiança de que os mercados financeiros sejam capazes de conter as tarifas e as medidas de corte de gastos do presidente dos Estados Unidos.
As bolsas americanas caíram nos últimos dias, com o índice S&P 500 recuando mais de 8% em relação ao pico atingido há menos de três semanas, com as tarifas impostas por Trump despertando temores em relação à trajetória da maior economia do mundo.
Muitos investidores e bancos de Wall Street apostaram que Trump acabaria recuando em suas ameaças tarifárias mais duras e cortes no governo federal se os mercados respondessem violentamente, mas as esperanças na chamada “Trump put” — algo como “opção de venda Trump” — diminuíram com o estremecimento dos mercados.
“Os mercados estão questionando a noção de que o governo Trump adaptaria suas políticas em resposta à volatilidade das ações ou preocupações com o crescimento econômico”, disse o UBS a clientes na noite de segunda-feira.
Alex Kosoglyadov, um diretor-gerente de derivativos de ações globais da corretora Nomura, disse no fim de fevereiro que “as pessoas estavam se perguntando se Trump tiraria o pé do acelerador nas tarifas e em alguns dos cortes nos gastos federais que estavam assustando os mercados”.
“Nos últimos dias de negociações, o sentimento mudou, pois surgiram sinais claros de que a suposta opção de venda [put] Trump não existe ou está mais baixa do que as pessoas imaginavam”, disse Kosoglyadov.
O crescente sentimento de pessimismo não está limitado ao mercado de ações. O Goldman Sachs e o Morgan Stanley reduziram suas expectativas de crescimento econômico para os Estados Unidos devido às preocupações com as tarifas e as retaliações de parceiros comerciais. Na segunda-feira, a Delta Air Lines também alertou que a “incerteza” econômica vem afetando seus negócios, o que levou a companhia aérea a reduzir muito suas perspectivas de receita e lucros para o primeiro trimestre.
O índice VIX, uma medida da volatilidade esperada nas ações dos Estados Unidos, disparou de 12 para 28 pontos, acima de sua média de longo prazo de 20 pontos. O Nasdaq Composto, que subiu nos dois anos anteriores, acumula queda de mais de 13% desde o patamar recorde de alta alcançado na metade de dezembro.
No primeiro mandato de Trump, a turbulência no mercado financeiro foi amplamente vista como uma barreira crucial para forçá-lo a mudar o rumo de políticas que passaram a ser vistas pelos investidores como danosas ao crescimento dos Estados Unidos, pelo menos no curto prazo.
“Todos pensaram que a única maneira de ele recuar seria os mercados de ações despencarem”, diz um operador de um banco de Wall Street. “O que as pessoas não viram foi que ele mudaria sua narrativa se o mercado de ações despencasse.”
A Casa Branca reforçou sua postura de descaso em relação às turbulências no mercado financeiro após a forte queda das ações na segunda-feira. “Estamos vendo uma forte divergência entre o otimismo do mercado de ações e o que de fato está acontecendo nas empresas e entre os líderes empresariais. E, obviamente, este último é muito mais relevante para o que se espera para a economia no médio e longo prazo”, disse uma autoridade da Casa Branca.
Como as ações dos Estados Unidos caíram acentuadamente em resposta à ameaça de tarifas contra seus parceiros comerciais, Trump fez uma grande reviravolta, adiando a maioria das tarifas contra o Canadá e o México até abril, mas ainda manteve as tarifas sobre a China em vigor.
Nesta terça, o presidente dos Estados Unidos anunciou uma tarifa adicional de 25% sobre as importações de aço e alumínio do Canadá, que entraria em vigor nesta quarta. No fim do dia, a Casa Branca informou que a medida se aplica às importações de aço e alumínio de todos os parceiros comerciais dos Estados Unidos.
As bolsas americanas estenderam suas quedas nesta terça. O S&P 500 caiu 0,76%, o Nasdaq cedeu 0,18% e o S&P 500 encerrou o dia com desvalorização de 1,14%.
A Casa Branca voltou a minimizar as preocupações com a turbulência nos mercados, afirmando que os Estados Unidos estão passando por uma “transição econômica”. “Quando se trata do mercado de ações, os números que estamos vendo hoje, os números que vimos [na segunda-feira]… são apenas um retrato de um momento específico”, disse a porta-voz da Casa Branca, Karoline Leavitt. “Estamos em um período de transição econômica”, acrescentou ela.
O tom constante dos principais assessores de Trump tem sido minimizar os temores com a instabilidade do mercado de ações. O secretário do Tesouro, Scott Bessent, alimentou as preocupações dos investidores no fim de semana, quando deu a entender que Trump não recuará em suas políticas econômicas mesmo que o mercado continue caindo.
“Não há put”, disse ele. “A aposta de Trump para o lado positivo é que, se tivermos boas políticas, os mercados vão subir.” Bessent também disse que a economia dos Estados Unidos poderá precisar de “um período de desintoxicação” para ser menos dependente dos gastos do governo. “Haverá um ajuste natural à medida que formos nos afastando dos gastos públicos para os gastos privados”, disse ele. “O mercado e a economia acabaram ficando viciados. Nos tornamos dependentes dos gastos públicos e haverá um período de desintoxicação.”
Para Trump, “o tempo é a única limitação”, disse Barry Bannister, estrategista-chefe do banco americano Stifel. “O primeiro ano de qualquer novo governo é o momento de quebrar alguns ovos para fazer uma omelete, e as ambições do governo Trump são uma reforma ampla da ordem econômica”, afirmou.
Mas o risco de o crescimento econômico esfriar e a inflação aumentar — situação conhecida como estagflação — cresce à medida que Trump prossegue com a imposição de tarifas aos maiores parceiros comerciais dos Estados Unidos, acrescentou ele. Isso deixa as ações americanas expostas a um “movimento de pinça” entre a possível desaceleração nos lucros por ação e a redução nas relações preço/lucro (P/L).
“Trump terá coragem de suportar um sofrimento considerável? Essa é uma questão em aberto”, diz Shep Perkins, diretor de investimentos da Putnam Invesments.

Fonte: Valor Econômico

