Por Anaïs Fernandes e Álvaro Fagundes — De São Paulo
15/05/2023 05h00 Atualizado há 4 horas
O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil no terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) deve registrar o 25º pior crescimento acumulado entre mais de 190 países para os quais o Fundo Monetário Nacional (FMI) faz projeções. Apesar disso, em valores nominais, o Brasil deve voltar ao “top 10” das maiores economias do mundo.
Entre 2023 e 2026, a atividade brasileira deve crescer 6,45%, de acordo com as mais recentes estimativas do Fundo, abaixo da média do mundo (13%), da América Latina (9%) e dos emergentes como um todo (17%). E, apesar de o número ser maior do que o 5,73% observado na gestão imediatamente anterior, no governo de Jair Bolsonaro (PL) o Brasil teve o 81º pior resultado. Quanto mais para baixo no ranking, maior o crescimento do país ante seus pares.
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Desde a vigência do Plano Real, o crescimento relativo previsto para o governo Lula 3 só não deve ser pior do que o observado entre 2015 e 2018 (12º pior). O período combina o segundo mandato de Dilma Rousseff e o mandato-tampão de Michel Temer, com uma recessão no meio.
No segundo mandato de Lula (2007 a 2010), o país chegou a ficar na metade superior, dos países que mais crescem, com o 64º melhor desempenho. Na época, também alcançou a posição de 7ª maior economia do mundo, em termos nominais. No governo Dilma/Temer, caiu para a 9ª colocação, saiu do “top 10” com Bolsonaro (11ª) e agora, pelas projeções do FMI, deve voltar a ser a 8ª economia global em 2026, mesma posição que ocupava em 1998, ao fim do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso.
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“O Brasil vai enfrentar um panorama bastante desafiador”, afirma Jaime Valdivia, economista-chefe internacional da Galapagos Capital. Para ele, é difícil acreditar que o país terá amplas fontes de demanda para sustentar um crescimento muito acima de 1%. “Entre 1% e 2% é uma margem razoável”, diz.
O crescimento do Brasil deve ser fraco por várias razões, segundo ele. Primeiro, porque o desempenho mundial também será frágil. “Países desenvolvidos e muitos parceiros comerciais do Brasil têm economias rodando a taxas baixas”, afirma Valdivia.
Além disso, diz, as taxas de juros globais estão em patamares elevados se comparados aos últimos quatro a cinco anos. “Desde 2008, tínhamos juros perto de zero nos Estados Unidos e em áreas relevantes como a União Europeia. Agora, o mundo desenvolvido é um lugar em que será preciso buscar um equilíbrio das economias”, afirma.
Ao mesmo tempo, aponta, a pandemia desencadeou uma preocupação maior dos governos com temas sociais, alimentando um processo de expansão fiscal agressivo. “Temos um mundo com condições globais muito mais difíceis e, por outro lado, a necessidade de restabelecer equilíbrios.”
Apesar da perspectiva de um crescimento mais fraco, a demanda chinesa deve ser suficientemente forte para continuar dando impulso às exportações brasileiras, segundo Valdivia. As fontes internas de crescimento, no entanto, são menos claras. A agropecuária deve manter sua relevância, assim como a mineração, diz. “Mas temos ainda as discussões do arcabouço fiscal e da reforma tributária. É muito difícil crescer com uma carga tão excessiva.”
Programas bem-sucedidos de governos do PT, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida, devem ser mantidos, “mas dentro das restrições orçamentárias de um país como o Brasil”, diz Valdivia. “O Brasil tem um nível de dívida elevado, se comparado aos pares. Por isso é importante aprovar um arcabouço que, nos próximos anos, estabilize a dívida”, afirma.
Mesmo que haja um ciclo de crescimento cíclico do Brasil próximo de 3% ao ano, em média, nos próximos anos, o país “não está ganhando terreno”, diz Marcos Casarin, economista-chefe para América Latina da Oxford Economics.
Casarin relaciona o PIB per capita do Brasil ao de um grupo de países avançados, como Estados Unidos, Japão e Reino Unido (ver gráfico acima). É uma forma de evitar “exagerar” o PIB brasileiro por causa do elevado contingente populacional. Quando o número dessa relação aumenta, significa que o PIB per capita do Brasil está crescendo mais rápido que o dos países avançados; quando cai, o Brasil está empobrecendo em relação a essas economias.
“Lula promoveu um enriquecimento do Brasil sem precedentes durante seu primeiro mandato”, diz Casarin. Se antes o país precisava de cerca de quatro brasileiros médios para fazer uma unidade de produto de um trabalhador de economias avançadas, no governo do petista, passou a necessitar de apenas três, observa.
Por trás desse “catch up” (convergência) está, na avaliação de Casarin, o setor externo. Os termos de troca (relação entre preços de exportação e importação) no Brasil melhoraram muito, lembra. “O boom de commodities foi realmente importante.”
Após atingir um pico em 2014, essa relação do PIB per capita do Brasil com economias avançadas passou por uma “queda vertiginosa”, nota Casarin, só se estabilizando por volta de 2019. E, apesar de um ciclo forte de commodities mais recentemente, entre 2020 e 2022, a “convergência” da economia brasileira foi bem mais moderada, afirma.
Para os próximos quatro anos, Casarin diz esperar uma “onda de crescimento cíclico” para o Brasil, com um PIB anual médio no período ao redor de 2,5%. Na sua avaliação, isso será reflexo de mudanças nas fontes de demanda da economia doméstica.
“O setor externo não necessariamente vai ser o grande motor do crescimento do Brasil nos próximos anos. E vejo pouca mudança no lado da oferta doméstica. Mas teremos o setor público como grande contratante e uma política de salários muito mais generosa. Tem o lado da renda aumentando mais, e os setores público e privado devem se beneficiar”, afirma.
Esse seria, no entanto, um crescimento também mais inflacionário, segundo Casarin. “Em vez de cair para 3%, a inflação se estabiliza perto de 4%”, aponta. Isso, por sua vez, muda o patamar dos juros. “Sem dúvida, o equilíbrio macroeconômico fica pior”, afirma, acrescentando que um juro real mais alto “fecha a porta” para investimentos de longo prazo.
Ernesto Revilla, economista-chefe do Citi para América Latina, diz ver, mais ou menos em igual medida, explicações externas e internas para o crescimento do Brasil nos próximos quatro anos, como a recuperação da economia global e da demanda doméstica.
Esse é, no entanto, exatamente o desafio do país, aponta: “Para melhorar o crescimento, precisa de sorte com as condições externas, mas também precisa de habilidade para trazer boas políticas para a economia doméstica.”
O Citi projeta um crescimento médio de 1,5% ao ano para o Brasil até 2026. “É um crescimento relativamente baixo para o Brasil e para os desafios que o país tem”, afirma Revilla. Assim como em outros países da América Latina, observa, há ainda, no Brasil, um problema de crescimento potencial baixo.
“A demografia não vai ajudar o mercado de trabalho a crescer, não temos capacidade de poupança suficiente para investir. Ainda que haja uma melhora cíclica, será transitório, porque estruturalmente não dá para crescer tanto”, resume Casarin.
Fonte: Valor Econômico

