Por Eduardo Magossi e André Mizutani — De São Paulo
07/04/2022 05h03 Atualizado 07/04/2022
A ata da última reunião do Federal Reserve (Fed) reforçou que o combate à inflação é a prioridade do BC dos EUA, com vários de seus integrantes já tendo defendido uma alta dos juros de 0,5 ponto percentual em março – quando a taxa referencial subiu só 0,25 ponto devido às incertezas geradas pela guerra na Ucrânia. Além de sinalizar que a alta dos juros na próxima reunião deve ser de 0,50 ponto, o documento, divulgado ontem, mostrou a disposição do Fed de iniciar a redução de sua participação no mercado de títulos públicos. Ou seja, o BC avisou que vai acelerar a retirada dos estímulos à economia tomados para combater os efeitos da pandemia de covid-19.
O documento concentrou as atenções dos investidores ontem. Como resultado, os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA de dez anos subiram de 2,54% para 2,61%, atingindo o maior nível desde fevereiro de 2019. Em Wall Street, o índice tecnológico Nasdaq foi o mais afetado, com queda de 2,22%. O S&P 500 recuou 0,97%, e o Dow Jones, 0,42%.
Em relação ao processo de diminuição do balanço patrimonial, que deve atingir o nível de US$ 95 bilhões mensais, a ata indicou que “nas discussões, todos os participantes [do comitê do Fed] concordaram que a inflação elevada e as condições apertadas do mercado de trabalho justificavam o começo da redução do balanço em uma reunião futura com um ritmo mais rápido de redução das posições do que no período entre 2017 e 2019”, indicando que tal processo deve começar em maio.
De acordo com o documento, “os participantes concordaram que limites de cerca de US$ 60 bilhões para a redução de Treasuries e de US$ 35 bilhões para os títulos hipotecários provavelmente seriam apropriados”. Eles disseram ainda que as reduções do balanço poderiam ser introduzidas gradualmente ao longo de um período de três meses ou mais, de acordo com as condições do mercado.
Para Bernardo Dutra, economista de EUA do Itaú BBA, a ata aponta para três altas seguidas de 0,50 ponto percentual na taxa básica americana (que hoje está em uma faixa entre 0,25% e 0,50%). Dutra destaca que a ata mostra que, começando em maio, o Fed pretende alcançar uma redução mensal de US$ 95 bilhões em três meses, uma retração muito mais rápida que a registrada no período de 2017-19, quando chegou ao limite de redução de US$ 50 bilhões só no final do ciclo de retração do balanço.
“A ata mostrou que o Fed está ‘hawkish’ [inclinado à retirada de estímulos] e empenhado no processo de aperto monetário mais acelerado para controlar a inflação que segue bastante elevada”, disse. Por isso, o Itaú BBA trabalha com uma taxa final de juro entre 3,75% e 4%, a ser atingida em setembro de 2023, já em um território restritivo, acima da taxa “neutra” (aquela que não contrai nem estimula a economia).
Na opinião de Andrew Hollenhorst, economista-chefe para os EUA do Citi, o Fed vai precisar reduzir a demanda nos mercados imobiliário e de trabalho se quiser derrubar a inflação, e para isso vai precisar levar os juros para uma zona restritiva. Segundo ele, o Fed deverá realizar altas de 0,50 ponto percentual em cada uma das próximas quatro reuniões.
Para o economista do Citi, a única maneira de trazer a inflação de volta à meta de 2% pode ser uma política monetária tão restritiva a ponto de causar uma recessão. Porém, no curto prazo, o expressivo gasto dos consumidores e as expectativas das empresas tornam improvável uma recessão. O Citi espera que a taxa atinja o nível entre 2,75% e 3% no fim de 2022 e 3,5% a 3,75% em 2023, acima do juro considerado neutro pelo Fed, de 2,5%.
Em relação às condições econômicas, os integrantes do Fed, segundo a ata, viram melhoras nas condições do mercado de trabalho em janeiro e fevereiro, o que alimentou a pressão inflacionária. A guerra na Ucrânia também foi vista como um evento que eleva as incertezas em torno da atividade econômica e da inflação, dado que o conflito traz o risco de exacerbar ainda mais os problemas com a cadeia global de abastecimento e de impulsionar os preços de energia, alimentos e outras commodities.
“Com relação aos riscos impostos pelo conflito na Ucrânia, a visão dominante no comitê é a de que os impactos altistas para a inflação deverão dominar os riscos sobre o crescimento econômico, uma vez que a economia americana possui poucos vínculos comerciais e financeiros com a região”, diz Marcelo Fonseca, economista-chefe do Opportunity Total. “A ata reforçou nossa convicção de que o Fed deverá caminhar para uma sequência de altas de 0,50 ponto a partir de maio, e que os juros deverão atingir ao menos 3,5% ao fim do ciclo, com os riscos certamente para cima.”
Para o economista do Goldman Sachs David Mirachel, os planos do Fed de redução do balanço patrimonial estão consistentes com a expectativa do banco. “Eu estimo que o Fed vai reduzir seu balanço patrimonial entre US$ 2,5 trilhões a US$ 3 trilhões em um período de dois anos e meio”, disse. “Estimamos duas altas de 0,50 ponto percentual, em maio e junho, seguido por mais altas de 0,25 ponto nas demais quatro reuniões de 2022. O Fed deverá elevar mais três vezes o juro 2023 e chegar em uma taxa terminal de 3% a 3,25%”, disse.
Fonte: Valor Econômico

