Por Gabriel Roca, Igor Sodré e Felipe Saturnino — De São Paulo
07/04/2022 05h03 Atualizado 07/04/2022
Os ativos do mercado local tiveram uma sessão turbulenta ontem, um dia em que os investidores já começaram com a expectativa de qual seria o tom da ata da última reunião de política monetária do Federal Reserve (Fed). O documento, divulgado à tarde, confirmou o receio de um aperto monetário mais célere e intenso por parte do BC americano, e puxou os juros brasileiros. Nesse ambiente de menor disposição à tomada de risco, o dólar teve alta firme, fechando acima dos R$ 4,70 e o Ibovespa marcou seu terceiro pregão de queda.
Assim, a moeda americana voltou a se fortalecer e encerrou a sessão em alta de 1,20%, negociada a R$ 4,7159 no mercado à vista.
“A ata do Fed confirmou comunicação ‘hawkish’ [inclinada à retirada de estímulos] dos últimos dias e isso fez o dólar se fortalecer no mundo, inclusive aqui”, disse Flavio Serrano, economista-chefe da Greenbay Investimentos. Ele vê como “bem provável” dois ou três aumentos de 0,5 ponto percentual nas taxas de juros americanas nas próximas reuniões. “Depois, tudo vai depender da evolução do cenário. Devem começar a reduzir o balanço no curto prazo, mas o ritmo ainda não está definido”, diz.
Para o analista de renda fixa e derivativos da corretora Mirae, Paulo Nepomuceno, a dinâmica no mercado de renda fixa observada ontem foi produto de distintos vetores, dentre os quais a taxa do título de dez anos do Tesouro americano, que avançou acima da faixa de 2,6%, em seus maiores níveis em três anos. “E o IGP-DI não veio bem, o que compromete a inflação corrente”, observou o profissional.
Ao fim da sessão, a taxa do contrato futuro de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 aumentou de 11,33% para 11,425% e a do DI para janeiro de 2027 escalou de 11,085% para 11,175%.
O dia ruim para os ativos brasileiros também foi refletido no mercado de renda variável, fazendo o Ibovespa terminar a sessão aos 118.227 pontos, em desvalorização de 0,55%. No momento de maior estresse durante o pregão, minutos após o Fed divulgar a ata, a referência chegou a recuar 1,76%, marcando 116.791 pontos.
A ponta negativa do Ibovespa voltou a ser dominada por bancos digitais e empresas com elevadas expectativas de crescimento de lucros, temas que exibem elevada sensibilidade às taxas de juros. As units do Banco Inter caíram 8,70%, Méliuz recuou 8,33%, Locaweb perdeu 8,03% e Banco Pan cedeu 7,08%. No varejo, Petz fechou em baixa de 4,93%, Via caiu 4,47% e Magazine Luiza recuou 4,20%.
De acordo com o Goldman Sachs, os fundamentos da economia local não permitem um otimismo mais amplo com a continuidade do rali das ações brasileiras – que, em dólares, acumulam ganhos próximos a 37% em 2022. “Olhando para a história, e isso coincide com outros emergentes, como a África do Sul e Chile, os ‘bull markets’ são caracterizados por três tendências: taxas de crescimento acelerando; taxas de juros em queda; e mercados globais favoráveis”, afirma o banco em relatório.
“Prevemos um crescimento fraco do PIB em 2022, de apenas 0,6%, com um aumento modesto para 1,4% em 2023, e suspeitamos que a inflação permaneça acima de 6% até o primeiro trimestre de 2023; embora um ciclo mais maduro de alta de juros signifique que o mercado deve passar a precificar cortes, à medida que os sinais de inflação diminuem”, diz o Goldman.
Outro argumento bastante utilizado pelos que acreditam na continuidade da valorização das ações brasileiras é o expressivo fluxo de capital estrangeiro que tem sido direcionado para o mercado local. “Os dados de alocação fornecem um sinal mais modesto para os fluxos de entrada e sugerem que o ‘ciclo de ingressos’ já está concluído em dois terços. Outros US$ 13 bilhões de capital estrangeiro podem levar o Ibovespa para a faixa dos 131 mil pontos em um período de seis meses, embora suspeitemos que o desfecho provável seja nossa meta de 118 mil pontos em 12 meses, impulsionada por fundamentos”, aponta o relatório do banco americano.
Fonte: Valor Econômico
