CORRESPONDENTE EM NOVA YORK – O Federal Reserve (Fed, o banco central americano) cortou os juros pela terceira vez consecutiva, mas sinalizou que pode entrar em compasso de espera, diante de divergências internas sobre se o principal risco para a maior economia do mundo é o mercado de trabalho ou a inflação. Em Wall Street, os sinais vindos de Washington, nesta quarta-feira, 10, soaram como “hawkish” (duros), reforçando as apostas de manutenção das taxas na primeira reunião de 2026, marcada para janeiro.
O Fed cortou os juros em 25 pontos-base (0,25 ponto porcentual), empurrando os Fed Funds para o intervalo de 3,50% e 3,75% ao ano, conforme amplamente esperado pelo mercado. Com a terceira queda seguida, as taxas americanas caíram ao menor nível desde setembro de 2022.
O presidente do Fed, Jerome Powell, minimizou as divergências internas Foto: Jacquelyn Martin/AP
O movimento foi acompanhado da maior divergência no Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) em seis anos. Dos 12 membros, nove votaram à favor de um novo corte de juros de 25 pontos-base e três discordaram.
O presidente da distrital de Kansas City, Jeffrey Schmid, e o presidente da distrital de Chicago, Austan Goolsbee, defenderam a manutenção dos juros, enquanto o diretor Stephen Miran queria um corte maior, de 50 pontos-base (0,5 ponto porcentual).
Ao falar a jornalistas, nesta tarde, o presidente do Fed, Jerome Powell, minimizou as divergências internas. Segundo ele, as discussões no Fomc estão em visões de qual é o maior risco para a economia americana, mas são “respeitosas” e com algum consenso.
Ele considerou os nove votos a favor de um novo corte de 25 pontos-base como um “amplo apoio”, mas ponderou que, diante de riscos vindos da inflação e do mercado de trabalho nos EUA, as divergências são inerentes à atual situação econômica.
“É muito incomum ter uma tensão persistente entre os dois lados do mandato; e, quando isso acontece, é isso que você vê”, disse Powell, referindo-se às divergências de opiniões entre os dirigentes do Fed.
Apenas um corte esperado para 2026
Quanto a 2026, a maioria dos dirigentes espera apenas um corte de juros. Assim, o Fed manteve o cenário traçado em setembro, conforme anteciparam casas como o Goldman Sachs. Por sua vez, bancos como o holandês ING e o alemão Deutsche Bank mantiveram a expectativa de duas reduções de juros em 2026. O Fed pularia janeiro, cortaria em março e junho, na visão de ambos.
O racional por trás é de que o Fed não precisa cortar mais os juros neste momento porque a economia segue crescendo, o desemprego nos EUA está em baixa, a inflação continua mais próxima dos 3% do que da meta de 2% ao ano, e as ações figuram nos patamares máximos. Mas isso deve mudar à frente, na visão de alguns economistas, forçando o BC americano a retomar o ciclo de flexibilização monetária no país.
“Suspeitamos de que o cenário de inflação se tornará mais propício para cortes de taxas de juros nos próximos meses, dando assim aos ‘dovish’ (mais favoráveis a baixar os juros) a justificativa para mais cortes”, diz o economista-chefe internacional do ING para os EUA, James Knightley.
Para o economista para os EUA do Berenberg, Atakan Bakiskan, o corte de dezembro foi o último na gestão de Powell. Depois da decisão desta quarta-feira, o mercado aumentou as apostas quanto a uma pausa nos juros em janeiro, de 70,3% para 77,9%, conforme levantamento da plataforma americana CME Group.
Questionado sobre se o Fed estaria em pausa a partir de agora, Powell respondeu: “Sim”. “Os ajustes desde setembro colocam nossa política dentro de um amplo intervalo de estimativas de neutralidade e estamos bem posicionados para determinar a extensão e o momento de ajustes adicionais com base nos dados recebidos, nas perspectivas em evolução e no equilíbrio dos riscos”, afirmou.
De acordo com o presidente do Fed, os membros do Fomc não debateram a decisão de janeiro e a política monetária americana não segue um caminho predeterminado. “Vamos receber uma grande quantidade de dados entre agora e a reunião de janeiro, e os dados que recebermos vão influenciar nosso pensamento”, afirmou.
O Bradesco manteve a expectativa de mais um corte em janeiro, seguido por uma pausa. Na visão do banco brasileiro, o Fed só retomará o ciclo de flexibilização monetária nos EUA ao obter maior visibilidade sobre a economia após o fim do shutdown no país, fora os efeitos atrasados do corte de juros. “O ciclo deve ser retomado posteriormente, com taxa terminal convergindo para cerca de 3% em 2026”, preveem os economistas do banco.
Cada um no seu quadrado
Quanto ao processo de substituição no comando do Fed, Powell disse ainda que o fato de o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, falar abertamente sobre o futuro presidente da autoridade não afeta seu trabalho ou muda seu pensamento. “Estou focado no meu tempo restante como presidente”, afirmou, acrescentando que não tem tempo para pensar em “coisas maiores”.
O chefe da Casa Branca voltou a criticar Powell e afirmou que pode anunciar seu substituto já na semana que vem ou em 15 dias. Ao menos até aqui, o conselheiro econômico da Casa Branca, Kevin Hassett, é considerado o favorito na corrida para a presidência do Fed. Trump realiza uma bateria final de entrevistas e se encontraria com o ex-membro do Fed Kevin Warsh nesta quarta-feira.
Fonte: Estadão

