Por Eduardo Magossi — De São Paulo
11/01/2024 05h02 · Atualizado
A desaceleração mais acentuada da economia europeia deve levar o Banco Central Europeu (BCE) a iniciar o afrouxamento monetário na zona do euro antes que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano), na avaliação de Andrew Reider, e Fernando Fenólio, respectivamente CIO e economistachefe da WHG.
Segundo eles, embora os mercados estejam precificando que o Fed corte os juros em março, é mais provável vejam o BCE reduzir as taxas nesse mês. “Na Europa, vários indicadores mostram uma desaceleração mais acentuada e o BCE vai ter que compensar. Já nos EUA, embora a inflação esteja caindo, a atividade não está esfriando suficientemente para um corte antecipado nos juros. Acredito que um corte nos Estados Unidos seria mais razoável em maio ou junho”, afirma Fenólio. Na avaliação do economista, um início mais tardio pelo Fed, por sua vez, deverá afetar o ritmo dos afrouxamento monetário no Brasil.
Para Reiner, com a perspectiva de redução dos juros, o mercado europeu ficará mais atraente em 2024, ainda que a região possa entrar numa recessão técnica. “Mas recessão não é necessariamente uma crise. A sensação de crise ocorre quando o mercado de trabalho piora muito e não é o caso neste momento, apesar do crescimento bem baixo.”
A expectativa dos economistas é que o BCE reduza os juros neste de 4% para 2% ao ano.
“Para os EUA, nossa projeção é de um ‘soft landing’ [pouso suave] porque não tem nenhum grande desequilíbrio na economia. Nem as famílias nem as empresas estão endividadas. Não tem nenhum grande ajuste a ser feito, além do fiscal, e este não será feito mesmo”, afirma Reider.
Segundo ele, os EUA têm muitas defasagens, uma questão fiscal difícil e, em ano de eleição americana, é improvável reduzir a dívida pública. “O período de normalização [monetária] vai durar um pouco mais, o que pode ter impacto no Brasil, que é muito sensível ao nível de juros americanos.”
Fenólio lembra que, em países como Brasil e EUA, os juros subiram muito, mas o efeito total não foi tão sentido por conta da política fiscal expansionista, ancorada no aumento da dívida. “Agora, olhando para frente, o fiscal no Brasil não vai ser muito agressivo e pode ser negativo. Para cortar mais os juros, o Brasil ficará muito dependente do afrouxamento do Fed para não elevar muito o spread entre as duas taxas e impactar o câmbio”, diz.
O Banco Central começou a reduzir a Selic no ano passado e, desde então, a taxa caiu de 13,75% para 11,75% ao ano. Segundo Reiner, porém, o corte feito até agora “não é nada revolucionário, o juro está alto e é cumulativo. Ele lembra que esse patamar ainda pesa sobre a economia, especialmente para as companhias mais endividadas. “Podemos entrar em espiral não muito boa, principalmente se o governo implementar medidas populistas”, afirma.
Na avaliação de Reiner, o Brasil pode não ser um bom lugar para investir em 2024. O diferencial de juros em relação aos Estados Unidos, diz ele, deveria ser pelo menos 4 pontos percentuais. “Se o Fed reduzir os juros a até 4,5% neste ano, a Selic poderá chegar a algo entre 8,5% e 9% [no fim do ciclo], se considerarmos um pequeno prêmio. Até 8% de taxa final não é uma loucura.”
A discussão agora está centrada no ritmo de redução das taxas. Por enquanto, o BC tem feito cortes de 0,5 ponto percentual a cada reunião. O risco, segundo o economista, é a autoridade monetária brasileira acelerar o passo e o Fed realizar um processo mais lento. “Nesse caso, o diferencial pode ficar muito apertado e a moeda não segurar, criando impacto inflacionário”, afirma Reiner.
Para o médio prazo, os economistas projetam um cenário mais construtivo para o Brasil e para a América Latina. “Existe hoje um interesse geopolítico pela América Latina. Nessa nova guerra fria entre EUA e China, países como Brasil e Índia são muito grandes para se tomar partido de um ou de outro e, portanto, seguem no radar de todos. Não somos tão competitivos como o México, que está sendo beneficiado pelo ‘nearshoring’ [busca de fornecedores mais próximos] dos EUA, mas somos um ‘player’ desse movimento. No ano passado, o Brasil recebeu cerca de US$ 60 bilhões em investimento direto. Veja, a BYD escolheu o Brasil para sua primeira fábrica de carros elétricos fora da China”, avalia Fenólio.
O petróleo também segue no radar. Reider destaca que a produção nacional de petróleo vai subir muito, saindo de atuais 3 milhões de barris diários para 5 milhões em 2025, quando a produção do pré-sal entrar em operação total. “Isso vai gerar um saldo comercial de US$ 30 bilhões por anos, quase dobrando a balança comercial do país e muitas receitas para o governo. Nossa estimativa é que os próximos sete anos vão ter mais de R$ 1 trilhão só vindos do petróleo. O câmbio vai ser impactado mais diretamente, mas conforme esses recursos forem investidos podem trazer benefícios para outros mercados também”.
Fonte: Valor Econômico

